domingo, 30 de dezembro de 2007

PEDRO ARROJA

As páginas da VISÃO trouxeram de volta, no seu último número (nº 773, de 27 de Dezembro de 2007), o homem que nos anos 90 disse (cito de memória) qualquer coisa tão importante quanto: «o intelectual que por vezes não escandalize, não está a cumprir o seu papel».

A par com este princípio, que além de irrefutável tem muito de libertário, Pedro Arroja (é obviamente dele que estou a falar) defendeu naquela época ideias tão escandalosas como a privatização de rios, da justiça e da educação (aliás para ele parece que tudo se resolveria desde que privatizado), polemizou (e polemiza) sobre os principais temas da actualidade numa extensa entrevista que aquela publicação titulou sob a ideia de que a democracia tem destruído a autoridade.

Como é habitual nele, Pedro Arroja continua a revelar notáveis capacidades de análise das situações (por exemplo na atribuição da principal responsabilidade da actual situação do país a uma crise cultural) mas, da mesma forma, continua a pecar nas conclusões que delas extrai. A aparentemente correcta distinção que estabelece entre os arquétipos culturais e organizacionais das tradições católicas e protestantes é concluída pela insustentada tese de que tudo se resolveria com um acréscimo de autoridade, que no caso concreto significa a instauração de um novo regime autoritário em Portugal.

Como grande número de ideólogos e outros bons pensadores, todos os problemas se resolveriam se toda a gente fizesse o que eles dizem, mas raramente (ou nunca) o que os outros pensam.
Mesmo reconhecendo a Pedro Arroja alguma centelha (e até a coragem para formular questões incómodas) é quase impossível aceitar a forma quase tacanha como responde a todas as grandes questões. Por exemplo, quando confunde autoridade com autoritarismo, a ponto de na oportunidade em que advoga a restauração das “autoridades naturais”, algo que até o poderia conduzir a preconizar um «governos dos melhores», acabar por defender regimes como os de Salazar ou Pinochet…

Até para os menos atentos se torna particularmente evidente que ao longo de todo o seu discurso está sempre presente a ideia autocrática do «quero, posso e mando», muito ao jeito daquela célebre frase atribuída a Luís VIX: «O Estado sou eu», principalmente quando a páginas tantas diz, em resposta à questão sobre se pretende, ou não, envolver-se na política, que não o fará «…num regime democrático. Porque nunca poderia fazer aquilo que julgo necessário para o País. Se eu visse que tinha possibilidade, de ser eleito e de ter os poderes que são necessários para endireitar o País...» e continua esclarecendo que esses poderes deveriam ser «[b]astante mais dos que tem hoje o primeiro-ministro. Não é tanto uma questão de poderes, mas de clima de opinião pública. Esse clima vai chegar, não em relação a mim, mas a outra pessoa. ‘Precisamos de alguém que ponha isto na ordem’. Se eu sentisse este clima, entrava na política. «…» Transmitia a ideia de autoridade. Aqui quem manda sou eu

Há muito que conheço, e aprecio, a faceta irreverente de Pedro Arroja, mas esta mensagem tão declaradamente sebastianista constituiu para mim uma novidade, a par com a evidente sensação de que nela veste apenas a pele de um S. João Baptista…

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