Mais que um
lugar-comum, associar Portugal ao fenómeno da corrupção corre o risco de se
converter numa marca indelével, tantos têm sido os relatórios das mais variadas
origens a referi-lo.
O último, da
autoria da Comissão Europeia, apresentado esta semana nem justificaria especial
destaque não fosse precisamente a sua origem.
Afirmar-se que
«Portugal
não tem uma estratégia contra a corrupção», como faz o citado relatório,
constitui mera constatação dum facto que muitas figuras nacionais têm
denunciado ao longo do tempo mas pouco ou nada diz sobre as origens ou os
envolvidos no processo, principalmente quando outra das constatações é a da
existência duma «Justiça
portuguesa sem eficácia para reprimir corrupção», afirmação que esconderá
principalmente o imobilismo do sistema judiciário.
A
imagem duma Justiça lenta contribui muito para a afirmação que «90%
dos portugueses acham que corrupção é generalizada»
e para a conclusão de que a «Corrupção
afecta o dia-a-dia de mais de um terço dos portugueses», pouco importando saber
que «Nenhum país europeu está a salvo».
No cômputo
geral a ideia é a de que o fenómeno – grave – da corrupção tende a afectar mais
os países da Europa do Sul (reafirmando a noção empírica que associa altos
níveis de corrupção aos fortes desequilíbrios financeiros e a elevados níveis
de endividamento) que os do Norte (as virtuosas economias liberais), conclusão tanto
mais tendenciosa quanto é baseada em inquéritos de opinião e não em dados
concretos, o que ainda assim não impede os autores do relatório de estimarem em
120 mil milhões de euros os prejuízos causados às economias do conjunto da UE.
Embora pouco
provável, conhecendo os mecanismos de constituição da Comissão Europeia e a sua
visível perca de importância política, seria de esperar que um trabalho desta
natureza apontasse soluções, tanto mais que Bruxelas tem revelado particular
apetência para produzir abundante e apertada legislação noutros campos da vida
europeia, como sejam os da segurança alimentar e da luta antitabágica.
Aliás, no
capítulo da legislação talvez sejamos os campeões (o PUBLICO inicia o seu editorial «A
percepção da corrupção» lembrando que “…somos bons a fazer leis e maus a aplicá-las”) tantas são as leis e os
regulamentos que ano após ano, governo após governo, têm sido aprovados com o
anunciado intuito de combater a corrupção. Já o seu efeito prático tem sido bem
diverso, deixando no ar muito mais que uma difusa suspeição sobre legisladores
e consultores que periodicamente transitam duma posição para a outra – a tão
falada promiscuidade entre legisladores e gabinetes de advogados – sem que tal
pareça estranho, suspeito ou sequer duvidoso. E a importância do papel da
Justiça é tanto mais importante quanto uma imagem da sua eficácia no combate à
corrupção seria um importante contributo, através do efeito dissuasor, para a
sua redução.
Este
laxismo estende-se além-fronteiras de forma tão visível que até a eurodeputada
«Ana
Gomes critica UE por “fechar os olhos” à corrupção» e perante as câmaras da
RTP «Ana
Gomes aponta exemplos da inacção da troika no combate à corrupção», tanto
mais evidente quando se assiste a uma permanente trasfega para o nível europeu
de políticos que a nível nacional não ficaram conhecidos pelas suas especiais
competências (deixando pairar fundadas dúvidas sobre o modelo de escolhas) ou
até pelo envolvimento em casos fortemente conotados com corrupção, e só
começará a ser eficazmente combatido com uma educação de valores e uma actuação
efectiva sobre os agentes económicos que não declarem a riqueza evidenciada e sobre
as instituições (principalmente os “offshores”)
que lhes dão cobertura.
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