quinta-feira, 15 de novembro de 2007

ARAFAT CONTINUA A MATAR

Este podia bem ter sido o título escolhido por algum jornal mais sensacionalista que tivesse coberto as celebrações do terceiro aniversário da morte do histórico líder palestiniano e em especial as organizadas na Faixa de Gaza, na sequência das quais um novo tiroteio entre militantes da Fatah e do Hamas se saldou por sete mortos e cento e trinta feridos.

Este incidente é apenas mais um que assinala e aprofunda a divisão entre palestinianos que deveriam encontrar na situação criada pela ocupação israelita dos territórios da Cisjordânia e da Faixa de Gaza uma razão acrescida para a sua unidade e identificação de objectivos. Sem esquecer que ambos os territórios vivem uma realidade político-militar distinta – a Faixa de Gaza é, desde Junho deste ano, governada pelo Hamas enquanto a Cisjordânia se mantém sob controlo da Fatah – que poderá bem ser fruto de muito mais que a mera disputa política entre aqueles grupos já que desde 1948, ano da criação do Estado de Israel, que têm conhecido sortes distintas[1].


A realidade é que o governo israelita continua a manter uma posição de recusa de negociações o que efectivamente prolonga a ocupação dos territórios palestinianos, continua a degradar as débeis condições de vida das populações e mantém a prática de anexações territoriais sem que da comunidade internacional se façam ouvir vozes suficientemente poderosas para porem termo a esta situação.

Actuando com total impunidade e mais recentemente sob o manto da luta contra o terrorismo, os governos israelitas continuam a destruir casas e terrenos de cultivo palestiniano com o simples propósito de expulsar os seus proprietários e assim procurar disfarçar a inegável realidade que constitui o facto da população judaica representar uma minoria face à população palestiniana.

No terreno as populações palestinianas continuam a depender do auxílio internacional que vai chegando por entre as apertadas restrições e as constantes limitações impostas pelas medidas de segurança israelitas, que mais não pretendem que perpetuar a situação de dependência palestiniana enquanto se asseguram da máxima liberdade para prosseguirem a política de apartheid que há décadas impõem a uma maioria palestiniana cada vez mais empobrecida e de tudo desprovida.


O sucesso desta estratégia, para qual Yasser Arafat também deu o seu contributo[2], está agora particularmente dependente da passividade e subserviência do presidente da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas, pelo menos até que a II Intifada tenha produzido uma nova geração de líderes mais disposta a apontar novos rumos à luta de libertação. Isto mesmo poderá já estar a acontecer quando começam a ser comuns apelos como o de Mohammed Khatib[3]:

«No fim todos teremos de viver nesta terra como iguais. Quando esse tempo chegar descobriremos que temos mais em comum do que pensamos. Até lá não aceitaremos pequenos nadas feitos de palavras como “estado” e “soberania” quando sabemos que no interior do nosso “estado” não temos acesso à nossa água ou à liberdade de movimentos sem a autorização israelita. Não serei livre enquanto os colonatos e os muros dividirem e roubarem a minha terra e cercarem a minha capital, Jerusalém.

Sofremos demasiado, durante demasiado tempo. Não aceitaremos um apartheid disfarçado de paz. Não nos contentaremos com menos que a nossa liberdade.»[4]

Pelo menos a esperança não estará perdida!
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[1] Com a declaração unilateral do Estado de Israel a Cisjordânia foi colocada sob a tutela administrativa da Jordânia enquanto a Faixa de Gaza ficou sob administração egípcia, factos que terão desde logo ajudado ao “afastamento” entre as populações dos dois territórios.
[2] Quando, esquecendo uma das reivindicações mais caras ao povo palestiniano – a do direito ao regresso dos refugiados provocados pelas guerras israelo-árabes -, aderiu à negociação com Israel e à política de «paz por terra» que culminou no Acordo de Paz de Oslo de 1993 e na criação da Autoridade Palestiniana como entidade gestora dos territórios da Cisjordânia e da Faixa de Gaza.
[3] Mohammed Khatib é membro do Conselho Municipal de Bil’in e um dos membros mais influentes do Comité Popular Contra o Muro de Bil’in.
[4] Versão integral do texto, em inglês, aqui.

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