Foi sem
qualquer surpresa que li esta semana no NEGÓCIOS uma notícia revelando que os
cursos de economia pecam por muita matemática e pouca reflexão, onde “[m]ais de um terço dos créditos das
licenciaturas de Economia em Portugal é dedicado à matemática e à gestão,
enquanto apenas 1,6% vai para cadeiras de ética, pensamento crítico e de teoria
e história do pensamento económico”, considerando que se aplica de forma
generalizada nos doze países observados.
Esta questão
não é nova – há muito tempo se debate qual o campo onde se deve inserir a
ciência económica: o das ciências sociais ou o das ciências exactas – mas
ganhou nova visibilidade com o eclodir da crise sistémica e a constatação da
incapacidade dos especialistas para a preverem e a combaterem.
A crescente
redução da ciência económica aos pressupostos da modelização (técnica que
recorre à elaboração de modelos econométricos para a avaliação de hipóteses)
tem estado bem patente quer nas explicações de analistas e de mais especialistas
quer nas soluções aplicadas para resolver crises como a das dívidas soberanas.
Quem se esqueceu já da célebre folha de "Excel" de Vítor Gaspar e dos
maravilhosos resultados de crescimento e bem-estar que proporcionou à esmagadora
maioria dos portugueses? para não falar da espectacular redução dos desequilíbrios
orçamentais e do endividamento público?
Eufemismos à
parte, quem consegue entender o uso e abuso duma ferramenta de trabalho (sim,
a econometria e os modelos econométricos são simples ferramentas de trabalho) e
a sua transformação em deus ex machina
pela simples recusa da avaliação crítica dos seus resultados?
Claro que boa
parte das razões para a sobrevalorização da componente matemática derivam das
inegáveis vantagens que oferece aos defensores da inexistência de alternativas
(do tipo da enunciada por Cavaco Silva quando defende o postulado que duas
pessoas com idêntica formação e igual informação alcançam sempre o mesmo resultado),
mote consolidado pela queda do Muro de Berlim e pelos teóricos do “fim da história”
(i.e. Samuel P. Huntington e Francis
Fukuyama), mas causas internas ao próprio sistema de ensino também não são de
desprezar, pois quer no nível superior quer nos que o antecedem a cultura da análise
crítica é inexistente. E como se tal não bastasse importa ainda referir que é
bem mais fácil ensinar “matemática” que ensinar “a pensar”, pelo que
dificilmente assistiremos a uma alteração qualitativa no ensino/aprendizagem das
ciências economias, por muitos e bons que sejam os esforços pessoais dalguns
economistas ou de organizações como a «Economia
Sem Muros».
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