Afirmar, na
semana em que se cumpriu mais um aniversário da UE, que a Europa vive tempos
conturbados começa a ser um lugar-comum e, simultaneamente, insuficiente para
descrever o que se passa, pois se à esperada vitória eleitoral de François Hollande
somarmos a derrota da maioria dos candidatos conservadores britânicos nas
últimas eleições municipais (uma das poucas excepções ocorreu em Londres), a
ascensão meteórica duma coligação grega de esquerda (SYRIZA) e grande quebra
registada pelo próprio partido da chanceler Merkel numa eleição regional na
Alemanha, começa a parecer cada vez mais evidente que a maioria dos cidadãos
europeus rejeita as políticas ensaiadas no combate à crise e que se revê cada
vez menos nos discursos e nas afirmações dogmáticas dos líderes conservadores.
O futuro
próximo começará a clarificar a redefinição do eixo Berlim-Paris, mas para já
ressalta a clara aposta do lado alemão na reafirmação dos seus mantras e da sua
prepotência, pois dificilmente se poderão interpretar os comentários e os
“avisos” que têm sido difundidos a propósito da delicada situação política em
Atenas.
Quais
comandantes de nau destroçada, do alto da sua cada vez menos compreensível
jactância, os governantes de Berlim desdobram-se em “recados” e em “ordens”
dirigidos aos gregos (e demais europeus), agravando, senão comprometendo
definitivamente, as fracas hipóteses de entendimento entre políticos que
continuam a não praticar o princípio de sobrelevar o que os une em detrimento
do que os divide.
A atestar por
esta realidade, os primeiros contactos entre Hollande e Merkel pouco ou nada
deverão produzir de concreto, tanto mais que a questão grega coloca Hollande
num dilema: ou encabeça de imediato a contestação à política de austeridade
apoiada pela Alemanha e inviabiliza a renovação do velho conceito de que a UE
deve ser liderada pelo eixo Paris-Berlim, ou opta por uma posição de
compromisso, aceitando um acordo franco-alemão que, há maneira tradicional da
UE, concilie a reafirmação germânica do predomínio da austeridade com a
pretensão francesa de ver privilegiadas as políticas de crescimento, enquanto aguarda
que a possível entrada do SPD (partido social democrata) no próximo governo alemão
se traduza numa flexibilização da ortodoxia austeritária.
Mesmo sem
esquecer que a opção do novo presidente francês será sempre determinada pelos
interesses francófonos, importa realçar que continua a crescer o número dos que
contestam (ou pelo menos questionam) a eficácia da opção pela austeridade; destacando-se
no plano externo o chefe do governo italiano «Mario Monti
propõe “coligação de boas vontades” a favor do crescimento» e o próprio
presidente do BCE, Mario «Draghi
pede à Europa para pôr o crescimento no centro da agenda», enquanto no
plano interno foi esta semana notícia a afirmação de «Mário
Soares diz que PS deve romper com a troika»; contra esta corrente pouco
mais que Passos Coelho, o famigerado inventor da “austeridade expansionista”, e
o seu homólogo espanhol, Mariano Rajoy, insistem que «Vitória
de Hollande não muda políticas», mas a verdade é que os resultados dos
últimos sufrágios na Europa estão a abalar o coro das harpias europeias do
neoliberalismo.
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