No preciso dia
do acontecimento o LE
MONDE escrevia num editorial intitulado «O GRANDE SALTO EM FRENTE NA UNIÃO
BANCÁRIA» que:
«A Europa esforça-se para seguir os caminhos aparentes da tecnocracia. A Comunidade
Europeia do Carvão e do Aço em 1950, podia parecer um obscuro acordo entre os
donos das siderurgias europeias. Tratou-se dum grande salto político que tornou
a guerra entre a França e a Alemanha "fisicamente impossível" e
começou uma integração europeia irreversível.
O mesmo
sucede com a união bancária decidida na madrugada de quinta-feira, 13 de
Dezembro, pelos ministros das Finanças dos 27. Esta decisão marca um salto em
frente, que pretende tornar impossível, não a guerra, mas a morte do euro.
Depois da
criação, em 2010, do Fundo Europeu de Solidariedade para resgatar os estados em
dificuldades, os europeus apenas corrigiram uma segunda falha na construção do
Tratado de Maastricht: a vulnerabilidade da União Económica e Monetária às
crises bancárias.
Na época,
ninguém esperava que a interpenetração dos mercados financeiros e instituições
de crédito atingisse uma proporção que permitiria a um país que representa 2%
da riqueza da União - Grécia - a afundar o todo Zona Euro.
De resgate
em resgate, a Europa entrou em um círculo vicioso: após a falência do Lehman
Brothers, em 2008, os estados tiveram de se endividar para recapitalizar os
bancos; os bancos, endividados e cépticos da liquidez dos parceiros, adquirem
as obrigações emitidas pelos Estados sobreendividados. Adicione a isso a bolha
imobiliária os défices públicos e de competitividade europeus: in fine, ninguém
sabia se seria reembolsado.
Quando na
Primavera de 2012 os bancos espanhóis ameaçaram falir, impôs-se a ideia de uma
união bancária: para se salvarem, os europeus poupados pela crise resgate
tinham de financiar directamente as instituições em falência. Os alemães
exigiram, com razão, uma avaliação prévia dos bancos pelo Banco Central Europeu
(BCE). Esta primeira etapa acaba de ser atingida. A partir de 1 de Março de
2014 todos os bancos europeus serão supervisionados pelo BCE, e os que foram
resgatados sê-lo-ão desde 2013.
A supervisão
é apenas um prelúdio, que deve ser acompanhado dum mecanismo europeu para a
gestão de crises e resgates. Esta segunda etapa também será difícil de
implementar. Incluindo para a França: se Paris aceita a autoridade do
Governador do Banco de França, quando exige a fusão de dois bancos franceses
que tenham cometido erros, não é certo que concorde com a mesma facilidade
quando a decisão for tomada em Frankfurt. Amanhã, o caso Kerviel-Société
Générale, será regulado em Frankfurt. Isto constitui um passo significativo.
A terceira etapa
consiste em estabelecer uma garantia europeia de depósitos. Isso seria o
desejável corolário da união bancária, mas rejeitada por Berlim é remota; tão
distante como a União Federal.»
Oferecendo aos
seus leitores uma descrição da crise que grassa pela Europa, que não esquece
nem escamoteia uma das principais razões – a crise ganhou dimensão depois que
os Estados aceitaram sobreendividar-se para resgatarem os seus financiadores –
porém, peca por deixar de fora da explicação o verdadeiro círculo vicioso em
que os decisores políticos europeus aceitaram mergulhar os seus próprios
países, preferindo acentuar a versão, cara ao sistema financeiro, da
necessidade de recuperação da confiança perdida.
Como noutras
ocasiões tenho referido neste espaço e a própria formulação do LE MONDE indicia, o círculo vicioso só poderá
ser eficazmente quebrado quando o financiamento público deixar de depender
exclusivamente dum sistema financeiro que há muito privilegia a especulação
pura (e dura) em detrimento daquela que historicamente constituiu a sua razão
de ser e núcleo da actividade – a recolha de depósitos para financiamento
criterioso da economia – e, dentro de critérios adequados ao interesse geral e
ao saudável funcionamento das economias, passar a ser assegurada pelo BCE.
O acordo agora
alcançado, importante no contexto do funcionamento do sistema financeiro
europeu mas limitado ao reduzido número de bancos incluídos, é, ao contrário do
que sugere a generalidade dos políticos e dos comentadores, quase irrelevante
para se alcançar uma efectiva solução para uma crise que cada vez mais se
revela como meramente destinada a alcançar uma redução geral dos custos do
factor trabalho em exclusivo benefício do factor trabalho.
1 comentário:
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