sábado, 18 de fevereiro de 2012

HERÓIS E VILÕES


Uma das virtualidades da espécie humana ainda continuará a ser sua diversidade. Além das diferenças raciais, culturais e religiosas persistem evidentes sinais de que indivíduos diferentes reagem de forma diversa às contrariedades que os rodeiam.

Vem esta introdução a propósito de notícias lidas na imprensa sobre três presidentes doutros tantos estados europeus; três figuras honoríficas, destituídas de poderes reais mas supostamente imbuídas dos valores próprios das repúblicas que representam.

As primeiras são originárias da flagelada Grécia (país da Zona Euro a braços com uma crítica situação financeira) e reportam a reacção do presidente Károlos Papoulias (um veterano da resistência à ocupação alemã durante a II Guerra Mundial) a comentários do ministro das finanças alemão, Wolfgang Schauble, de forma peremptória e questionando abertamente «”Quem é o Sr. Schauble para criticar a Grécia?”»

Convenhamos que por mais despropositados e inqualificáveis que tenham sido os actos de gestão dos diferentes governos helénicos que conduziram o país à difícil situação que atravessa, em caso algum é admissível denegrir-se um povo (e ainda menos incentivar-se a ideia) achincalhando o seu amor-próprio e os seus valores nacionais. Diga-se em abono da verdade que aquele tipo de comportamento não é de agora, pois logo no início da crise surgiu um “inteligentíssimo” deputado alemão sugerindo que os gregos vendessem as suas ilhas para liquidarem as dívidas… Será então de estranhar a reacção de Papoulias ou até a crescente insatisfação perante o constante agravamento das condições levando já a dizer-se que «Atenas e Berlim entram em dura guerra de palavras», tudo isto num país que, atirado para a beira do precipício, arde (não apenas no sentido metafórico mas também literal) em fogo lento.

A segundo notícia é de origem nacional e podendo não significar mais que um mero acidente, parece-me demasiado esdrúxula para se quedar como um mero “fait divers”; é que soa estranho ler-se que «Cavaco obrigado a cancelar visita a escola».

Não fosse o caso de se concentrarem duas centenas de alunos protestando contra as condições de funcionamento duma escola conhecida por ter vaiado o anterior primeiro-ministro, José Sócrates, durante uma visita idêntica, ou ainda persistirem os ecos das vaias que em Guimarães receberam Cavaco Silva na sua última aparição oficial e talvez o não explicado impedimento da versão oficial tivesse passado sem referência de maior; mas o pior é que a canhestra explicação (que outra coisa seria de esperar dum político como Cavaco Silva) apenas alimenta a pronta ideia de que o titular do mais alto cargo da nação se acobardou no enfrentamento dum punhado de jovens e, a assim ser, não só teremos de lhe somar mais uma característica desabonatória como nunca poderemos esperar que daqui a algum tempo responda, como o seu homólogo grego, às diatribes dum qualquer alemão mesmo que este não sugira a venda da Madeira para liquidarmos as nossas dívidas.

A última (e mais recente) tem proveniência na mui austera e rigorosa Alemanha que de há dois meses a esta parte assiste ao avolumar de revelações sobre o envolvimento do seu presidente, Christian Wulff (o democrata cristão eleito à terceira tentativa em 2010), num escândalo de favorecimento e de tentativa do seu encobrimento que culminaram agora com a notícia de que o «Presidente alemão apresenta demissão», depois de conhecido um pedido judicial de levantamento da imunidade.

O curioso (para nós portugueses) é que Wulff é apenas suspeito de ter obtido benefícios de vários amigos empresários e de ter tentado encobrir os factos; digo apenas, pois não consigo evitar de recordar os delicados contornos duma operação de compra e venda de acções não cotadas em bolsa, que teve como intervenientes o presidente Cavaco Silva e o seu amigo Oliveira e Costa (ex-presidente do BPN, que depois de nacionalizado já terá originado «Injecções de dinheiro no BPN ascendem a 8,5 mil milhões» do erário público) que foi objecto duma explicação presidencial tão esfarrapada como a explicação para o cancelamento duma visita oficial a um estabelecimento de ensino que lhe prometia uma recepção pouco calorosa.

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