sábado, 13 de outubro de 2007

13 DE OUTUBRO DE 1307

Cumprem-se exactamente hoje sete séculos sobre a data que marcou o fim da Ordem do Templo. Foi nesta data que por ordem do rei francês Filipe IV, o Belo, e do papa Clemente V grande número dos seus membros foi preso naquele país; por ter ocorrido numa sexta-feira é vulgarmente aceite como a origem da superstição associada às sextas-feiras 13 como um dia de azar.

Fundada em 1118, na cidade de Jerusalém, esta ordem de cavalaria de origem francesa[1] tinha por finalidade a defesa dos interesses e protecção dos peregrinos cristãos na Terra Santa, território que fora conquistado aos árabes no final do século XI por Godofredo de Bulhão, comandante da I Cruzada. Fosse pelo continuado contacto com as práticas comerciais árabes, fosse por efeito do grande volume de doações de terras na Europa, rapidamente os seus membros passaram de pobres cavaleiros (o nome original da ordem era Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão) ao estabelecimento de uma poderosa rede de comércio e de influências em todo o território da cristandade.

Esta situação não seria minimamente prejudicada pela reconquista árabe de Jerusalém, que ocorreria em 1187, num período em que Saladino[2] pontificava na região como líder muçulmano hegemónico e que poderá mesmo ter marcado um dos períodos de maior florescimento comercial e cultural da região.

Perdida a vertente religiosa da ordem esta multiplicaria o seu poder e influência numa Europa medieval dividida por querelas políticas e religiosas.

Muito se tem escrito e especulado sobre a Ordem dos Templários; desde as suas origens, envoltas em algum mistério, dos quais o menor é a total impraticabilidade de um grupo de nove cavaleiros poder assegurar a protecção dos milhares de peregrinos que cruzavam as inseguras rotas do Médio Oriente, até às especulações em torno dos possíveis achados nas escavações que realizaram nos alicerces do Templo de Salomão[3], até à sua extinção, decidida no Concílio de Viena de 1311-1312, os Templários cresceram em influência e poder[4] até se transformarem num corpo autónomo (por decisão do papa Inocêncio II os Templários eximiram-se a qualquer forma de autoridade espiritual ou temporal além da do papado) que através da acumulação de vastos domínios e da concessão de créditos a reis, nobres e prelados, associados à respectiva cobrança de juros, alcançaram um patamar de poder muito superior ao dos fracos estados medievais.

Muitas vezes apontados como os percursores do moderno sistema financeiro[5] os Templários foram seguramente uma enorme fonte de vitalidade e desenvolvimento numa época muito pouco propícia a semelhantes eventos. No século XIV, a Ordem teria alcançado tamanho poder que o rei de França e o papado, colocaram em prática uma estratégia para a esmagar e se apoderarem dos seus recursos; baseando-se em acusações de heresia, de adoração ao demónio, homossexualidade, desrespeito à cruz, sodomia e outros comportamentos de blasfémia conseguiram destruir a Ordem. Os resultados da estratégia foram ambivalentes, pois se o Papa viu reforçado o poder da Igreja Católica, já o rei de França que não se conseguiu apropriar das incontáveis riquezas atribuídas aos Templários, apenas se viu livre das dívidas que contraíra com a Ordem.

O seu líder na época, Jacques de Molay, seria executado, a Ordem dissolvida mas grande número dos seus membros escapou ao braço secular e procurou refúgio na Escócia e em Portugal, país onde aquela seria convertida numa nova ordem – a Ordem de Cristo – que esteve, no século seguinte, na origem do processo de expansão marítima. Analisando friamente os custos de planificação e desenvolvimento de um projecto da envergadura deste e comparando-os com as débeis capacidades da generalidade dos estados medievais e do português em particular, fácil se torna admitir a enorme probabilidade de ter sido este o destino de parte do tesouro templário[6] (sem esquecer a importância do conhecimento que possuíam das técnicas de navegação e de orientação), tanto mais que as próprias naus sempre ostentaram nas suas velas uma variação da cruz templária.

Correntemente aceite é o facto de os Templários, mergulhados numa semiclandestinidade, terem estado na origem de outras organizações, tais como a maçonaria[7] e outras correntes mais ou menos esotéricas, que marcaram o desenvolvimento do pensamento e da organização política e social da Europa nos séculos seguintes. Cultivadores da chamada história alternativa chamam a atenção para outros factos ligados às origens dos Templários, como a aparente ligação pouco natural[8] entre os cavaleiros fundadores e aquele que é tido como o principal ideólogo da ordem (o monge beneditino Bernardo de Claraval), a possível existência de uma superestrutura secreta e o total distanciamento da ordem no desenrolar da Cruzada contra os Albigenses[9]. No seu conjunto estes factos poderão explicar acontecimentos tão estranhos como a aparente facilidade com que foi posto termo à actividade dos templários e a coincidência do desaparecimento do famigerado tesouro (de palpável o Filipe IV encontrou poucos ou nenhuns valores); para alguns investigadores este é um claro indício da existência de uma estrutura paralela que facilitou (se não fomentou) o “desaparecimento” dos cavaleiros e do seu “tesouro”.

Ao longo dos tempos muitas especulações têm sido elaboradas em torno de todas estas conjecturas, fazendo com que a os templários surjam associados a inúmeras situações e lendas; desde a famosa Demanda do Graal[10] (um dos objectos cuja descoberta nos alicerces do Templo de Salomão lhes é atribuída), às origens de movimentos secretos, místicos e esotéricos como a Maçonaria e a Ordem da Rosacruz[11], que, mesmo quando aparentemente distantes, por vezes evidenciam pontos de contacto[12]. O fascínio mantém-se tão actual que nos dias de hoje ainda persistem organizações que se reivindicam templárias.

Se após a extinção dos Templários têm corrido rios de tinta a propósito do muito que rodeou (e rodeia) aquela organização que de venerados e pobres cavaleiros religiosos passaram a poderosos detentores de efectivo poder financeiro (a crença popular atribui-lhes riquezas provavelmente exageradas pela imaginação), muito campo existirá ainda para investigação – facto que tem determinado a forte especulação que continua a rodear a sua existência e o seu legado – que não deixará de continuar a atiçar a curiosidade de investigadores, historiadores e até simples especuladores que ultimamente têm explorado a vertente literária do mito.
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[1] Os fundadores, entre os quais Hugo de Payens e Geoffroy de Saint-Omer, eram em número de nove e todos de origem francesa, tal como o seu principal ideólogo (e grande responsável pelo reconhecimento papal da ordem) que foi São Bernardo de Claraval.
[2] Saladino, nome original Salah al-Din Yusuf bin Aiub, foi o sultão do Egipto, Síria e Palestina e o chefe militar que liderou os muçulmanos contra os cristãos durante as últimas cruzadas, acabando por reconquistar os territórios perdidos pelo Islão, e tendo-se tornado uma lenda tanto entre os muçulmanos como no ocidente. De origem curda, distinguiu-se em campanhas no Egipto, onde chegou a ser nomeado vizir e aproveitou um período conturbado de sucessão para unificar o país, a Síria e a Mesopotâmia, tornando-se um poderoso dirigente. Encorajou o seu povo a encarar a luta contra a cristandade como uma guerra santa (jihad); distinguiu-se com a reconquista de Jerusalém, em 1187, e posteriormente com as derrotas militares que impôs à III Cruzada (comandada por Ricardo Coração de Leão). Além de génio militar, fundou colégios para o ensino da religião islâmica, foi um protector da cultura islâmica e um excelente administrador dos seus domínios, contando-se entre as suas obras a reconstrução da mesquita de Al-Aqsa, na cidade de Jerusalém, e a construção da cidadela do Cairo.
[3] Originariamente a Ordem ficou sediada no que restaria do Templo de Salomão (daí a designação de Ordem do Templo) e os seus membros ter-se-ão dedicado as escavações no local. Várias lendas sobre o tema mencionam a descoberta das mais extraordinárias relíquias de natureza religiosa, chegando mesmo a incluir-se entre estas o próprio Cálice do Graal, que terão sido responsáveis pelo crescente poder espiritual e económico da Ordem. Mais prosaicamente é bem possível que os templários tenham trazido como principal riqueza da Terra Santa o conhecimento, adquirido em contacto com os árabes (recorde-se que na época esta constituía a civilização tecnicamente mais avançada, repositório do conhecimento grego e grande responsável pelo desenvolvimento de ciências como a Matemática e a Medicina), e as práticas comerciais.
[4] Este crescimento e conversão em potentado económico não foi exclusivo dos Templários, uma vez que a Ordem dos Cavaleiros Teutónicos, também ela fundada no século XII no Médio Oriente, se viria a radicar no Báltico, após a queda de Jerusalém sob o domínio de Saladino em 1187, e a controlar um vasto império comercial onde predominava o comércio do âmbar.
[5] É inegável que os Templários terão sido os precursores do cheque (e do certificado de depósito) quando na sua época criaram um mecanismo que evitava os riscos de transporte de riquezas; na prática qualquer viajante poderia depositar determinada quantia numa fortaleza templária recebendo um documento cifrado que poderia ser descontado em qualquer outra fortaleza, pagando-se uma percentagem por tais serviços.
[6] Importa voltar aqui a referir a possível dualidade do chamado tesouro templário. Sem esquecer a componente material, a Ordem foi detentora de grande domínios numa época em que a posse da terra era efectiva fonte de riqueza, é igualmente conhecido o facto desta ter revelado a capacidade e habilidade para usar muito do conhecimento técnico que os árabes preservaram e desenvolveram; no caso concreto das artes de marear estes foram importante veículo de preservação e transmissão do conhecimento mediterrânico (grego, fenício, latino, etc.), nomeadamente de técnicas e instrumentos como o astrolábio, cuja criação é atribuída ao astrónomo grego Hiparco, e o quadrante.
[7] Associação de carácter universal, cujos membros, homens livres e de bons costumes, cultivam a justiça social, os princípios da liberdade, democracia e igualdade, o aperfeiçoamento intelectual e a fraternidade. Os Maçons, também designados por pedreiros-livres, estruturam-se em células autónomas e organizam-se em oficinas ou lojas. Trata-se de uma obediência iniciática, filosófica, filantrópica e educativa. (adaptado de Wikipédia)
[8] Esta observação resulta da aparente contradição entre uma ordem religiosa monástica, como a beneditina, muito mais orientada para a reflexão e a protecção do conhecimento e uma organização militar, mesmo quando esta apresenta fortes raízes religiosas.
[9] Nome por que ficou conhecida a cruzada lançada em 1209 pelo Papa Inocêncio III contra os Cátaros. Prolongou-se até 1229 e destinou-se a erradicar a heresia – o nome cátaro deriva do grego katharós que significa puro, foi mais trade atribuído à corrente religiosa que defendia um regresso às primitivas práticas cristãs e que se eximia da autoridade papal – que conheceu particular expansão na região então designada por Occitânia, composta pelo actual sul de França (Midi) e por grande parte da actual Catalunha; foi igualmente utilizada pelo reino de França para aniquilar a resistência dos senhores feudais locais à sua expansão em direcção ao sul e ao Mediterrâneo. Após o fim dos combates, a Inquisição, criada em 1231 pelo Papa Gregório IX, e sob a direcção dos dominicanos irá acabar definitivamente com o movimento. (adaptado de Wikipédia)
[10] Também designado Santo Graal ou Santo Gral é uma expressão medieval que designa normalmente o cálice usado por Jesus Cristo na Última Ceia. Ele está presente nas Lendas Arturianas, sendo o objectivo da busca dos Cavaleiros da Távola Redonda, único objecto com capacidade para devolver a paz ao reino de Artur. No entanto, em outra interpretação, ele designa a descendência de Jesus segundo a lenda, ligada à dinastia Merovíngia. Noutra interpretação, defendida por investigadores como Michael Baigent, Richard Leigh, Henry Lincoln, Lynn Picknet e Clive Prince, o Santo Graal significaria Sangreal ou seja Sangue Real, partindo da especulação em torno de uma possível descendência de Jesus Cristo – a linhagem sagrada. Finalmente, também há uma interpretação em que ele é a representação do corpo de Maria Madalena, a suposta esposa de Jesus e sua herdeira na condução da nova religião. Esta última ideia foi explorada recentemente pelo livro "O Código Da Vinci", de Dan Brown. (adaptado de Wikipédia)
[11] É uma Ordem que foi pela primeira vez publicamente conhecida no século XVII através de três manifestos e insere-se na tradição esotérica ocidental. Esta Ordem hermética é vista por muitos Rosacrucionistas antigos e modernos como um "Colégio de Invisíveis" nos mundos internos, formado por grandes Adeptos, com o intuito de prestar auxílio à evolução espiritual da humanidade. Por um lado, alguns metafísicos consideram que a Ordem Rosacruz pode ser compreendida, de um ponto de vista mais amplo, como parte, ou inclusive a fonte, da corrente de pensamento hermético-cristã patente no período dos tratados ocidentais de alquimia que se segue à publicação de A Divina Comédia de Dante (1308-1321). Por outro lado, alguns historiadores sugerem a sua origem num grupo de protestantes alemães, cujos textos datados do início do século XVII conduziram pela sua influência a historiadora Frances Yates a denominar aquele período como o período do Iluminismo Rosacruz. (adaptado de Wkipédia)
[12] Exemplo disto é o facto de surgirem referências cruzadas, como a existência do Grau de príncipe Rosa–Cruz (o 18º Grau do "Rito Escocês Antigo e Aceite") da corrente maçónica de origem escocesa e desta ter sido precisamente uma das regiões que abrigaram muitos dos templários que no século XIV fugiram à perseguição de que foram alvo.

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