sexta-feira, 4 de maio de 2012

O CRÉDITO E A LEI


Graças à recente publicação duma sentença do Tribunal de Portalegre decidindo que entrega de casa ao banco salda dívida, a questão da necessidade de soluções para os problemas de sobreendividamento das famílias ganhou nova visibilidade, falando-se mesmo que a «Decisão do Tribunal de Portalegre é um “alerta”» e que a «Banca prepara proposta para quem não consegue pagar casa».

É claro que banqueiros e governo tudo farão para “organizar” o “mercado” no sentido de minimizar os riscos para o sector bancário - limitando ao máximo as situações em que os mutuários possam fazer valer o teor daquela sentença do tribunal, em cujo parecer se fundamenta a decisão com base numa clara tentativa de enriquecimento injustificado, pois o banco compra o imóvel por um valor manifestamente inferior ao crédito, procura revendê-lo por este valor e ainda exige ao cliente o pagamento da diferença para o valor dum financiamento não raras vezes inflacionado, tanto mais que desde logo se revelam em agradável sintonia, pois mesmo quando se poderia pensar o contrário ao ouvir que o presidente do BPI, Fernando «Ulrich defende “estabilidade” do crédito à habitação» enquanto o primeiro-ministro «Passos Coelho diz que é preciso “mexer” nas regras de crédito à habitação», essa aparente diferença foi prontamente atenuada pela simples referência a que tal alteração ocorrerá… a seu tempo! A preocupação é tanto mais evidente quanto as primeiras notícias dão conta que a intenção do sector bancário é a de tentar limitar a aplicação daquela regra às famílias em situação económica mais grave (desemprego do casal), esquecendo o cerne da questão que é a do «abuso de poder» pelas instituições financeiras.

Este fenómeno de excesso de aversão ao risco não é exclusivo nacional nem do crédito imobiliário, já que em países anglo-saxónicos, como os EUA e o Reino Unido, se verifica algo de idêntico com os créditos estudantis ou para formação. 


Conhecido o “peso” do sector financeiro, importa que a introdução de nova legislação não reflicta os exclusivos interesses dos banqueiros, como sucedeu em 2005 nos EUA quando na reforma da lei das falências foi introduzido o princípio de que os créditos escolares não eram englobáveis na declaração de falência pessoal, logo exigíveis em qualquer circunstância. Para se ter uma ideia da real dimensão deste problema recorde-se que aquele tipo especial de crédito tem como pressuposto a premissa hoje completamente ultrapassada de que o estudante facilmente encontrará trabalho após o curso e que em 2010 o total de créditos escolares ultrapassou o dos cartões de crédito[1], ascendendo a mais de 1 bilião de dólares.

Outro exemplo a não seguir pode ser encontrado em Inglaterra, onde muito recentemente (Fevereiro deste ano) se ponderou aplicar uma cláusula de penalização para a liquidação antecipada dos créditos escolares[2].


[1] Ver o endereço: http://www.fastweb.com/financial-aid/articles/2589-total-college-debt-now-exceeds-total-credit-card-debt
[2] Ver esta notícia da BBC.

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