Muitos
têm sido os cabeçalhos jornalísticos que nos últimos dias têm surgido sobre a
Grécia e o diferendo que opõe o actual governo, liderado por Alexis Tsipras, e
uma UE onde prevalece o dogma ordoliberal da “austeridade expansionista”, com
especial destaque para os que não têm perdido o ensejo para denegrir os
esforços helénicos. Curiosamente, ou talvez não, a imprensa especializada
estrangeira, nomeadamente o ECONOMIST e
o FINANCIAL TIMES, tem sido mais
comedida a respeito das propostas gregas.
Enquanto de forma nem sempre muito esclarecedora a imprensa vai dizendo
que a «Grécia deixa cair perdão de dívida e pede
reembolsos ligados ao crescimento» e a realização de reuniões com vários
dirigentes europeus confirmam a mudança de estratégia onde a «Grécia vai trabalhar com as instituições
europeias e não com a troika», o que representa uma clara inversão
do modelo em uso que a própria UE já
reconhecera quando surgiu o anúncio de que «Bruxelas admite desmantelar troika como concessão à
Grécia».
Os resultados das passagens por Roma e Paris, onde «Grécia e Itália alinham discurso por uma
"Europa de crescimento"» enquanto de Paris se fala em «Aliviar dívida grega sim, perdoar não»,
são de algum modo exemplo das diferentes sensibilidades na abordagem do
problema. Quando a «Alemanha quer que Grécia coloque promessas
de lado e mantenha compromissos» não se estranha que os
servilíssimos Rajoy ou Passos Coelho disso se façam eco, nem o anúncio que o «BCE
deixa de aceitar dívida grega como garantia para financiar a banca do país», numa estratégia que,
fomentando o risco da moeda única, poderá revelar-se calamitosa para o conjunto
da Zona Euro.
Esta óbvia forma de pressão sobre
os gregos foi respondida de imediato nas ruas de Atenas e pela voz do próprio
primeiro-ministro quando este afirmou que a «"A
Grécia não aceitará mais ordens, sobretudo ordens recebidas por email"», cimentando a ideia que os eleitores poderão ter
escolhido quem efectivamente defenda o interesse nacional e esvaziando parcialmente
o conteúdo da medida e de declarações como aquela onde Jean-Claude «Juncker diz que UE não vai mudar tudo
devido a resultados eleitorais na Grécia».
Enquanto isto,
no rescaldo duma reunião onde «Schäuble
e Varoufakis assumem discordar sobre quase tudo», ficámos também a saber
que para o ministro alemão as «“Promessas às custas dos outros não são
realistas”», argumento aplicado às intenções do governo grego de ver
alterados os termos da sua dívida mas que não terá sido das ideias mais
brilhantes de Schäuble, pois, na essência, igualmente irrealista será esperar
que as economias reduzidas ao estado de indigência alguma vez lograrão pagar as
suas dívidas. Esta velha sanha contra os países periféricos da Europa, que tem
sido alimentada nos países do Norte europeu sob a capa duma moralidade
controversa, parece cada vez mais alimentada pelas fragilidades internas duma
Alemanha que continua a escamotear os elevados riscos associados ao seu sistema
de segurança social e de fundos de pensões (já em 2011 havia quem apontasse uma
dívida escondida de cinco biliões de euros) e a fragilidade do seu sistema financeiro
regional.
Ainda que o anúncio de que o «Eurogrupo convoca
reunião extraordinária para debater a Grécia» represente mais uma
manobra no sentido de isolar a Grécia – fazer uma reunião do Eurogrupo, órgão
claramente dominado pela ortodoxia austeritária, nas vésperas duma cimeira europeia
onde as hipóteses de crítica àquela prática serão maiores – seria mais realista
que políticos e comentaristas esperassem pelo seu desfecho antes de persistir
numa bacoca condenação generalizada dum esforço legítimo e que, contrariamente
ao que se pretende fazer crer, não tem forçosamente que estar condenado ao
insucesso.
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