quinta-feira, 5 de janeiro de 2006

A SAÚDE DE SHARON E A PAZ NO MÉDIO ORIENTE

O agravamento do estado de saúde do primeiro-ministro israelita, Ariel Sharon, que hoje mesmo deveria ser sujeito a uma intervenção cirúrgica menor, veio aumentar o interesse pela situação no médio-oriente e em especial no território Palestiniano.

Em conflito permanente (embora com graus de intensidade variáveis) com os estados árabes vizinhos desde a data da sua fundação em 1947, por decisão da ONU. O primeiro conflito aberto estalou em 1949, ao qual se seguiria a Guerra do Suez, em 1956, a Guerra dos Seis Dias, em 1967, e a ofensiva do Yom Kipur, em 1973; destes conflitos resultou a ocupação do território palestiniano (Faixa de Gaza, a Cisjordânia e Jerusalém Leste) e de áreas de outros vizinhos árabes (Península do Sinai e Montes Golan).

Esta situação de ocupação originou dois processos de revolta palestiniana (a Intifada lançada em 1987 e retomada em 2000 até aos dias de hoje) a que os governos judaicos responderam com a intensificação da repressão nos territórios ocupados, registando-se pelo meio a assinatura de em 1993 de um acordo de paz entre Israel e a Autoridade Palestiniana (conhecido pelo Acordo de Oslo, que foi subscrito por Shimon Peres e Yasser Arafat) que tem registado sucessivos atropelos mas também já conheceu a recente (em 2005) retirada israelita da Faixa de Gaza.

Esta situação político-militar particularmente complicada tem conhecido pelo lado israelita diferentes actores, em função das oscilações eleitorais entre conservadores e trabalhistas, sendo o actual, Ariel Sharon, um antigo líder militar da Guerra dos Seis Dias, ex-guerrilheiro do movimento nacionalista “Aganah” e responsável por acções militares contra civis palestinianos, quer enquanto oficial do exército quer mais tarde enquanto ministro da defesa.

O lado palestiniano, actualmente dirigido por Mahmoud Abbas que ascendeu ao cargo após a morte do líder histórico da OLP, Yasser Arafat, tem procurado ao longo dos tempos apoios internacionais, quer entre os estados árabes da região quer na ONU, para ver aplicada a deliberação daquele organismo, datada de 1947, que estabeleceu a existência de dois estados – Israel e Palestina. Envolvida nas diferentes situações de conflito, sempre a comunidade palestiniana saiu perdedora, de uma forma ou outra, juntamente com a maioria dos estados árabes vizinhos.

Com a assinatura dos Acordos de Oslo (sob o beneplácito e a publicidade americana) pretendia-se que estivessem criadas as condições para o estabelecimento do estado palestiniano e a abertura de um verdadeiro processo de paz. Porém a resistência das facções radicais judaicas e acções provocatórias, como a protagonizada por Sharon aquando da sua deslocação, em Setembro de 2000, à esplanada da Mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém Leste, nas vésperas da sua eleição como primeiro-ministro e marco do lançamento da segunda Intifada, têm adiado sucessivamente um efectivo processo de paz entre árabes e judeus.

A ocorrência de constantes incidentes (atentados palestinianos contra alvos judaicos e ataques israelitas contra campos de refugiados palestinianos) originou em 2002 novos esforços de pacificação, conhecidos pela interessante designação de “Roteiro para a Paz” que terão culminado com a retirada judaica do território palestiniano ocupado da Faixa de Gaza, ocorrida no ano passado por decisão de Ariel Sharon.

Praticando uma política dupla – mantendo um calendário para a paz, desocupando parte dos territórios e desmantelando alguns colonatos judaicos mas, erguendo barreiras em torno dos territórios palestinianos e mantendo uma prática de assassinatos selectivos nesses mesmos territórios – Sharon tem visto a sua política apoiada pelos Estados Unidos da América, nomeadamente quando após o 11 de Setembro de 2001 conseguiu incluir os movimentos armados palestinianos do “Hamas” e das “Brigadas Al-Aqsa” entre as organizações terroristas mundiais, e mais recentemente pela União Europeia quando esta inflectiu a sua política para a região passando a alinhar na estratégia judaica e americana de exigir garantias à administração palestiniana de cessação dos atentados perpetrados pelos grupos palestinianos radicais (nos termos do citado roteiro).

Mesmo perante um total desrespeito pelas normas internacionais – á face da lei Israel e o seu exército ocupam os territórios de um estado reconhecido pela ONU – a Autoridade Palestiniana tem procurado minimizar o ambiente de conflito, situação cada vez mais difícil face à conjuntura mundial e local, uma vez que a decisão americana de invadir e ocupar o Iraque apenas tem contribuído para inflamar ainda mais o velho conflito com Israel.

A delicada situação israelita não se resume às suas relações (normalmente de força) com a Autoridade Palestiniana, uma vez que mantém sob ocupação uma região reivindicada pela Síria (os Montes Golan), pelo que acompanhará com particular interesse o desenrolar da investigação, sob a égide da ONU, sobre o envolvimento da Síria e do seu presidente, Bashar Assad, no atentado de que resultou a morte do ex-primeiro-ministro libanês Rafik Hariri que se opunha à permanência de tropas sírias naquele país.

Com um longo historial de conflitos, não estranha que os sucessivos governos judaicos, conservadores ou trabalhistas, quase sempre tenham estado em sintonia no que respeita às difíceis relações com os países árabes vizinhos. Parceiro preferencial dos Estados Unidos da América, o estado de Israel beneficiou, nos diferentes conflitos que lançou ou a que se viu sujeito, do apoio logístico americano e ainda da sua protecção nas Assembleias da ONU, como aconteceu em 1981 quando o primeiro-ministro israelita, Menachem Begin, ordenou a destruição da central nuclear iraquiana com a qual receava que aquele país pudesse vir a produzir armamento nuclear.

A actual disposição iraniana de pôr em funcionamento um reactor nuclear vai ser um dos problemas que o governo israelita que venha a sair das próximas eleições de Março terá de enfrentar, não sendo de estranhar que qualquer que ele seja – com Sharon, Netanyahu ou outro – venha a optar pelo bombardeamento daquelas instalações, uma vez que a comunidade internacional parece aceitar a pretensão de Israel a ser a única potência nuclear regional.

Assim, enquanto se aguardam notícias sobre o estado de saúde de Ariel Sharon, podemos ter uma certeza – qualquer que seja a evolução da sua doença a política externa judaica não deverá registar significativas alterações, seja em relação aos territórios palestinianos ocupados, seja relativamente aos seus vizinhos árabes.

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