sábado, 24 de dezembro de 2005

O MÉDIO ORIENTE E A POLÍTICA DE “DOIS PESOS E DUAS MEDIDAS”

Nos últimos dias têm surgido várias notícias relativas ao ambiente no Iraque após as eleições realizadas no passado dia 15 de Dezembro.

Não que tenham terminado os atentados e os incidentes com tropas americanas e iraquianas, mas porque as informações sobre o andamento da contagem dos boletins de voto tem despoletado algumas reacções.

Entre as principais contam-se as dos partidos sunitas cuja contestação aos resultados rem vindo em crescendo. Ontem mesmo milhares de manifestantes vieram para as ruas de Bagdad, Tikrit e Samarra, protestando contra o que entendem ser um logro eleitoral e reclamando a repetição das eleições.

Já hoje os partidos xiitas, nomeadamente a Aliança para a Unidade Iraquiana, vieram apelar ao fim da contestação e oferecendo-se para negociar a participação dos sunitas no próximo governo.
Paralelamente a potência ocupante anuncia a redução de tropas durante a próxima primavera, falando na retirada de duas brigadas (num total de cerca de 8.000 homens), anúncio que é interpretado como sinal de crescente apaziguamento no território.

Do que atrás ficou dito ressalta a existência de informações e sinais contraditórios sobre a situação que efectivamente se estará a viver no país e que em boa medida vêm confirmar que a estabilização do país não vai resultar de um mero acto eleitoral.

Já em anteriores ocasiões me referi às enormes diferenças culturais que separam os povos do médio oriente e do ocidente (Europa e América do Norte), facto que me parece que continua a não ser tido em conta nesta questão como noutras que envolvem aquela região do globo.

É o que sucede com o próximo acto eleitoral palestiniano (agendado para o mesmo dia que as nossa eleições presidenciais) que se encontra rodeado em viva polémica e no qual abundam os problemas de ordem interna e externa. Internamente verificam-se grandes dificuldades para a direcção da Fatah conciliar o clima de “guerra” aberta entre as alas tradicional e moderna, agravadas há uns dias quando o governo israelita anunciou que não permitiria a realização do escrutínio em Jerusalém oriental.

Nesta zona da cidade vivem cerca de 250 mil palestinianos a quem em anteriores eleições havia sido permitido o exercício do direito de voto, mas que agora face à forte probabilidade do Hamas (movimento guerrilheiro que se opõe militarmente à ocupação israelita) poder vir a vencer este acto eleitoral, regista esta reacção israelita.

A Autoridade Palestiniana tenta fazer valer a sua muito reduzida força anunciando que adiará o acto eleitoral caso Israel não altere a sua posição.

No meio deste imbróglio ainda não se fez ouvir a voz da administração americana – o grande garante mundial da democracia – tão empenhada em democratizar países ocupados como o Afgenistão e o Iraque e, simultaneamente, tão pouco preocupada com a actuação ingerente e antidemocrática de Israel relativamente às eleições palestinas.

Será que mais uma vez vamos voltar a assistir à aplicação da velha prática de “dois pesos e duas medidas” ao problema palestiniano?

Porque é que até ao momento a União Europeia ainda não fez ouvir a sua voz?

Silêncio ainda mais comprometedor quando a troika europeia (França, Alemanha e Reino Unido) procuram negociar com o Irão (outro país árabe) o seu programa nuclear.

Será que também a Europa pensa que vai contribuir para a resolução da agitação islâmica fundamentalista com a aplicação de uma política de “dois pesos e duas medidas” – admitindo a existência do arsenal nuclear israelita e negando idêntico direito às nações árabes – baseada no princípio redutor de que aos israelitas tudo é permitido enquanto aos árabes tudo é proibido?

Até que ponto a actuação americana não está a ser gizada no sentido de torpedear a tentativa de mediação europeia para abrir caminho ao ataque israelita à central nuclear iraniana?

Será que está é a via para alcançarmos um mundo mais pacífico e seguro ou apenas a via para garantirmos a sobrevivência de um modelo de poderio arrogante e cada vez mais distante da realidade?

As respostas conhecelas-emos com o tempo, restando a esperança que depois não seja demasiado tarde!

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