Depois de ter
apresentado um volume recorde de prejuízos (3,57 mil milhões de euros), de ter
visto a cotação em bolsa cair para valores históricos («BES fixa novo mínimo nos 10 cêntimos e já vale menos
de 675 milhões») e quando era cada dez mais evidente que
o «Mercado
antecipa novos pedidos de protecção de falência no GES», a autoridade
reguladora (CNVM) lá se decidiu pela suspensão da negociação daqueles títulos e
o Banco de Portugal, depois de ter repetido até à exaustão que «“A
situação de solvabilidade do BES é sólida”», lá acabou por anunciar
o inevitável
Afastado o
estigma da nacionalização mediante uma operação fantasma onde um «"Novo"
BES recebe ajuda de 4,9 mil milhões de euros através do fundo de resolução»
enquanto os accionistas e os activos tóxicos (leia-se os créditos ao GES) são
separados para um “velho” BES que entrará em processo de falência. A “magia”
financeira é realizada mediante recurso ao Fundo de Resolução (entidade
participada por todos os bancos nacionais, que «vão
fazer contribuição especial de 133 milhões para Fundo de Resolução») e
reforçada com um financiamento público da ordem dos 4,4 mil milhões de euros,
não sendo pois descabido afirmar que o «Fundo
de Resolução é da banca mas vai usar dinheiro do Estado».
A solução da
divisão entre “banco-bom” e “banco-mau” insere-se no modelo definido pela UE
para enfrentar a crise financeira cipriota, mas na forma como foi anunciada por
Carlos Costa deixa margem a justas e fundadas dúvidas. Se por um lado o isolamento
dos activos tóxicos numa entidade da exclusiva responsabilidade dos accionistas
do BES parece garantir que os prejuízos ficarão com quem avalizou a anterior
equipa de gestão, por outro a pronta disponibilização de 4,4 mil milhões de
euros de financiamento público pressagia dias cinzentos para a generalidade dos
contribuintes, a menos que a tríade Carlos Costa (governador do Banco de
Portugal, que deu a cara pela solução), Maria Luís Albuquerque (ministra das
Finanças que teve de dar sua anuência à solução) e Vítor Bento (CEO do novo
banco) consiga assegurar a venda do novo banco por um valor superior ao do
crédito.
Dúvidas (e
dívidas) são o que não tem faltado em todo este processo, quando continua
longe de esclarecido porque foi permitido à família Espírito Santo continuar à
frente da direcção do BES depois que foram conhecidas as primeiras
irregularidades, porque se demorou tanto tempo a decidir a intervenção do Banco
de Portugal, ou até se o apuramento das imparidades resultantes do cruzamento de
empréstimos entre empresas do GES estará correcto e concluído. Igualmente por
esclarecer e passível de óbvia suspeição de “inside trading” foi a meteórica passagem da Goldman Sachs pelo
capital do BES, que levou o DINHEIRO VIVO
a publicar que «Quem
sobreviveu melhor ao naufrágio do BES? O Goldman Sachs», que poucos dias
antes da suspensão da negociação das acções e da intervenção do Banco de
Portugal vendeu qualquer coisa como 4 milhões de acções e que agora a notícia
de que a «CMVM
vai investigar negociação de acções do BES na sessão de sexta» mais
parece uma operação de cosmética para disfarçar o indisfarçável.
Questão que também ficou
esquecida no anúncio
do Banco de Portugal são as condições de remuneração do empréstimo dos 4,4
mil milhões, única forma de sabermos se aquela taxa cobre ao menos o encargo
que está a ser pago à “troika”,
questão que seria respondida mais tarde pela ministra das Finanças quando
afirmou que o «Estado
cobra juros de 2,95% no empréstimo ao Novo Banco», valor que ficará,
segundo a mesma fonte, 15 pontos base acima da taxa
cobrada pela “troika”, porque o
risco é muito reduzido.
Argumento um
pouco menos aleivoso que o invocado quando o «Banco
de Portugal garante que contribuintes não perderão dinheiro no BES», que o
mesmo é dizer que o “BES-bom” será vendido a prazo por um valor suficiente para
a recuperação do financiamento; mas será? É que a menos de 48 horas do anúncio
já o NEGÓCIOS se interroga (e
bem) se o «Novo Banco vale 4,4 mil milhões de euros?»
A pseudo-engenharia financeira montada pelo Banco de Portugal e pelo Ministério
das Finanças apresenta falhas estruturais insanáveis que começam no primeiro
momento da separação dos activos tóxicos (ninguém pode assegurar que estes
foram integralmente transferidos para o “banco-mau”), continuam numa solução
que inclui um elevadíssimo financiamento público e no pressuposto de que o seu
reembolso será assegurado pela alienação do “banco-bom”. Para tranquilizar os
espíritos mais inquisitivos (ou simplesmente mais informados), os responsáveis
pela solução logo foram adiantando que a segurança dos contribuintes era total,
pois se o valor de venda não chegar para o reembolso a diferença será
assegurada pelos titulares do Fundo de Resolução (leia-se os bancos nacionais),
que não dispondo de meios próprios para o efeito, recorrerão, como é óbvio, a
quem terá que os resgatar para evitar o famigerado risco sistémico: o Estado.
Talvez por
sobejo conhecimento de toda esta trapalhada e do medonho risco a que está a
submeter o País, embalado no doce remanso dos seus congéneres europeus e
mundiais que insistem em nada alterar na regulamentação dum sector financeiro
que se revela cada vez mais o cerne de todos os problemas, o «Governo
tenta passar pelos pingos da chuva no caso do BES» e começou por enviar
para os holofotes da TV o governador do Banco de Portugal, figura de última
linha na hierarquia da responsabilidade política, enquanto o primeiro-ministro
permanece desaparecido para banhos nos algarves e o pusilâmine presidente da República se mantém mudo e quedo no seu cantinho.
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