quarta-feira, 9 de novembro de 2016

TRUMPLAND

No rescaldo da noite eleitoral norte-americana até poderia dizer, como Ricardo Costa escreveu no EXPRESSO, que «Trump não é o princípio nem o fim do mundo. Mas é outra coisa», o que me leva a ter uma leitura diversa duma eleição que à partida pareceria improvável, mas nunca poderia ser apresentada como impensável.

Claro que existe o perigo real de ver Trump transformar os EUA numa Trumpland, mas uma observação mais atenta do fenómeno que foi o resultado da votação britânica sobre a permanência na UE (se é que alguma vez o Reino Unido foi convictamente parte integrante da União) e das reacções dos que já vão dando conta da profunda diferença entre votar contra ou votar com conhecimento, talvez dentro em pouco muitos dos que agora votaram pela “mudança” venham a perceber que isso não existe.


Donald Trump (e outros fenómenos idênticos que por esse mundo fora vão surgindo) é mais um puro produto duma sociedade de consumo mediático. Trump não é um político nem mostrou ter qualquer ideia estruturada de mudança; Trump é o Berlusconi dos EUA (mas este também foi primeiro.ministro de Itália), se é que não será também o Boris Johnson do Reino Unido (aquele que depois de vencer o referendo sobre o brexit não sabe o que fazer com ele). Em resumo: Trump é Trump e a probabilidade de defraudar completamente as esperanças que nele colocaram é mais que grande ou enorme, é certa, pois o Trump que se apresentou ao eleitorado com uma espécie de paladino da luta contra o establishment, mais que um seu produto é o lídimo representante do que o mundo dos negócios tem de pior no que respeita ao laxismo e ao oportunismo. Ao contrário do que gosta de aparentar Trump não integra o muito apreciado paradigma do self made man (particularmente grata à mentalidade protestante da elite WASP e mito permanente nos EUA) nem construiu outro império que não o baseado na especulação imobiliária.

O pior é que nos tempos actuais, tempos de grande crise económica e ainda maior crise de valores que apresentam enormes semelhanças com os vividos no início do século passado e que estiveram na origem de grandes movimentos anti-democráticos, não podemos esquecer, como escreveu Daniel Oliveira em «Ponto sem retorno», que foi permitido a «...um privilegiado de recorte fascista a liderar o descontentamento popular e a transformá-lo em poder pessoal».

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