A persistência
nas notícias e alguma precisão entretanto incluída, justifica o regresso ao
tema da redescoberta do investimento em Portugal.
A avaliar pelo
empenho que os ministros das Finanças e da Economia revelaram na conferência de
imprensa onde anunciaram que o «Governo
quer inaugurar nova era com “super” apoio ao investimento» e pelo especial ênfase
posto na afirmação de que «"Chegou o momento do investimento"»,
dir-se-ia que assistimos a uma espécie de exorcismo da crise e que de agora em diante
nada voltará a ser terrível como foi.
Segundo notícia
do DN, e com o nível de detalhe e precisão a que Vítor Gaspar já nos
habituou, o «…ministro
anunciou ainda um novo Reforço do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento, o
Alargamento dos Benefícios Fiscais ao Investimento de Natureza Contratual,
Redução do Prazo de Resposta de Informações Vinculativas e a Criação do
Gabinete Fiscal do Investidor Internacional, tudo medidas que faziam parte do
plano apresentado há um mês por Álvaro Santos Pereira», o plano
que dias depois o mesmo Gaspar veio esfrangalhar quando apresentou o DEO
(Documento de Estratégia Orçamental) ao qual o «Conselho
Económico e Social critica ausência de políticas de relançamento da economia»,
naquilo que, conforme noticiou
o I, o ministro classificou como «…o "gatilho" que conduzirá à recuperação do
investimento privado, já com resultados visíveis este ano».
Seria
francamente bom para todos que Vítor Gaspar não esteja tão errado quanto as
suas habituais previsões; porém, a realidade deverá a voltar ser
particularmente madrasta com o ministro e além dos evidentes sinais
contraditórios que o Governo está a transmitir – anunciando “cortes” no
rendimento disponível para conter a despesa pública e redução de receita para
promover o investimento –, também o prazo se afigura desmesuradamente
optimista. Tanto mais optimista quanto são amplamente conhecidas duas
realidades: a profunda contracção do mercado interno, originada na política de
reduções de salários e pensões, e a historicamente reconhecida demora na
produção de efeitos económicos em resultado de estímulos de natureza fiscal.
Já para não
referir o que de pior encerra a proposta alemã – que Viriato Soromenho-Marques
bem descreveu no artigo «Diplomacia
de caridade» como: «A boa
vontade da iniciativa alemã apenas sublinha que passámos, na Europa, da lógica
multilateral entre Estados iguais para a lógica bilateral da balança de poder
entre potências desiguais. O federalismo, sempre evitado por retirar poder aos
governos para o conceder aos cidadãos, deu lugar à diplomacia de caridade da
potência hegemónica para com os seus protectorados» – e no que
revela de incapacidade para a compreensão dum fenómeno sistémico como a crise
global onde se insere a crise da Zona Euro.
Mesmo que
Vítor Gaspar esteja a contar já com o efeito dinamizador da decisão de Berlim
levando a que «Banco
estatal alemão empresta até 10 mil milhões a PME ibéricas» ou com o mais
recente anúncio originado de Paris assegurando que a «França ajuda Portugal a criar nova
agência pública financeira», afirmar que tal será sentido até
final do ano é um puro absurdo científico, inadmissível num técnico com a sua
reputação. A chegada ao tecido empresarial duma pequena fracção dos 10 mil
milhões (valor destinado não apenas a Portugal mas ao conjunto da Península
Ibérica e quase certamente alargado à Grécia) demorará tanto mais quanto esse
tecido apresenta níveis de fragilidade – descapitalização e quase inexistência
de mercados –, factores que os bancos (alemães ou nacionais) não deixarão de
ponderar e que desaconselham qualquer acréscimo de endividamento.
O único
verdadeiro sinal de esperança em tudo isto é a notícia de que estará o «Banco
estatal alemão disposto a conceder crédito e entrar em capital de empresas
portuguesas», uma vez que revela algum sentido da verdadeira dificuldade do
tecido empresarial português – a já referida escassez de capitais próprios – e,
quiçá, essa intenção possa despertar outras iniciativas no âmbito do capital de
risco em detrimento do recurso ao ineficaz sistema tradicional de crédito.
Mesmo assim, sabendo-se
que o crescimento (jargão que volta a ser moda, por via da evidente degradação
das economias europeias ou quando já se antecipa que a «Zona
euro é a maior ameaça à recuperação da economia mundial»)
numa economia não resulta apenas da existência de capitais disponíveis ou de
incentivos fiscais, antes da conjugação daqueles factores com a percepção que
as empresas fazem da evolução do mercado e da sua capacidade para remunerarem
esses capitais adicionais, é de recear que o gatilho de Gaspar tenha voltado a
disparar tiros de pólvora seca.
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