sábado, 20 de dezembro de 2014

E AGORA PAQUISTÃO?

A notícia de que um recente «Ataque talibã a escola em Peshawar deixa 141 mortos e um país em choque» correu célere e chocou a opinião pública mundial. Outro título refere que «Ataque talibã a escola deixa Paquistão de luto e indigna o Mundo», mas mais correcto, porque mais consentâneo com a realidade local, é afirmar que «Massacre talibã em escola militar no Paquistão faz pelo menos 141 mortos, a maioria crianças».

Sem esquecer a barbaridade que se traduz na morte gratuita de mais duma centena de jovens (mortes que as notícias não esclarecem se ocorreram apenas por intervenção dos atacantes ou também em consequência do fogo cruzado quando o exército paquistanês reocupou o controlo das instalações), importa inserir o atentado na intrincada conjuntura paquistanesa, facto que não foi esquecido na reivindicação do ataque pelo grupo Tehreek-e-Taliban Pakistan (Movimento Taliban do Paquistão), quando explicou que visou atingir o Exército, que responsabiliza pela morte de familiares dos talibans, no seu ponto mais frágil.


A ideia que este atentado, pensado para deixar uma mensagem forte ao governo de Nawaz Sharif, poderá constituir uma oportunidade para a aproximação entre as facções que oscilam entre o apoio e a contestação ao movimento taliban e, quiçá, um passo importante para a sua erradicação, talvez não resista a uma observação mais atenta da realidade paquistanesa. Recordar que o país resultou duma divisão com uma Índia maioritariamente não-muçulmana e com a qual não aceitou conviver, que desde a sua fundação sempre elegeu este vizinho como “origem de todos os seus males” e que tem tido no Exército a origem de grande número dos seus governantes, ajudará a compreender o porquê da difícil relação que há muito mantém com o movimento taliban,que teve na sua génese um forte apoio dos EUA.

A sua vizinhança com o Irão e o Afeganistão, em resultado da ascensão do regime iraniano dos ayatollahs e da invasões soviética e americana do Afeganistão, colocou-o na área de influência (e dos interesses) dos EUA, factor que terá reforçado ainda mais a animosidade com uma Índia que persistia numa certa forma de não-alinhamento e reforçado o papel e a importância duma estrutura militar formada e equipada a partir do EUA.

A ambivalência no seu relacionamento com o fragmentado Afeganistão (território que não deixa de querer influenciar através do seu apoio aos talibans) e com a Índia (país com o qual além da mal resolvida separação em 1947 mantém uma “corrida” ao armamento nuclear) não deverá ficar aplacada nem agora quando, Narendra Modi, o «PM indiano critica "cobarde ataque terrorista" contra escola no Paquistão», tão profundas são as dissensões entre paquistaneses e indianos. Mesmo quando nos dois estados pontificam governos conservadores permanecem evidentes as diferenças religiosas (no Paquistão pontifica um partido muçulmano enquanto a Índia é dirigida por um partido de matriz nacionalista hindu) e uma animosidade que nem o facto de ambos os países disporem de armamento nuclear tem atenuado.

Envolvido num complicado jogo de interesses regionais e internacionais, muitas vezes percepcionado como apoiante pouco discreto dos talibans e outras tantas apontado como importante vector no combate a esses mesmos extremistas, atormentado pelo ancestral receio da vizinha Índia e com uma classe dirigente permanentemente sob suspeitas de corrupção e nepotismo, o Paquistão não logrará resolver com eficácia o problema do extremismo islâmico com iniciativas desgarradas – como o pronto anúncio de que vai acabar com moratória da pena de morte para casos de terrorismo – nem enquanto não resolver definitivamente a sobrevalorização dos militares na vida política e não normalizar as suas relações com a Índia.

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