segunda-feira, 5 de maio de 2014

CRÓNICA DUMA SAÍDA ANUNCIADA

Lembrando o recente óbito do escritor Gabriel Garcia Marquez bem se poderia adaptar o título da sua excelente “Crónica duma morte anunciada” para abordar o último discurso de Passos Coelho.

Respaldado, com pompa e circunstância, por todo o seu gabinete, Passos Coelho anunciou com júbilo o que há muito era por todos sabido: o país iria dispensar qualquer outro pacote de ajuda financeira!

Ora se decisão acabara de ser tomada pelo Conselho de Ministros, como é que o comum dos mortais poderia conhecer por antecipação os desígnios dos deuses? Simples, a Alemanha e a Finlândia já tinham deixado saber que não seria do seu agrado a opção por qualquer programa cautelar (para utilizar a designação popularizada pela imprensa) principalmente em vésperas dumas eleições europeias que prometem surpresas.

Vir perante as câmaras das televisões invocar o interesse nacional para justificar o que outros decidiram, não se reveste apenas de hipocrisia nem de cinismo (como se afirma nesta notícia do CM) antes expressa a total subserviência da actual equipa governativa a interesses espúrios.

A opção pela chamada “saída limpa” não foi apenas decidida segundo os interesses doutras capitais europeias, como constitui mais uma prova da total ausência de solidariedade entre os estados membros da UE, tanto mais que, como escreveu José Manuel Pureza em «Leiam os meus lábios», «[n]ão é por não precisarmos de almofada contra as turbulências do mercado que não teremos programa cautelar, é porque os ricos desta Europa sabem que o mínimo tremelique dos mercados é um tremor de terra para uma economia com uma dívida que em vez de diminuir cresceu e por isso não estão para arcar com o risco de nos servirem de avalistas», nem deve ser apresentada como medida do sucesso da política de consolidação orçamental, quando, segundo esta notícia do ECONÓMICO, a própria UTAO (Unidade Técnica de Apoio Orçamental) assegura que «...o grau de execução dos diferentes programas orçamentais no ano passado foi “relativamente assimétrico”. Destaca-se o Programa da Saúde com uma execução acima do previsto na dotação inicial (105,4%), bem como o programa da Solidariedade, Emprego e Segurança Social (104,5%)».
Enquanto os interesses particulares dos credores continuarem a ser privilegiados e protegidos pelos governos que deveriam zelar pelo interesse geral…

…continuarão a ser as populações a suportar os custos e os sacrifícios.

Sem comentários: