domingo, 4 de dezembro de 2005

CAMARATE E A JUSTIÇA

No dia em que se assinalam 25 sobre a morte de Sá Carneiro (embora não haja polémica no PPD/PSD em que uma, ou mais, das facções se não reclame de “herdeira” do falecido líder) volta a ser notícia o “Caso Camarate” com os familiares das vítimas a procurarem junto do Supremo Tribunal a anulação da decisão de prescrição.

Compreendendo algumas das razões (começou por se falar numa possível ligação com o desaparecimento de fundos de um então extinto Fundo de Defesa Militar do Ultramar que Adelino Amaro da Costa, ministro da defesa de Sá Carneiro, estaria a investigar e mais recentemente, e com crescente insistência, na existência de ramificações com o tráfico de armamento) para que tenha decorrido tanto tempo desde a queda do CESSNA e que também justificaram a necessidade de oito comissões parlamentares de inquérito para que começasse a ganhar algum peso a tese defendida pelos familiares, que apontam para a existência de um atentado, não deixa este caso de ser mais um dos paradigmáticos da forma de funcionamento da justiça neste país.

Independentemente das poderosas razões que ditaram sucessivas contradições entre os resultados dos inquéritos, não deixa de fazer aqui sentido referir a lentidão do sistema judicial nacional. Confirmando esta característica vejam-se as notícias hoje difundidas sobre o célebre processo do “Apito Dourado”, segundo as quais anda haverá que esperar cerca de uma ano até à formalização de todas as acusações, devido à complexidade do processo e à falta de pessoal.

Por poucos meios que os tribunais tenham ao seu dispor (e até posso acreditar que seja uma realidade) é cada vez mais difícil justificar semelhante morosidade, atendendo a que nos tempos actuais existem mecanismos (sistemas informáticos e de comunicações) que deveriam contribuir para diminuir esses mesmos prazos (a menos que todo o trabalho continue a ser executado manualmente ou que aos utilizadores dessas novas ferramentas não tenham sido providenciada a formação adequada).

E aqui voltamos ao problema de sempre. Se a função pública não dispõe de ferramentas de trabalho adequadas e consequentes com os tempos que se vivem, caberá perguntar qual o destino dos milhões de euros anualmente orçamentados para a modernização dos serviços? Se, pelo contrário, os equipamentos foram adquiridos mas os seus operadores não foram alvo de um processo de formação adequado, então para que serviu o investimento nos equipamentos?

Todas estas questões continuarão a ter a resposta habitual – os funcionários públicos revelam dificuldades na adaptação às novas tecnologias e/ou as próprias normas de serviço não foram adaptadas às novas realidades – enquanto a qualidade do serviço prestado (que no caso da justiça, como noutros, não se mede apenas pelo número de processos despachados mas também pelo tempo que os mesmos demoram a sê-lo) se continua a degradar.

Como habitual entre nós chegar-se-á à conclusão que a responsabilidade por este tipo de situação não cabe a ninguém, mas sim ao “sistema”, como se este fosse uma entidade com vida e querer próprios e não o fruto da acção diária de inúmeros burocratas e/ou incapazes funcionais, que têm mantido os seus lugares graças a intrincados mecanismos de compadrio e favorecimento aos quais os sucessivos poderes (governos no caso vertente e não me venham dizer que se Sá Carneiro fosse vivo seria diferente) nunca souberam, ou quiseram, opor-se.

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