quarta-feira, 17 de agosto de 2011

O PRÓXIMO ESTOURO


Apesar da sucessão de avisos, os líderes (todos em geral e os europeus em especial) parecem continuar alheios ou incapazes de entenderem a realidade que os rodeia. Confortados com as panaceias que adoptaram na sequência da última cimeira europeia, os líderes europeus partiram em férias estivais... o Mundo continuou a rodar e os problemas a avolumarem-se.


Era claro que o anúncio do reforço do empréstimo à Grécia não poderia resolver um problema que não é de liquidez, antes de completo desgoverno e aos mais variados níveis, pois se parte do problema residirá realmente num excessivo endividamento (e atenção que casos há em que se persiste em referir apenas a componente pública quando a privada é bem maior e de resolução muito mais delicada) o tempo tem-se encarregado de comprovar que a sua verdadeira essência reside no modelo de financiamento dos estados.

De forma intencional ou não, as sucessivas hesitações e a clara ausência duma ideia de estratégia para resolver a situação – porque, se dúvidas pudesse ter havido, a sucessão dos acontecimentos está a comprovar que a mera adição de medidas de austeridade não resolve seja o que for e apenas está a servir interesses alheios aos cidadãos europeus que, cada vez mais esmagados por impostos e cortes nos benefícios sociais se aproximam rapidamente do ponto de ruptura – começa a dar sinais de insustentabilidade.

Insensíveis à realidade económica e financeira, e, pasme-se, até à realidade política, Merkel e Sarkozy insistem nos “encontros” a dois que ditarão as regras ao resto da Zona Euro, mas em que nenhum acreditará verdadeiramente. Enquanto isso a situação na Europa degrada-se e os últimos dados estatísticos sobre a evolução das principais economias apenas vieram comprovar aquele que era já o sentimento dominante: a economia europeia estiola e a alemã começa já a apresentar os primeiros sinais de contágio. 

Se até agora seria possível atribuir à chanceler alemã a genial estratégia de conseguir com o seu dogmatismo forçar o resto da Zona Euro a seguir os seus ditames, a notícia de que a «Economia alemã sofre forte desaceleração» apenas veio confirmar o que em Julho escrevi no “post” «O MECANISMO DE RESGATE» a propósito da grande dependência da economia alemã face ao mercado europeu e revelar que afinal a brilhante estratégia da chanceler começa a prejudicar a sua própria economia e as conclusões da cimeira franco-alemã, nomeadamente a ideia de constituir um governo económico para a Zona Euro dirigido pelo presidente do Conselho Europeu – o belga Van Rompuy –, o regresso ao antigo desejo alemão de ver consagrado um limite constitucional para o endividamento anual, a imposição duma taxa sobre as transacções financeiras (solução tão vilipendiada desde a proposta da Taxa Tobin[1]), ou uma harmonização fiscal entre a França e a Alemanha, além de não constituírem grande novidade também não parecem um contributo eficaz para enfrentar o cerne do problema: a escalada da crise global.

A situação é de tal forma preocupante que o próprio presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, declarou recentemente que a «Economia mundial entrou numa “fase nova e perigosa”» mas, constatada a incapacidade das soluções usadas até agora, ao invés de sugerir alternativas aproveitou o ensejo para defender o recurso a maior rigor na sua aplicação.

Esquecendo o anacronismo e retendo o essencial das declarações de Zoellick ficará ainda alguma dúvida sobre a gravidade da situação que justifique o comportamento autista de Angela Merkel e de Nicolas Sarkozy, ou estarão ambos apostados numa estratégia de “quanto pior, melhor”, opção que parece tanto mais desajustada quanto o que não falta são alternativas (desde as mais fracturantes, como a que defende a transformação do papel dos bancos centrais e o regresso do controlo da emissão monetária à esfera pública, a outras mais apaziguantes, como seja o aprofundamento da integração europeia e a emissão dos “eurobonds”), mesmo para os espíritos menos afoitos.


[1] A Taxa Tobin foi um imposto proposto pelo economista americano James Tobin (professor da Universidade de Yale e Prémio Nobel de Economia em 1981) que incidiria sobre as movimentações financeiras internacionais com o objectivo de reduzir os movimentos especulativos; a publicação dum editorial assinado Ignacio Ramonet no Le Monde Diplomatique, intitulado «Désarmer les marchés» lançaria a ideia para a criação, em 1998, duma associação – a ATTAC – para promover a aplicação daquela taxa que, embora com um valor muito reduzido (variando entre 0.1% e 0.25%) Tobin acreditava que pudesse limitar a especulação financeira internacional.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

SANTANA NA SANTA CASA


Antigamente era hábito marcar o fim da “silly season” política com o grande comício que anualmente o PSD realiza no Pontal e embora se tenha começado a generalizar a ideia que a tradição já não é o que era... 


... só espero que este ano tenha sido a nomeação de Santana Lopes para o lugar de Provedor da Santa Casa de Misericórdia de Lisboa o último acto daquele período, pois dificilmente se encontrará no país inteiro personalidade com pior perfil para aquela função.

E o pior é que se a “silly season” está a terminar ainda há muitos lugares por distribuir... e o que seguramente não falta por aí são tolos à espera de ser nomeados, mesmo que na imprensa (como sucede nesta notícia do I) se tente passar a ideia que esta nomeação tem um profundo carácter estratégico e assinala mais um passo na menorização do peso do CDS no aparelho governativo, pressagiando quiçá novos atritos na coligação PSD-CDS.

domingo, 14 de agosto de 2011

LÍDERES PROCURAM-SE…


Enquanto os sinais da mais completa confusão se multiplicam por todos os lados, enquanto se sucedem as notícias (e os boatos) sobre a constante degradação da situação económica dos estados e das empresas ou sobre a agitação social que tanto atinge os regimes autoritários como os mais democráticos, as atenções gerais continuam presas das notícias que os órgãos de informação entendem disponibilizar.


Não que a situação das principais economias ocidentais seja irrelevante, nem que a repressão na Síria ou na Líbia seja indiferente ou que os distúrbios que têm ocorrido na Inglaterra sejam acontecimentos de somenos importância, mas resumir tudo à simples narrativa de acontecimentos isolados sem a acompanhar do mínimo esforço para detectar os pontos de ligação entre eles tem o mesmo valor que o acompanhamento das reacções e comentários dos “especialistas” a propósito de questões tão prosaicas como a actuação das agências de “rating” ou a volatilidade dos mercados financeiros e de “commodities”. O mesmo se poderá dizer do debate em torno das soluções para a crise global; descrever ou tratar a situação em cada umas das economias de forma isolada, quando é cada vez mais evidente que numa época de crescente interdependência entre as economias o fenómeno da globalização já ultrapassou os limites que os seus próprios mentores nunca terão imaginado.


Ao contrário do que acontece entre nós, onde a preocupação fundamental parece continuar a ser as medidas governamentais para equilibrar o défice, ou pior, quanto é que aquelas irão custar ao rendimento disponível dos contribuintes, porque quanto às prometidas e efectivas medidas de redução dos gastos públicos continuamos a aguardar pela sua apresentação, na imprensa europeia já começam a surgir com alguma regularidade e a merecer realce comentários e análises apontando para a necessidade duma nova abordagem dos problemas e destacando a gritante falta de capacidade dos responsáveis pela condução dos destinos gerais, aponto de ter surgido um artigo no THE WASHINGTON POST questionando a manutenção da capacidade dos EUA para assegurarem a liderança mundial.


É evidente que boa parte do desabafo do articulista resulta do desconforto introduzido pela polémica entre Democratas e Republicanos a propósito da questão do limite do défice e pela consequente redução do “rating” norte-americano, mas nada disso, nem a gritante ausência de concretização das pífias medidas anunciadas pelos líderes do G-7 (ver aqui a notícia no NEGÓCIOS), altera um pouco que seja a gritante realidade: nenhum dos actuais líderes mundiais parece reunir um mínimo de condições para assegurar as tarefas que se impõem.

Acredite-se ou não, a realidade tem vindo a ultrapassar diariamente os mal preparados e pior aconselhados líderes das grandes potências e a sua incapacidade não só é cada vez mais evidente como começa mesmo a ser questionada às claras por aqueles que tradicionalmente são os seus principais opoiantes; assim, pudemos ler nos últimos dias o avisos deixado por uma das grandes referências nos meios financeiros e a que o PUBLICO se referiu escrevendo que «Soros culpa Merkel e a Alemanha e fala de crise existencial para a Europa», ou o do insuspeito presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, que assegura que a «Economia mundial entrou numa “fase nova e perigosa”».


Enquanto os dirigentes hesitam e protelam as decisões de fundo, agindo como se a situação fosse benigna, àqueles que vêem escapar-lhes a percepção do Mundo actual restam poucas alternativas além da repetição dos argumentos que justificam a necessidade de medidas de corte radical com os modelos de gestão que ajudaram a eclosão da crise, nomeadamente a clara separação entre a economia real e a financeira, com a redução desta ao papel de financiadora da primeira e a uma rápida nacionalização dos bancos emissores (FED, BCE, etc.) por forma a que os Estados assegurem o financiamento directo junto deles. 

Embora não pare de crescer o volume das opiniões nesse sentido, tal pouco se ouve ou lê na imprensa nacional, que á semelhança do tímido artigo do NEGÓCIOS, que sob o título «O que fazer para evitar o colapso da Zona Euro?» junta as opiniões de apólogos e críticos da solução orçamental para a crise (aquela que continua a vingar na UE e que se está a revelar não apenas devastadora, tal é a sucessão e a dimensão dos aumentos da carga fiscal, para os contribuintes mas também ineficaz), mas silencia outras mais contundentes, como seja a que o analista e investidor suíço Marc Faber defendeu numa entrevista ao jornal LE TEMPS e de que o COURRIER INTERNATIONAL se fez eco sob o título «É preciso deixar falir os Estados e os bancos».

Esta ideia, além de estar a ganhar novos adeptos, pois é cada vez mais evidente que não existem recursos suficientes para assegurar o resgate dum número crescente de economias, como o comprovado fracasso da política de resgate público dos bancos descapitalizados na voragem especulativa dos mercados financeiros foi determinante para fragilizar as já débeis finanças públicas, representa mais um passo no processso de descredibilização dos políticos que, por pura tacanhez intelectual, por limitações ideológicas ou mera teimosia insistem em repetir decisões que se provaram erradas esperando que desta vez resultem...

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

DIAS DE BRASA


A avaliar pelas notícias, estaremos a viver um novo período de grande agitação, quer nos mercados financeiros que pressagiam novo ciclo de quebras nas cotações, nos meios governativos das grandes economias que depois da “maratona” negocial registada em Washington conhece agora um novo ciclo de rondas e contactos telefónicos entre os líderes do G7 na tentativa de conter os estragos provocados pela irracionalidade da luta política nos EUA e de nova vaga de ataques às dívidas públicas denominadas em euros, quer no sentido mais literal do termo em alguns centros urbanos da velha Albion..


Enquanto o touro de Wall Street[1] aparece novamente em declínio é a quadriga de Ares[2] que parece brilhar no cenário britânico; pelo menos é o que se pode inferir das notícias e das imagens que nos chegam daqueles distúrbios. Pena é que naquelas notícias seja invariavelmente referida a tese oficial da polícia e do governo de David Cameron, mas nem uma palavra sobre dois factos que me parecem dignos de nota: a elevada taxa de desemprego que em Inglaterra atinge a faixa etária dos 18 aos 25 anos, e em especial a comunidade negra onde a taxa é da ordem dos 50% contra apenas 20% nas outras comunidades, e a recente fragilidade da polícia devido às revelações associadas ao famigerado caso das escutas ilegais efectuadas para a imprensa sensacionalista. 

Com as televisões e os jornais cheios de imagens de Londres em chamas e o disseminação dos motins para outras localidades inglesas começa a tornar-se impossível reduzir os acontecimentos a meros actos de vandalismo e aqui e ali vão surgindo óbvias comparações com os movimentos dos jovens nos países islâmicos. Em comum terão não apenas a idade média dos intervenientes e o uso dos meios tecnológicos (facebook, twitter, sms e internet) para a sua mobilização. Na Europa rica ou no Maghreb pobre, o cerne do problema parece estar numa juventude sem emprego e sem perspectivas de futuro (muito em especial do futuro que a publicidade das grandes companhias usam para fomentar as suas vendas) a que inevitavelmente se adiciona a fragilidade de toda uma sociedade que actualmente sofre os efeitos nefastos das ineptas políticas anti-crise decididas pelos ineptos dirigentes políticos que confrontados agora com a revolta produzem afirmações como esta noticiada pelo EXPRESSO e onde «David Cameron diz que partes da sociedade estão doentes».


Mas, pior que tudo isto continua a ser a imagem de absoluto desnorte e completa incapacidade revelada pelos líderes mundiais, com especial destaque para os europeus que não só continuam a revelar-se incapazes de concertar uma solução para debelar a crise como persistem numa estratégia de escamoteio da realidade, que perante o desmoronar dum mundo que deveriam conhecer se revelam incapazes e incompetentes para lançar as bases duma nova ordem internacional, não admirando pois que a cada nova convulsão se suceda outra de maior dimensão e gravidade.


[1] Referência à imagem proporcionada pelas estratégias “bull” e “bear”, forma como são designadas na terminologia dos mercados de capitais as estratégias e as tendências de, respectivamente, subida e descidas das cotações.
[2] Referência a uma das formas tradicionais de representação do deus da guerra na mitologia grega.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

DA CONFIANÇA À PREOCUPAÇÃO...


Não foram precisas sequer duas semanas para ver que a «Crise da dívida regressou em força à zona euro», demonstrando na prática a inutilidade da última cimeira europeia e confirmando uma vez mais a irrelevância das decisões dos líderes europeus[1] para conter algo cuja essência desconhecem. Prova disso mesmo é um artigo de opinião[2] assinado pelo Presidente do Conselho Europeu, Van Rompuy, no qual este preocupa em separar a moeda única da dívida pública, como se ambas não fossem partes do mesmo problema e não fosse o modelo de gestão da união monetária desajustado para períodos de crise como a que vivemos.


Em reconhecimento disso mesmo já começam a surgir aqui e ali uma ou outra opinião alertando para a necessidade de revisão daquele modelo e, por acréscimo, do conjunto da UE.

Estranho é que os principais responsáveis por aquela união económica, Herman Van Rompuy ou Durão Barroso, continuem a insistir numa política de evolução na continuidade – seja quando negam as razões estruturais da crise ou quando se lê que «Durão apela a mudanças e expansão do fundo de resgate» - quando o mundo em redor se revela cada vez menos receptivo a meros paliativos.

A conclusão hoje continua a ser a mesma que formulei em Março, no “post” «BRICOLAGEM», quando chamei a atenção para a clara necessidade de repensar todo o modelo de financiamento dos estados ocidentais que, depauperados por uma errada política de desoneração fiscal das empresas e das famílias com rendimentos mais elevados (em nome da ideia que assim se estaria a estimular o investimento) e pela contracção do produto interno (consequência de períodos de crescimento anémico das respectivas economias) encontraram a solução no endividamento junto do sector financeiro, esquecendo que este apenas serve os interesses de ganho dos accionistas dos bancos e nunca o interesse geral da sociedade. Este apenas será satisfeito quando o endividamento público for assegurado directamente pelos bancos centrais, medida que além de contribuir decisivamente para a redução da atractividade especulativa daquela dívida ainda ajudará a reduzir a forte alavancagem a que o sector financeiro a submeteu.

Curiosamente, ou não, já se começam a encontrar entre os especialistas algumas opiniões nesse sentido, como se pode constatar por notícias como esta do NEGÓCIOS que fazendo-se eco dum artigo de opinião assinado por Paul De Grauwe, professor na Universidade de Louvaina e habitual conselheiro da Comissão Europeia, e publicado no FINANCIAL TIMES[3], afirma que «Só o BCE pode travar o contágio da crise da dívida».


[1] Manda a verdade que se diga que o comportamento irresponsável dos políticos norte-americanos sobre a questão do aumento do limite do défice público também não ajudou em nada a situação europeia; não por ter relembrado a delicadeza do problema, mas principalmente por ter aumentado a insegurança nos meios financeiros e por ter revelado maiores debilidades daquela economia que as anunciadas nos discursos oficiais.
[3] O artigo em causa intitula-se precisamente «Only the ECB can halt eurozone contagion».

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

O LIMITE DA DÍVIDA

Para alguns observadores menos atentos (ou mais crédulos) até poderá parecer que o problema do limite do endividamento nos EUA está resolvido e que mais uma crise foi evitada.

Para recordação ficará apenas mais um episódio nas querelas partidárias entre Democratas e Republicanos, que será lembrado com maior o menor nostalgia em função dos futuros confrontos. Sucede porém que aquilo que foi dado assistir ao mundo inteiro não constituiu um mero episódio de luta política na antevisão das eleições presidenciais do próximo ano, antes o triste espectáculo do estado a que chegou a tacanhez das elites governantes (estejam elas no poder ou na oposição) que aceitaram conduzir a ainda principal economia mundial ao limiar dum precipício cujo fundo desconhecem em absoluto, em nome duma hipotética vitória no próximo pleito eleitoral.


Democratas e Republicanos, sem qualquer distinção, aceitaram envolver-se num combate de natureza táctica em torno duma questão eminentemente estratégica e cujas consequências estão ainda longe de completamente determinadas; até o aviso público que Paul Krugman deixou no THE NEW YORK TIMES, onde afirmou que os termos do acordo político irão deteriorar uma economia deprimida e agravar o problema da dívida norte-americana de longo prazo, corre o risco de se revelar optimista, pois além das temidas consequências de natureza económica – onde  se incluem as previsões de crescimento anémico daquela economia[1] nos próximos dois anos e o inevitável efeito contraciconista que terá a prometida revisão em baixa do “rating” da dívida norte-americana (pelo menos foi o que prometeram as principais agências de notação, a atestar por notícias como estas: «Standard & Poor’s ameaça baixa ‘rating’ dos EUA», «Moody’s ameaça cortar rating máximo aos Estados Unidos» ou «Agência chinesa vai baixar o rating dos EUA»[2]) sobre a economia mundial – será também de prever o abalo sobre a credibilidade e confiança no “gigante americano” garantidamente produzido por esta crise e pela inabilidade dos políticos que a conduziram.



A guerra quase fratricida aberta pelos congressistas norte-americanos em torno da questão do limite do défice trouxe à evidência as fragilidades dum sistema político assente no bipartidarismo e, pior, a demonstração que nada fará hesitar os seus principais actores na demanda da conquista do poder. Este fenómeno, que não é exclusivo dos EUA, está a condicionar a evolução de quase todas as economias ocidentais (ou não fossem estas as que assentam em modelos mais democráticos) como o confirma a situação de Chipre (o mais recente estado-membro da Zona Euro cujo «Banco central do Chipre alerta para risco de resgate financeiro» após o deflagrar duma crise política interna) e pode hoje ser apontado como uma das principais razões para o aprofundamento da crise global.

Outro importante sinal do desconforto provocado pela discussão em torno da dívida pública norte-americana é dado por notícias como as que dão conta das reacções russa e chinesa; quando a imprensa faz eco da afirmação de Vladimir Putin de que os «Norte-americanos “parasitam” a economia mundial» e ainda reforçam aquela ideia quando escrevem que a «China junta-se à Rússia nas críticas aos políticos norte-americanos», parecem cada vez mais claros os sinais de que aquela questão está a deixar marcas muito mais profundas do que os seus intérpretes querem reconhecer.

É evidente que a questão da dimensão dos défices públicos e a discussão académica que acarreta não é de modo algum comparável com uma bizantinice, como o foi a célebre discussão ecuménica em torno da determinação do sexo dos anjos que ocorreu no distante ano de 1453 precisamente quando os turcos otomanos se preparavam para conquistar Constantinopla, a ainda capital do Império Bizantino; o problema é que agora, como então, as elites pensantes parecem bem mais preocupadas com o acessório que com a questão fundamental – as medidas necessárias para enfrentar e debelar uma crise que apenas e tão só resiste às medidas tradicionais


[1] A confirmar esta afirmação e outra idêntica que em Maio passado inclui no “post” «DÓLAR EM ESTILHAÇOS», veja-se a recente notícia do PUBLICO que ao afirmar que «EUA: Consumo cai pela primeira vez em quase dois anos» mais não faz que antecipar o cenário para o último trimestre deste ano e a apresentação de resultados da economia americana abaixo das expectativas.
[2] Hoje mesmo surgiram notícias contradizendo parcialmente aquelas afirmações; assim, enquanto a «Moody´s reafirma “rating” máximo da dívida dos EUA e baixa “outlook”», a «Fitch mantém classificação máxima à dívida dos Estados Unidos» e a «Agência chinesa Dagong baixou “rating” dos EUA» apenas se confirma (se dúvidas ainda houvesse) que também na actividade de avaliação do risco soberano pesa, e de que maneira, o factor político.