O resultado
das eleições antecipadas que no passado fim-de-semana tiveram lugar na Turquia
e que ditaram o regresso do AKP (o islâmico e conservador Partido
Justiça e Desenvolvimento) a uma maioria absoluta que os
resultados eleitorais de Junho lhe retiraram, requer apreciação especialmente
ponderada na actual conjuntura regional e global
Do ponto de
vista da política interna turca, o resultado de Domingo não garante ao
presidente Erdogan as condições parlamentares (maioria de 3/5 dos deputados)
necessárias para alterar a Constituição e reforçar os seus poderes; para o
alcançar terá de voltar a adiar a ideia até às próximas eleições (segundo o
calendário eleitoral 2019 será um ano com eleições legislativas e
presidenciais, às quais Erdogan se pode recandidatar) ou de negociar com alguma
das forças políticas, sendo que se antecipa que a principal força da
oposição, o CHP (Partido Republicano Popular), que elegeu agora 134 deputados
contra 132 em Junho, não estará muito disponível para apoiar a estratégia de
Erdogan e do seu AKP, nem o HDP (Partido Democrático Popular, formação de
esquerda que agrega a generalidade da minoria curda) e que sempre tem sido
desvalorizado pelo dominante AKP.
Resta então o MHP (Partido
de Acção Nacionalista), que ao perder 40 dos 80 deputados eleitos em Junho,
pagou a factura de não ter viabilizado o governo do AKP e poderá agora
inflectir essa estratégia.
Mas mais intrincado que o panorama
político interno é a situação internacional, onde a Turquia mantendo a sua oposição a Bashar al-Assad alterou recentemente o seu posicionamento face ao
Daesh, passando a alinhar com as posições norte-americanas de combate directo
ao Estado Islâmico, nem que seja para disfarçar a sua real intenção: a
intensificação do combate aos peshmergas
curdos que constituindo a melhor força opositora ao Daesh, ameaçam controlar um
território na fronteira entre a Turquia, a Síria e o Iraque e fazer renascer a
esperança num Curdistão independente.
O reacender dos confrontos com os
guerrilheiros curdos – anunciados no plano internacional na linha do combate ao
terrorismo internacional – até poderá ter resultado na recuperação da maioria
absoluta, mas o maior ganho terá sido o oferecido durante a recente visita da
chanceler alemã; é que se «Merkel foi à Turquia pedir ajuda de Erdogan para conter fluxo de
refugiados» o resultado foi a declaração onde «Merkel
defende ajuda económica à Turquia e migração regulada para a UE», ou
contrariando o que anteriormente dissera, que «Merkel compromete-se a apoiar adesão da Turquia à UE».
É certo que há
algum tempo que os dirigentes da UE relegaram para o rol das preocupações
menores a questão da democracia – veja-se o que acontece com os regimes de
alguns estados do antigo bloco de leste ou até com o modelo de imposição de
regras comunitárias – mas que depois de terem participado activamente no
derrube do regime líbio do coronel Kadhafi, parecem gora dispostos a “apoiar”
um regime vagamente democrático, como o que o AKP tem vindo a impor na Turquia,
e, qual banho turco, até a apoiar a sua integração no espaço da UE, a troco
deste conter o fluxo de fugitivos provocado pelas guerras regionais que
americanos e europeus continuam a fomentar no Médio Oriente.
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