terça-feira, 27 de maio de 2014

VOTOS PARA A EUROPA

No passado Domingo votou-se um pouco por toda a Europa para a eleição de deputados ao Parlamento Europeu; a quota portuguesa de 21 parlamentares acabou quase irmãmente distribuída entre os grupos nacionais do costume (PS, PSD e CDS), com o PS a reivindicar uma vitória que, reflectida, deveria exigir grandes mudanças perfeitamente justificadas quando «PS vence por cerca de quatro pontos, abstenção atinge recorde».

Pese embora a escassa diferença, nem por isso a coligação PSD/CDS deixou de ver esfumarem-se mais de meio milhão de votos relativamente às Europeias anteriores (2009) e um milhão e novecentos mil votos relativamente às últimas legislativas (2011); se é verdade que todos os partidos com assento parlamentar perderam votos, os da coligação PSD/CDS foram quase o triplo dos restantes (PS, PCP e BE perderam no conjunto cerca de 700 mil votos) facto que torna quase incompreensível a afirmação de que o «Governo tem condições para vencer legislativas».

A aparente calma nos partidos da coligação não está a ser seguida para os lados do Largo do Rato, pois a escassa margem de vantagem alcançada pelo principal partido da oposição a um Governo generalizadamente criticado levou mesmo a uma reacção interna onde «António Costa diz que vitória do PS "soube a pouco"» ou o histórico Mário «Soares critica Seguro após "vitória de Pirro" do PS», com o EXPRESSO a assegurar «António Costa "naturalmente disponível" para liderar o PS» enquanto a «Coligação tenta aproveitar crise socialista» e «PSD e CDS fazem figas por Seguro».

Mas a figura desta votação, mantendo a tendência dos últimos vinte anos, voltou a ser a abstenção, que chegou acima dos 66% e atingiu novo recorde; nunca fomos tão poucos a votar, pois entre os países europeus «Portugal é o oitavo estado-membro com mais abstenção» apenas ultrapassado por sete estados da Europa de Leste.


Mesmo descontando o facto da evidente distorção nos cadernos eleitorais – com uma população em evidente recuo devido ao aumento da emigração e atendendo ao facto do último senso (2011) ter determinado que para uma população total da ordem dos 10,5 milhões existirem mais de 1,5 milhões de jovens até aos 14 anos, é óbvio que não podem existir mais de 9,6 milhões de eleitores – mantém-se como facto irrefutável o crescimento da abstenção, que depois de ter aumentado 13,3% nas últimas eleições europeias (2009) volta agora a crescer mais 4,5%. Outra forma de olhar para o fenómeno é através da evolução do número de votantes (qualitativamente preferível por afastar a subjectividade do total de eleitores), verificando-se que entre europeias o decréscimo foi da ordem dos 300 mil eleitores e desde as últimas legislativas (2011) a quebra foi superior a 2,5 milhões.

Ao preocupante fenómeno da abstenção temos ainda que juntar o fenómeno ocasional de mais 230 mil eleitores terem votado num partido (o MPT) quase desconhecido. A decuplicação da votação neste pequeno partido, definido como ambientalista e ruralista e que teve Gonçalo Ribeiro Teles como fundador, dever-se-á principalmente ao cabeça de lista proposto, o conhecido e polémico ex-bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho e Pinto, pois poucos dos que nele votaram serão conhecedores do seu programa.

Este fenómeno, em tudo comparável com anteriores ocorrências, como a do meteórico PRD (o partido com que Ramalho Eanes pretendeu esvaziar PS e PSD) ou a do polémico Fernando Nobre (o fundador da AMI que, depois de ter ensaiado uma candidatura presidencial independente, aceitou integrar uma lista do PSD para o Parlamento e acabou rejeitando o mandato de deputado na sequência do clamoroso fracasso na sua eleição para a presidência da Assembleia), deverá conhecer destino idêntico num futuro próximo e abandonará a cena política sem nada acrescentar de verdadeiramente novo.


Ausência de novidades ou soluções é precisamente a principal imagem que ressalta de mais este acto eleitoral, cujos verdadeiros efeitos em Bruxelas serão objecto de análise futura.

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