sexta-feira, 19 de agosto de 2016

CAUSA GRANDE DISCÓRDIA

Com o anúncio de que o «BCE aprova administração de António Domingues», parecia concluído a saga que há vários meses envolve o processo de substituição da administração da CGD liderada por José de Matos.

Sucede porém que ao confirmar-se que o «BCE dá luz verde a nomes da CGD, mas chumba poderes do novo presidente» ou que o «BCE obriga novos administradores da CGD a irem à escola... e têm de passar», avolumam-se as dúvidas sobre a efectiva capacidade dos novos gestores para levarem a cabo uma tarefa difícil desde o início e agravada ainda com uma apresentação de resultados onde uma «CGD com prejuízos de 205 milhões no semestre» parece não conseguir inverter os maus resultados.


Quando o «BCE aprova 11 administradores mas chumba outros oito» pode não significar apenas uma questão de incompatibilidades – a habitual prática de acumulação de cargos de administração – mas também uma questão de adequação, que o anúncio de que o «Governo vai rever lei bancária para recuperar nomes chumbados na CGD» não augura nada de bom, tanto mais que já é sabido que um dos parceiros de coligação, o «BE defende lei que “limite e discipline” número de cargos acumulados».

Claro que a nomeação desta equipa gestora, como a das anteriores, tem estado envolvida em polémicas várias, que vão desde a evidente preponderância de gestores originários do concorrente BPI – que levou o NEGÓCIOS a escrever que o economista «Eugénio Rosa teme “OPA de grupos económicos” sobre gestão da CGD» – até à dimensão da equipa: 19 nomes entre administradores executivos e não executivos. Tudo isto quando continuam a impor-se restrições de gastos com pessoal, se fala na redução de mais 2.500 trabalhadores e quando a nova equipa fez depender a sua participação do levantamento dos limites às respectivas remunerações, enquanto os trabalhadores continuam a ver-se iludidos com a promessa de recuperarem os que lhes foram cortados.

Este não é apenas um mau sinal transmitido para toda a estrutura duma empresa que é não só o maior banco nacional, mas o principal financiador da actividade económica, incluindo as sempre tão referidas PME. Muitas vezes esquecido (e intencionalmente) é o facto da CGD continuar a ser o principal financiador da economia portuguesa (mais de 71 mil milhões de euros em 2015) tendo até aumentado o crédito às PME, do mesmo modo que as muito referidas imparidades (quase 5,3 mil milhões de euros entre 2008 e 2015) não chegam a representar 7% do crédito concedido quando os concorrentes BCP e BES/Novo Banco apresentam rácios de 11,2% e 8,9%, para o mesmo período.

A juntar a todo o imbróglio da substituição da administração (processo sempre controverso na caso da CGD e maior ainda quando no caso vertente parece chamar-se uma equipa do BPI para assegurar a gestão do banco público e que já originou que um «Sindicato acusa nomes para CGD de "bom serviço prestado aos interesses do capital"»), registou-se ainda a famigerada tirada do Ministro das Finanças quando referiu a existência dum “desvio”, termo que na gíria financeira (que ele bem conhece ou não fosse um ex-quadro do Banco de Portugal) significa um “buraco” nas contas, na abordagem da questão da necessária recapitalização da CGD e o arrastar da decisão agora conhecida do BCE.

Assim, em plena “silly season” gastamos tempo e energias a discutir a composição da equipa de administradores e o cumprimento de decisões do BCE que raiam o insultuoso para alguns dos candidatos propostos, em lugar de estarmos a debater o que realmente era importante para o futuro da CGD e do país: qual o papel que pretendemos para o banco público e com que meios – montante e forma de realização dum aumento de capital obrigatório face a alguns dos negócios ruinosos promovidos ou patrocinados por anteriores administrações, como foram o caso dos empréstimos à UGT, decidido por administração liderada por João Salgueiro, dos financiamento para compra de acções do BCP por parte de alguns dos seus principais accionistas (Joe Berardo, Moniz da Maia, Manuel Fino e Teixeira Duarte, entre outros), garantidas pelo valor das próprias acções, a integração do BNU em condições altamente desfavoráveis para a CGD, o processo de internacionalização levado a cabo no Brasil e em Espanha, a nacionalização do BPN e o posterior financiamento de 4,1 mil milhões de euros que continua por pagar, a alienação de participações financeiras em condições altamente desfavoráveis decidida pelo governo de Passos Coelho, além doutras operações que em 2015 ascenderiam a mais de 2,3 mil milhões de euros em risco de não pagamento, dos quais o principal devedor é uma empresa do grupo espanhol La Seda (onde a CGD deteve quase 15% do capital) com 476 milhões de euros, António Mosquito/Soares da Costa (338 milhões de euros), a EFACEC, com um crédito de 303 milhões de euros, Vale de Lobo (cerca de 300 milhões de euros), Auto-Estradas Douro Litoral (271 milhões de euros), Grupo Espírito Santo (237 milhões de euros) e o Grupo Lena (225 milhões de euros), entre outros que compõem a actual lista de imparidades superiores a mil milhões de euros – o queremos dotar!

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