terça-feira, 8 de julho de 2014

BANKSTERS

A pergunta, «Os banqueiros ainda são confiáveis?», que Nicolau Santos deixou há dias no EXPRESSO é pertinente, actual e merecedora de óbvia resposta, principalmente quando assistimos ao desenrolar de mais um escândalo no sector financeiro, despoletado por «Um tsunami que começa por uma zanga de família» em torno da sucessão do todo-poderoso Ricardo Salgado que, depois de ter resultado na divulgação dalguns “negócios” pouco claros, já envolve empresas fora do universo familiar (como a PT), e que se encontra longe, demasiado longe, de poder ser encarado como mero problema da família Espírito Santo ou do banco que tem o seu nome.

Na falta de cabal esclarecimento sobre uma intrincada teia de participações cruzadas entre o banco (BES) e empresas do Grupo Espírito Santo (GES), paira no ar a dúvida sobre a eventual necessidade daquele vir a ser chamado ao pagamento de responsabilidades doutras empresas do universo familiar, tanto mais pertinente quando o I assegura que o «Grupo Espírito Santo paga a uns clientes e a outros não» e o NEGÓCIOS diz que já há «Clientes de banco suíço do GES sem reembolsos da ES International»; e se o ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares, Marques Guedes, já se apressou a afirmar que os «"Depositantes do BES podem estar perfeitamente tranquilos"», nada adiantou quanto ao que poderão esperar os contribuintes caso os poderes estabelecidos, recuperando a invocação do famigerado risco sistémico, venham a decidir uma intervenção idêntica à que sofreram o BPN e o BPP.

Para já a única certeza é a de que «Vítor Bento convidado para presidente do BES» irá passar a gerir os destinos do banco e que a ele se juntarão Moreira Rato (o actual presidente do Instituto de Gestão do Crédito Público) como administrador financeiro e Paulo Mota Pinto (deputado do PSD e ex-juiz do Tribunal Constitucional) como presidente não–executivo; para esclarecer nos próximos dias é o “negócio” que levou a PT de Henrique Granadeiro a subscrever quase 900 milhões de euros de papel comercial (dívida de curto prazo que se vence no próximo dia 17) emitido pela Rioforte, empresa do universo Espírito Santo, que apresenta uma elevada probabilidade de “default”, facto que, quando decorre um processo de fusão com a brasileira OI, já originou do lado brasileiro a especulação de que a «Fusão entre Oi e Portugal Telecom pode não acontecer» nos termos esperados, a ponto de já se dizer que, em claro prejuízo dos seus accionistas, a «PT já não vai ter 37% da Oi».

Pese embora o precedente criado com o caso BCP (quando, durante a passagem de José Sócrates pelo governo, Santos Ferreira deixou a presidência da CGD para substituir o ex-delfim do fundador Jardim Gonçalves, Paulo Teixeira Pinto, e “acalmar” uma guerra entre accionistas), as escolhas agora anunciadas revelam mais uma evidente promiscuidade entre o poder e os negócios quando se constata que os três nomes referidosVítor Bento é conselheiro de estado por escolha pessoal de Cavaco Silva, Moreira Rato é um evidente homem de confiança da Senhora Swap e Paulo Mota Pinto é além de deputado do PSD o presidente do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa – gravitam no restrito círculo Belém/S. Bento.

Depois dos casos BPN e BPP, que revelaram as profundas fragilidades e as medonhas manigâncias em que vive o sistema financeiro nacional, os repetidos anúncios pelo Banco de Portugal de que «"A situação de solvabilidade do BES é sólida"» não representam mais que outros emitidos pela mesma entidade: um esforço para tentar tranquilizar depositantes e restantes credores do BES. Declarações deste jaez produziram, nos casos referidos, pouco ou nenhum efeito prático, acabaram com o recurso a fundos públicos e representaram um forte contributo para a redução da liquidez do sistema financeiro nacional e para o resgate financeiro do país, que se lhe seguiu.

Revivendo aqueles tempos e a semelhança com as práticas de gestão que levaram agora à substituição da administração do BES, o recurso à nomeação de figuras próximas do Governo e da Presidência da República (o mesmíssimo universo onde funcionavam BPN e BPP e que levou até Pedro Santos Guerreiro, o insuspeito Director Executivo do EXPRESSO, a referir o BES como «O banco verde e… laranja?» e apesar de há poucos dias se ter lido no ECONÓMICO que «Passos diz que problemas do GES não dizem respeito ao Estado») não deverá significar factor de acrescida segurança, excepto para a família Espírito Santo, pois a “entrada” de Vítor Bento terá sido acompanhada das indispensáveis garantias públicas de que surgirão os meios para “salvar” um banco, sempre a expensas dos contribuintes.

Enquanto isto e quando se avolumam as notícias sobre outras suspeitas – como a de que o «Luxemburgo avança com investigação às holdings do Grupo Espírito Santo» ou os «Estados Unidos inspeccionam Espírito Santo Miami» – que impendem sobre os gestores do GES é impossível não recordar a miríade de casos que ao longo dos últimos anos têm envolvido o nome Espírito Santo, como sejam o caso Portucale, financiamentos ao CDS, as operações da Escom e as comissões da Ferrostaal, os “negócios” angolanos, o dinheiro de Pinochet depositado nas agências “offshore” do BES, as comissões recebidas e não declaradas por Ricardo Salgado, o escândalo Monte Branco e Akoya.


Em resumo, e em resposta à questão de Nicolau Santos, tudo aponta para mais um caso de manifesta gestão duvidosa (eufemismo para designar o facto desta ainda não ter sido devidamente sancionada pela Justiça, pese embora ser notícia que há algum tempo existem «Empresas offshore de Ricardo Salgado referenciadas pela Justiça») que justificará o recurso a um epíteto em uso no rescaldo da Grande Depressão, época em que os banqueiros (bankers) eram abertamente apelidados de “banksters”, expressão resultante da fusão com “gangsters”, tal era a qualidade da sua actuação e a imagem que dela era percepcionada.

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