quarta-feira, 6 de março de 2013

UNS REFERENDAM, OUTROS SONDAM…


Não deixa de ser curioso que num momento em que no interior do espaço da UE cada vez se levanta mais a questão dos efeitos da actual crise no sistema democrático, cheguem da vizinha Suíça sinais da clara vitalidade do seu modelo de democracia participativa, expressos na realização dum referendo de iniciativa popular, da qual resultou que a «Suíça aprova limites para salários abusivos dos patrões».


Na prática os helvéticos foram chamados a pronunciar-se sobre uma questão que desde a extensão da crise do “subprime” à economia real tem ganho relevância particular e em especial sempre que são noticiados os prémios anuais dos CEO’s das grandes empresas e fizeram-no não por iniciativa dos seus representantes políticos mas em resultado duma iniciativa particular.

Não fosse a possibilidade constitucional de grupos de cidadãos poderem despoletar processos de referendo e a sua nomenclatura política, à semelhança das congéneres vizinhas, manter-se-ia indiferente à questão e indisponível para afrontar aqueles que cada vez mais se perfilam como os interesses que os movem.

Mais importante que o assunto referendado – e ateste-se a sua relevância quando na passada semana foi notícia que a «UE acorda limitação dos bónus na banca» – parece-me de destacar a importância da existência legal de formas concretas de participação política dos cidadãos e apetece mesmo deixar uma questão: como seria em Portugal se uma pequena parte das centenas de milhares de manifestantes (quantificação propositadamente vaga para não alimentar a polémica dos números) que no último Sábado engrossaram as manifestações contra a política do actual governo, subscrevessem uma proposta de alteração de política?

A ausência de tal hipótese, a par como tudo o que nas últimas décadas foi feito para desmobilizar e desmotivar a participação política activa dos cidadãos, é, como facilmente se demonstra, do rigoroso interesse das elites políticas (e dos interesses que estas representam), pois ao coarctar qualquer iniciativa popular assegura, automaticamente, a dupla finalidade de perpetuar no poder as mesmas elites e de desmotivar qualquer veleidade de oposição não organizada nos moldes tradicionais. O pior é que a solução não resolve afinal a mobilização popular alimentada por genuínos sentimentos de revolta, que os poderes estabelecidos receiam de sobremaneira e que no extremo pode até converter-se no pesadelo extremo duma sublevação popular.

Isso mesmo poderá já integrar, subliminarmente, a mensagem dirigida por Marcelo Rebelo de Sousa ao governo de Passos Coelho, quando no rescaldo das manifestações da véspera, aquele disse perante as câmaras da TVI que o «Governo “vai ser obrigado a mudar de política”», o mesmo se podendo dizer dos resultados duma sondagem sobre a questão da Reforma do Estado, realizada pelo CESOP/UCP, para o DN, JN, Antena 1 e RTP e da qual se conclui uma completa oposição às medidas tomadas e anunciadas pelo actual governo.

Basta aliás olhar para o gráfico onde se comparam as diversas opções para o corte dos anunciados 4 mil milhões de euros (o tal número mágico que nem o Governo nem a “troika” parecem capazes de explicar a origem e a dimensão) …


…para se concluir que a esmagadora maioria dos entrevistados manifesta opinião absolutamente contrária à que tem sido a estratégia do governo de Passos Coelho.

Claro que as sondagens têm um valor muito relativo face aos referendos, mas ainda assim merece que se destaque o facto dos inquiridos se manifestarem claramente a favor da fixação da idade da reforma entre os 60 ou os 65 anos (80% escolheram uma das duas hipóteses) e contra a privatização integral dos sistemas de protecção social; apenas 5% defenderam semelhante hipótese, contra os 54% que declararam que esta se deveria manter exclusivamente na esfera pública.

Em jeito de conclusão bem se poderia dizer que uns referendam, proporcionando maior intervenção e responsabilidade aos cidadãos, enquanto outros sondam…


...(até quando das sondagens resulta que «Portugueses querem referendo para decidir reforma do Estado») e assim continuarem a servir interesses espúrios!

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