quarta-feira, 13 de março de 2013

DO GULASH AO GULAG


Não bastando a longa sequência de acontecimentos e de falsas soluções para os problemas da UE para justificar o estado de catatonia em que vive, eis que os recentes desenvolvimentos em torno duma revisão constitucional na Hungria trazem para o centro das atenções dúvidas e questões pertinentes sobre os limites da democracia.

Mas será verdadeiramente estranho que apesar das manifestações populares e das reacções de responsáveis da UE e dos EUA «Parlamento da Hungria vota emendas à Constituição sob pressão internacional» ou que a «Maioria exime Governo à fiscalização e ao controlo» quando vários países da Europa atravessam ambientes verdadeiramente limitadores das liberdades e garantias dos seus cidadãos? Haverá alguma dúvida que as soluções ensaiadas na Grécia e na Itália de governos não-eleitos (cautelosamente designados de tecnocráticos) ou de governos, como o português, que aplicam políticas absolutamente contrárias aos programas com que se fizeram eleger, não são claros sinais de suspensão da democracia?

No fundo tudo isto será consequência natural do desânimo das populações, fruto do descrédito dos arrivistas que têm tomado de assalto o poder, ou resultado dum bem arquitectado plano de aterrorização das populações para facilitar o recurso a soluções antidemocráticas e assegurar a perpetuação dos ganhos das minorias influentes?

Serão os Monti, os Van Rompuy, os Barrosos, os Passos Coelho ou os Viktor Orban, por esse mundo fora, os verdeiros responsáveis pelo descrédito das instituições que representam ou meros títeres, parcos de vontade própria?


No caso deste último, que arrisca ficar para a história como o homem que mudou o gulash[1] em gulag[2], talvez pouco mais se possa dizer além de que terá passado à prática a tímida solução da suspensão temporária da democracia em tempos proposta por Manuela Ferreira Leite, então líder do PSD e abrindo caminho (na linha do protagonizado aqui por Gustavo Cardoso) à democracia zombie.

A lamentável situação dos húngaros deve ser acompanhada de perto, não apenas pelo que ela pode apresentar de premonitório para outros estados europeus mas principalmente para se avaliar a reacção e a capacidade dos líderes da UE, os tristes Van Rompuy e Durão Barroso, para fazerem respeitar os princípios democráticos que dizem nortear ainda a união económica que dirigem.


[1] Nome dum prato tradicional húngaro, que consiste num guisado de carne cortada em cubos, alourada em gordura e a que se junta farinha, cebola e especiarias.
[2] Designação pela qual ficaram conhecidos os campos de trabalhos forçados e de reeducação política a que, especialmente no período estalinista, eram condenados os oposicionistas na antiga União Soviética.

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