Não houve no
passado fim-de-semana quem, através dos jornais ou das televisões, não tenha
tido conhecimento que iria ser aumentado o peso do «Fundo de Estabilização da Segurança Social aplicado
na compra de dívida pública».
Esta medida, decidia ainda pelo ex-ministro das
Finanças, Vítor Gaspar (em parceria com Mota Soares, o seu colega da Segurança
Social), merece abordagem mais pormenorizada, na medida em que integra
demasiadas variáveis. Assim, numa conjuntura normal – ou seja, em tempos em que
a economia nacional estivesse a evoluir de forma positiva e sustentada –
poderia constituir uma solução admissível para reduzir a exposição do crédito
público a investidores estrangeiros e até para alguma redução do risco daquele
fundo, caso os activos substituídos apresentassem risco superior.
Sucede, porém, que a actual conjuntura económica
nacional se pode considerar tudo menos normal e publicar um despacho
determinando que o «Fundo
da Segurança Social alarga limite de compra da dívida portuguesa para 90%» tem que ser observado numa
perspectiva que vai muito além da mera avaliação do risco de mercado,
concluindo-se que a mesma não passa de mais um expediente para resolver o
problema do financiamento público no curto prazo, confirmado pela notícia de
que «Necessidades
financeiras do Estado poderão baixar para metade em 2014», e sem cuidar da finalidade e verdadeiro interesse
do Fundo de Estabilização Financeira
da Segurança Social (FEFSS).
Além da óbvia
questão da promiscuidade entre decisores com interesses aparentemente diversos
– o ministro tenta assegurar o financiamento da dívida enquanto os gestores do
fundo deveriam preocupar-se em assegurar a rentabilidade e o baixo risco das
suas aplicações – e da subserviência dos gestores do FEFSS aos ditames
ministeriais, ressalta ainda outro facto não menos greve: aquele fundo não é
propriedade nem do Ministério das Finanças nem do da Segurança Social, antes
dos trabalhadores (aposentados ou no activo) que para ele descontaram. O Estado
é um mero administrador a quem os contribuintes directos confiaram a gestão do
Fundo… e ao que se afigura mal!
Também a
questão de natureza ética se torna ainda mais relevante quando o chefe do
governo que assume a decisão foi em tempos seu crítico, como lembra o NEGÓCIOS na notícia «Passos criticou Sócrates por compra de dívida
que agora aprova», ou quando foi
possível assistir num canal televisivo à reacção de Bagão Félix (que foi
ministro da Segurança Social no governo de Durão Barroso e ministro das
Finanças com Santana Lopes), dizendo que a «Utilização
do Fundo da Segurança Social para comprar dívida pública é “perigo” para o
Sistema», quando o mesmo esteve envolvido na solução igualmente imediatista
de integração de fundos de pensões de empresas públicas (como a NAV, a RDP, a
Imprensa Nacional-Casa da Moeda, a ANA e a CGD) na Caixa Geral de Aposentações,
nomeadamente, como noticiou em Dezembro de 2004 a TSF,
quando no tempo de Santana Lopes o «Governo
retira mais mil milhões do fundo de pensões da CGD».
Perante
decisões deste jaez, que não podem senão contribuir para o enfraquecimento do
Sistema de Segurança Social, ou a inércia face à perpetuação das reformas
políticas (deputados e autarcas que se reformam após uma dúzia de anos de “serviço”
e muito antecipadamente face à idade legal da reforma), ouvir de representantes
da mesma área política afirmações como a da iminente falência da Segurança
Social ou do Serviço Nacional de Saúde e a defesa da necessidade de reduções
nas pensões (dos que para elas descontaram consoante os valores legalmente
fixados) soa não apenas a falso mas a clara mistificação.
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