sexta-feira, 2 de dezembro de 2005

PLANOS AMERICANOS E REACÇÕES IRAQUIANAS

Após a apresentação no dia 30 de Novembro, feita durante um discurso do Presidente George W Bush na Academia Naval americana, do conteúdo de um documento posto a circular com a designação de “Estratégia Nacional para a Vitória no Iraque”, no qual a administração americana procura:

- demonstrar a inevitabilidade do conflito (definindo o território como um ponto fulcral na luta contra o terrorismo);

- definir as suas características (distinguindo nacionalistas, seguidores de Saddam Hussein e terroristas ligados à Al Qaeda);

- definir as respectivas estratégias para cada grupo;

- definir o processo de reconstrução económica;

não tardaram a surgir as primeiras reacções.

A oposição Democrata classificou o discurso e o documento como uma repetição das teses habituais da Casa Branca e criticou-o pela ausência de uma planificação temporal para a presença das tropas americanas no Iraque.

Quase simultaneamente um influente senador republicano (John Murta), ex-marine e considerado como um dos “falcões” do partido, defendeu que o exército americano já fizera o que podia pelo Iraque pelo que era tempo de retirar as tropas.

Do lado iraquiano o discurso de George W Bush foi igualmente pouco apreciado quer pelos sunitas quer pelos xiitas. Neste último grupo o líder do Exército do Mahdi – Moqtada Al-Sadr – foi das vozes que de pronto se fizeram ouvir exigindo a marcação de uma data para a retirada americana.

Numa fase em que se aproxima novo processo eleitoral (eleições legislativas marcadas para 15 de Dezembro) o clima no Iraque encontra-se bem longe da pacificação que a administração norte-americana tanto apregoa.

Quase coincidente com a informação prestada por porta-vozes do exército americano e iraquiano de que havia sido concluída com sucesso mais uma campanha de “limpeza” e de controlo junto à fronteira síria e com o discurso do presidente americano, forças rebeldes iraquianas ocuparam a cidade de Ramadi e atacaram a guarnição americana local.

Esta acção, prontamente reivindicada pelo grupo de Abu Mussab Al-Zarqawi (tido como próximo da Al-Qaeda), vem demonstrar a fragilidade da posição americana apesar de um porta-voz militar ter procurado minimizar o acontecimento, tem de relevante o facto de ter sido executada durante o dia e de assumir contornos de uma operação militar de escala apreciável, executada segundo um plano metódico e tendo por cenário uma zona pretensamente “limpa” de insurrectos.

Mais relevante que o resultado final – a retirada após uma breve ocupação – esta acção vem demonstrar que as milícias de Al-Zarqawi, em vez de se apresentarem em situação de retirada se encontram activas no terreno e beneficiando de uma estrutura real de comando.

Perante esta sucessão de acontecimentos não será de estranhar a crescente descrença nas declarações oficiais da Casa Branca, o aumento de tom dos opositores (internos e externos) a este conflito e as crescentes dificuldades encontradas para o alistamento de voluntários, pelo que o Pentágono estará a proceder à convocatória de 78 mil antigos militares oferecendo-lhes remunerações entre os 1.000 e os 19.000 US$.

No mesmo dia do assalto a Ramadi, um instituto americano (Washington Institute for Near East Policy) apresentou um relatório elaborado por dois especialistas, segundo o qual o Iraque atravessa um período decisivo que poderá durar entre seis e nove meses, após os quais se avaliará se os esforços americanos tiveram sucesso ou não. Segundo um dos autores, Jeffrey White, a resistência que inclui nacionalistas, membros do antigo regime de Saddam Hussein e combatentes islamistas estrangeiros, não mostra sinais de enfraquecimento ao fim de 32 meses de ocupação americana e nem mesmo os milhares de insurrectos mortos e as dezenas de milhares de detidos conseguem contrariar a ideia que a insurreição está cada vez mais forte.
Segundo o mesmo analista a resistência apenas tem conseguido explorar o descontentamento de uma minoria de sunitas descontentes, mas se conseguir capitalizar apoiantes entre xiitas e curdos pode aumentar grandemente a sua capacidade militar.

Temos ainda que o conflito iraquiano, além de ameaçar eternizar-se, constitui também um permanente foco para alimentar as teses radicais islâmicas que têm fundamentado os atentados terroristas que vão acontecendo um pouco por todo o lado.

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