quarta-feira, 13 de julho de 2011

PROMESSAS E GOLPADAS...


Embora de forma talvez menos ostensiva que outros antecessores, Passos Coelho parece continuar apostado no recurso ao desgastado discurso da “pesada herança”, pelo menos a atestar em sibilinas “fugas” de informação comvenientemente “sopradas” à imprensa, que não deixou de nos “informar” sobre um «colossal desvio nas contas»[1].
 
 
Além de recorrente, sempre que se regista a alternância entre PS e PSD, esta situação já não constitui novidade neste governo, pois serviu de argumento, durante a apresentação do programa de governom, para o primeiro-ministro justificar, que ao invés de apresentar o prometido profundo corte na despesa pública preferiu a via bem mais fácil de aumentar a carga fiscal sobre os trabalhadores por conta de outrem, para alcançar a meta do défice prometido ao FMI e ao BCE.

Independentemente da polémica parlamentar que deverá ter lugar no próximo debate quinzenal, assim o promete o PS que pela voz do deputado «João Galamba diz que Passos tem que explicar o que viu que a troika não foi capaz de ver», a atestar pelas declarações do também deputado Miguel Frasquilho (PSD) e citadas nesta notícia do ECONÓMICO, referir-se-ão aos dados divulgados pelo INE, segundo os quais um «Défice de 7,7% até Março afasta país das metas da troika», pois o valor fixado foi de 5,9%.

Ansioso pelo esclarecimento deste “affaire” mas consciente que não existe melhor que uma polémica acessória para distrair a atenção do essencial – a desajustada opção por uma política de combate ao défice público que mais não fará que estrangular ainda mais o irrisório potencial de crescimento da economia nacional – recomendo, a quem ainda o não tenha feito, a leitura do artigo de opinião que Daniel Amaral (economista que de modo algum pode ser enfileirado entre os perniciosos opositores cegos às virtudes da dieta orçamental) publicou na passada semana no ECONÓMICO, onde sob o esclarecedor título de «A GOLPADA», arrasa toda a encenação preparada por Passos Coelho quando diz:
 
«Contrariando tudo o que dissera durante a campanha eleitoral, a primeira medida tomada por Passos Coelho foi aumentar o IRS, através do corte de cerca de 50% no subsídio de Natal.

Argumento invocado: o anterior Governo, que declarara um excedente de €432 milhões no orçamento do primeiro trimestre, foi agora desmentido pelo INE, que encontrou um défice de €3.177 milhões. Eis um episódio triste, de que o actual PM deveria envergonhar-se.

O episódio é triste por dois motivos. Em primeiro lugar, não se percebe como é que um défice de €3.177 milhões no primeiro trimestre pode impedir o défice de €10.068 milhões no final do ano, quando as medidas aprovadas visaram exactamente este valor. Em segundo lugar, releva de uma profunda ignorância confundir a contabilidade pública com a contabilidade nacional, onde a semelhança é idêntica à que existe entre um pepino e um girassol.»

E conclui da forma que qualquer pessoa intelectualmente honesta subscreverá:

«Mas o expediente não resultou. E o novato que se supunha diferente revelou-se igual a tantos outros: um político que não olha a meios para atingir os fins.

Não foi um gesto bonito

terça-feira, 12 de julho de 2011

O FIM DO NoW

O passado fim-de-semana assistiu, em sentido figurado, ao fim do Mundo. Com uma tiragem recorde, 5 milhões de exemplares do NEWS of the WORLD (NoW para os íntimos) saíram para as bancas marcando o fim do mais popular dos tablóides britânicos, cujo envolvimento num generalizado processo de escutas ilegais ditou o fim da publicação.


Não fossem as razões por detrás do encerramento e seguramente nunca o fim dum jornal sensacionalista como aquele – que apenas será recordado pelo dono, o magnata da imprensa Rupert Murdoch, a quem proporcionou grandes lucros e pelos fãs de mexericos e demais coscuvilhices – constituiria motivo de referência aqui, nem mesmo pelo facto de ter escrito na sua última primeira página «Obrigado e Adeus» no lugar dum mais humilde e adequado «Adeus e Perdoem-nos».


Desenvolvimentos recentes trouxeram de novo à ordem do dia uma prática de escutas telefónicas ilegais, conhecida há vários anos, que além de lançarem a dúvida sobre a idoneidade dos jornalistas do NoW estão a abrir novas “feridas”, havendo já quem se questione sobre idênticas práticas doutros jornais e não esqueça as bem conhecidas ligações entre a equipa directora do jornal e o actual primeiro-ministro (Andy Coulson, ex-redactor-chefe e ex-porta-voz do primeiro-ministro David Cameron, e Rebekah Brooks, ex-editora do NoW e directora executiva da News International, a empresa do universo de Rupert Murdoch detentora do NoW), tudo isto quando estava em vias de se resolver o processo de aquisição da BSkyB (o maior fornecedor do serviço de TV por subscrição no Reino Unido) por… Rupert Murdoch.

Acidental, ou não, o governo conservador de David Cameron reagiu às múltiplas pressões e anunciou um inquérito às actividades do jornal enquanto diz reequacionar o sancionamento do negócio de aquisição da BSky B, que se arrasta desde Junho de 2010 quando a empresa rejeitou uma proposta de “takeover[1] de Murdoch.

Não será pois de estranhar que prontamente Rupert Murdoch tenha “sacrificado” o NoW enquanto, segundo esta notícia do PUBLICO, procura assegurar a concretização do negócio da BSkyB, tanto mais que as suas “boas relações” com Cameron são de há muito conhecidas.


No final, depois de acalmada a tormenta e assegurado o “negócio” de Murdoch (a pronta decisão de sacrificar o NoW deverá surtir o efeito desejado), ficará sempre a pairar a dúvida sobre a isenção do governo de Sua Majestade, o que poderá representar um mal menor caso a situação jurídica de Andy Coulson e de Rebekah Brooks se agrave ao ponto de novas revelações sobre o governo ou alguns dos seus membros começarem a aparecer num ou noutro jornal.


[1] A operação proposta por Rupert Murdoch, já detentor de 39% do capital, fará dele proprietário único duma empresa que desde 2007 tem como presidente o seu filho James.

sábado, 9 de julho de 2011

EUROPA AO FUNDO


Com o avolumar das dúvidas sobre a solução para a dívida pública grega e a aparentemente polémica decisão da Moody’s em descer o “rating” da dívida portuguesa, a Europa continua a concentrar as atenções de praticamente todos os que acompanham a evolução da crise global.

Acidentalmente, ou não, tudo parece conjugar-se para transmitir a ideia que é na velha Europa que se centra o olho do furacão duma crise que continua sem encontrar quem a enfrente de forma consistente e organizada.


Enquanto os EUA discutem o aumento do nível de endividamento da União que possibilite a continuação dos programas de injecção de liquidez (os chamados “quantitative easing”, uma prática que se traduz num claro mecanismo de monetarização da dívida[1]), cujos possíveis efeitos inflacionários parecem não assustar a direcção do FED, no oposto temos uma UE cujo banco central (o BCE) se recusa a aceitar semelhante prática mesmo na ausência de tensões inflacionistas[2]; o dogmatismo de Jean-Claude Trichet (presidente do BCE) e dos seus pares (Vítor Constâncio incluído) tem constituído um dos principais entraves à construção duma solução para o imbróglio financeiro que vive boa parte dos países periféricos daquela UE.

Nem mesmo quando se começou a revelar à evidência o completo fracasso da solução desenhada para a Grécia (intervenção do BCE e do FMI com 110 mil milhões de euros para o reequilíbrio das contas públicas helénicas), quando se persistiu no mesmo modelo de intervenção na Irlanda e em Portugal, como se o problema do endividamento se resolvesse mediante o recurso a novo e maior endividamento e sem admitir (nem nos mais loucos dos sonhos) que o problema fundamental radica na estrutura da própria união monetária e na forma como o sistema financeiro mundial lucra com o endividamento público.

Algumas têm sido as vozes que ultimamente se vão ouvindo a propósito da necessidade de repensar este mecanismo, mesmo se na sua maioria ninguém equaciona a indispensabilidade de fazer regressar à esfera pública a função de criação da moeda, enquanto alguns jornais vão noticiando fenómenos como o do «Medo de contágio drena dinheiro da zona euro», que constituem simples reflexos da incapacidade política das lideranças europeias em introduzirem mecanismos de controlo dos movimentos financeiros e uma radical extinção dos “off-shores”. Sem isso, ideias como a de «Um New Deal para a Europa» por melhor estruturadas e fundamentadas que o sejam nunca lograrão qualquer êxito, pois as condições em que Roosevelt aplicou nos EUA aquele programa de recuperação económica (ao tempo o governo da União ainda controlava a emissão de moeda) eram bem diversas das que actualmente imperam.

Enquanto os países periféricos do Euro (também designados por PIIGS[3]) não encontrarem no seu interior e nas suas lideranças a força que os leve a concertar uma estratégia de oposição às políticas monetaristas e neoliberais que, preconizando os reequilíbrios orçamentais a qualquer preço e em detrimento do crescimento económico, tão bem têm servido os interesses dos países da Europa do Norte (como também são conhecidos os países mais ricos da UE) e do sistema financeiro mundial, a situação continuará a agravar-se e acabará por revelar as fragilidades da estratégia franco-alemã. Isso mesmo tornar-se-á evidente logo que a pressão dos “mercados” chegue à dívida espanhola e então veremos se Sarkozy e Merkel conseguirão evitar o soçobrar das suas próprias economias ou se tudo se terá perdido na absurda estratégia de complacência com as agências de “rating” e com os “hedge funds”, em prejuízo dos quase 500 milhões de cidadãos europeus.


[1] Expressão usada para definir a criação de moeda pelo banco central para comprar os títulos da dívida que os governos precisam de emitir para financiar as suas intervenções na economia ou para fazer face aos seus gastos.
[2] Facto que não tem impedido do BCE de continuar novo ciclo de subida das taxas, conforme o atesta a notícia desta semana do PUBLICO.
[3] Recordo que o acrónimo resulta das iniciais dos países europeus que integram a também designada Europa do Sul: Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

TARDIOS DESABAFOS


Quem hoje tenha folheado alguns jornais nacionais não deixou por certo de se espantar com tonitruantes declarações de personalidades habitualmente pouco dadas a este tipo de manifestações, a propósito de mais uma descida no “rating” da república. Faria de Oliveira, presidente do Conselho de Administração da CGD, citado pelo NEGÓCIOS, afirmou sem rodeios que «Descida do “rating” pela Moody’s é imoral e insultuosa» enquanto o I citou o presidente do Banco BIC dizendo que «Mira Amaral classifica descida de rating português como ”infeliz e terrorista”».


Mesmo admitindo que este novo corte de quatro níveis (ou com escreve o já citado I, «Moody’s atira Portugal para o “lixo”») possa ter chocado genuinamente aquelas duas personalidades, não deixa de não ser curiosa a constatação de algumas inexplicáveis coincidências. Um e outro são engenheiros de formação, ex-governantes dos tempos de Cavaco Silva e nenhum parece ter alcançado o posto de “banqueiro” pela sua formação académica ou prolongada carreira no meio financeiro; mas as coincidências não se ficam por aqui e além de correligionários políticos do actual primeiro-ministro não tenho memória de durante a vigência do anterior governo alguma vez os ter visto pronunciarem-se de forma tão assertiva sobre o assunto ou até de forma um pouco mais genérica, sobre a actuação das agências de “rating”, matéria habitualmente tabu no meio financeiro.

Embora um e outro entendam fundamentar as críticas em factos como o plano de recuperação negociado com o BCE e o FMI e a curta existência do actual governo, esquecem que além da dura realidade que constitui o apreciável aumento do endividamento em resultado daquele acordo (78 mil milhões de euros representam quase 50% do PIB nacional) e do excessivo endividamento privado (como muito bem se refere nesta notícia do NEGÓCIOS), a verdadeira preocupação da Moody’s e das restantes agências de “rating” não é tanto a situação portuguesa mas principalmente a prossecução da estratégia de ataque ao Euro, como parece referir o DN ao assegurar que «Moody’s ataca sempre antes dos leilões» da dívida pública.

Ofuscados pela miopia política (e principalmente preocupados pelos reflexos que terá a degradação o “rating” sobre a facilidade com que os respectivos bancos poderão obter novos financiamentos internacionais) aqueles reconhecidos especialistas nacionais bem que poderiam ter-se revelado mais comedidos e fazer como assegura o DN que «João Duque desvaloriza corte de 'rating' e confia em reviravolta nos mercados», estratégia que estaria muito mais de acordo com aquilo que todos eles realmente defendem – o primado do mercado e da livre concorrência – ou será que a regra apenas se aplica quando funciona em seu benefício?

terça-feira, 5 de julho de 2011

O ZELADOR E OS COBRADORES DE IMPOSTOS

Apresentado o programa do governo da dupla Passos Coelho/Paulo Portas e depois de lidos alguns comentários, como o de Marcelo Rebelo de Sousa, para quem o «Progrma de Governo está muito bem feito» ou o de Francisco Assis que «considera Programa do Governo "longo, vago e cheio de considerações genéricas"», bem se pode dizer que não lemos todos o mesmo documento. 

Aliás, não são poucos os que de tal padecerão, pois a atestar pelas mais recentes reafirmações das preocupações presidenciais, que levou o JORNAL DE NOTÍCIAS a escrever que «Cavaco faz apelo à "distribuição justa dos sacrifícios"» não resisto a deixar uma questão: se Passos Coelho se assume como o cobrador de impostos estará o Presidente da República ciente de que apenas lhe caberá o papel de zelador daquele?

 

E assim sendo a quem se destinam os apelos?


Ao governo PSD/CDS que apostou em privatizar tudo o que poder e em agravar impostos até onde o deixarem ou aos cidadãos para que pacificamente tudo aceitem em nome da necessidade de satisfazermos os credores que financiaram e que tanto tem lucrado com as políticas ruinosas do mesmo Cavaco Silva e dos seus sucessores?

sexta-feira, 1 de julho de 2011

AGANAKTISMENI


A crise das dívidas soberanas denominadas em euros, e em especial a grega, conheceram nas últimas semanas desenvolvimentos que de modo algum devem ser esquecidos, nomeadamente a eclosão dum movimento análogo ao iniciado em Espanha com os “Indignados” e que na versão helénica foi baptizado com o bem mais sugestivo termo “Aganaktismeni”, que significa “em cólera”.

E este bem que devia ser o estado de espírito da generalidade dos cidadãos europeus face à ausência de decisões da cimeira europeia de chefes de governo que teve lugar no final da semana passada; continuando a adiar a formulação duma política concertada para o combate a uma crise que eternizando-se apenas poderá redundar em maiores prejuízos para todos os intervenientes na Zona Euro e na fragilização desta divisa enquanto meio internacional de pagamentos, empurrando a solução para as mãos dos políticos gregos e para um novo empréstimo tutelado pelo FMI (depois dos iniciais 110 mil milhões de euros fala-se agora de mais 100 mil milhões), a opção dos políticos europeus apenas pode ser interpretada no sentido duma clara subordinação aos interesses dos credores dos países mais endividados. 


Esta situação, que não constitui qualquer novidade, insere-se num contexto de clara dominância da conjugação das correntes políticas mais conservadoras com as teses económicas mais liberais, que em décadas anteriores produziram “escolas” como o “reaganismo” (nos EUA) ou o “tatcherismo” (no Reino Unido) que impuseram o “mercado” como o santo dos santos de todas as coisas. Com o desmembramento da União Soviética e a queda do Muro de Berlim, os seus continuadores não se pouparam sequer a jactância de declararem o fim da história e o início duma nova era de abundância que a incontestada dominância dos capitais financeiros conduziu à rápida sucessão de crises especulativas que culminou na crise do “subprime” norte-americano e na crise financeira global que atravessamos.

Seja por pura incapacidade ou por intolerável omissão os grandes líderes mundiais (e os europeus em especial) continuam à espera da intervenção da “mão invisível” que reequilibrará os mercados e as suas economias, enquanto o sector financeiro mundial (aquele que, depois de desenvolver mecanismos financeiros que lhe permitem realizar lucros quer com as variações positivas dos mercados quer com as negativas, esteve na origem de todas as pequenas ou grandes crises das últimas décadas) continua tranquilamente a capitalizar ganhos e a beneficiar das ajudas dos fundos públicos dos mesmos governos que agora se recusam a intervir para solucionar o problema das dívidas soberanas.

Grécia, Irlanda e Portugal, são até agora os rostos visíveis do fracasso duma política monetária desprovida dos indispensáveis suportes fiscais e económicos, mas que tem servido na perfeição os interesses das principais economias europeias e de quem alimenta a esperança de não ver o dólar apeado do papel de divisa hegemónica. Foi graças à liberalização da circulação de capitais e a um sistema fiscal particularmente favorável[1] que se acentuaram as divergências de crescimento entre as economias do norte e do sul europeu, princípios estes em que assentaram a criação da moeda única e o Tratado de Maastricht, pelo que esperar daqueles a solução do problema que criaram é, no mínimo, absurdo.

Mas isso é precisamente o que parecem pretender os dirigentes dum conjunto de grandes empresas num documento publicado há dias no LE MONDE, no qual defendem a aplicação de regras ainda mais restritivas no financiamento público como via para a resolução do que apelidam de crise da dívida mas não do Euro. A este reconhecem a criação dum vasto mercado que lhes proporcionou ganhos acrescidos e maiores capacidades de financiamento e de competitividade internacional, pelo que rejeitam qualquer ideia de exclusão entre os actuais membros da Zona Euro. Por outras palavras, os grandes patrões franco-germânicos pretendem que tudo seja feito para que nada belisque os grandes ganhos que têm vindo a realizar, estratégia que está plenamente assegurada pela actuação do duo Merkel-Sarkozy.

Aliás o mesmo poderá ser dito da actuação dos governos submetidos aos programas de resgate patrocinados pelo FMI e pelo BCE, com especial destaque para o da Grécia que acaba de aprovar mais um pacote de austeridade e para o de Portugal, cujo recém eleito governo acaba de apresentar o seu programa que contrariando todas as promessas eleitorais inclui, pasme-se..., novos aumentos de impostos sobre os rendimentos do trabalho. 

Esta estratégia de contínua transferência dos custos duma crise, em boa parte originada nos erros políticos de concepção e de estratégia em torno da moeda única, para as famílias e o contínuo apelo a políticas restritivas no capítulo do investimento e das despesas públicas sabendo-se geradora de recessão económica conduzirá ao agravamento da crise económica que aqueles países já atravessam e prontamente produzirá aquilo que os seus defensores afirmam pretender evitar – o contágio às restantes economias da zona euro.


Para se ter uma ideia do que está realmente em jogo atente-se que a estimativa das necessidades de financiamento até meados de 2013 das economias europeias sujeitas a programas de resgate (Grécia, Irlanda e Portugal) ascende a 200 mil milhões de euros, valor que as actuais disponibilidades do FEEF (Fundo Europeu de Estabilidade Financeira) e do FMI ainda comportam, mas se os ataques especulativos se estenderem ao chamado grupo de risco intermédio (Espanha Bélgica e Itália) o valor ultrapassará rapidamente aquele limite de 750 mil milhões de euros, pois a simples inclusão da Espanha elevará o montante inicial para mais de 520 mil milhões e a da Itália, com 1,1 biliões de euros, mais que duplicaria aquele valor.

A dimensão destes números (que embora sejam estimativas raramente são referidos pela comunicação social) é indispensável para se avaliar as proporções da catástrofe que ameaça a zona euro e o nível de responsabilidade do BCE que em nome da defesa da estabilidade e da contenção da inflação tem assumido uma intransigente recusa de monetarização da dívida pública (a célebre proposta de financiamento directo aos estados-membros) mas não tem receado a mesma prática em benefício do sistema bancário. Idêntica razão, acrescida das anteriormente apontadas para o eclodir da crise (a concorrência fiscal e salarial em economias com graus de desenvolvimento muito heterogéneo e a liberdade de circulação e de especulação dos capitais, directamente derivadas do modelo de introdução da moeda única e do Tratado de Maastricht), justifica o ponto de vista que defende a necessidade de reformulação de todo o modelo da moeda única, incluindo a transformação do papel do BCE, de financiador do sistema bancário europeu em financiador dos estados-membros.

Persistindo numa mera estratégia de adiamento, por ausência das necessárias medidas, ou na mera tentativa de ganhar tempo (como parece ser a opção por medidas paliativas e de reduzida ou nula eficácia geral) os dirigentes europeus continuam não só a beneficiar os credores a expensas das populações dos países periféricos do Euro como arriscam que a generalização do “pânico” atinja as suas próprias economias... e nessa altura já será demasiado tarde para impedir a falência do projecto europeu.


[1] No caso da Alemanha (a economia europeia que mais se destaca pelos seus excedentes comerciais) há ainda que acrescentar as inegáveis vantagens no capítulo dos custos salariais resultantes do processo de integração da Alemanha de Leste e do efeito que esta teve na redução do crescimento salarial.