segunda-feira, 29 de junho de 2015

TSIPRAS vs SÓCRATES

O descambar da situação na Zona Euro, onde a Grécia tem vindo a ser empurrada para uma saída que não deseja, leva-me a recordar uma clara analogia com um facto que a História narra - a condenação e execução, em 399 a.c., doutro grego: Sócrates, o grande filósofo criador da maiêutica.
A morte de Sócrates (condenado pelos seus concidadãos) não assinalou o fim de nenhuma era, pois a maiêutica e a filosofia sobreviveram-lhe, mas a sentença que a UE insiste em executar sobre a Grécia poderá marcar o seu próprio fim.

Como escreveu Pacheco Pereira, em «A Europa que nos envergonha», «Esta não é a Europa dos fundadores, é a Europa dos partidos mais conservadores, com os socialistas à arreata. Não terá um bom fim e, nessa altura, muita gente lembrará a Grécia», especialmente quando se confirmarem os piores cenários para a derrocada iminente.

Nesta fase os ordoliberais poderão ver concretizar-se o seu plano de forçar os estados periféricos europeus à expiação por via duma humilhação colectiva que também os atingirá; mas, a confirmar-se a existência de quem volte a beber até à última gota a cicuta oferecida pelos mesmo tipo de decisores incompetentes e incapazes com a dignidade de quem sabe ter razão, talvez acelere aquele processo.


Tudo indica que a decisão de forçar os gregos a sair da moeda única, e quiçá da própria UE, não data de agora, mas restam cada vez menos dúvidas que os esforços terão sido reforçados com a chegada a Bruxelas e às reuniões dos seus burocratas de representantes doutra corrente de pensamento que não a privilegiada pelo ordoliberalismo. Só isso explica que, descontada a desinformação que normalmente rodeia aquelas sessões, tenhamos assistido a uma “dança de promessas” e de “falsas esperanças” entre os principais negociadores (foi assim que ora as propostas gregas eram razoáveis, ora eram inaceitáveis, ora o «Governo grego rejeita contraproposta dos credores», ora o «FMI mantém expectativa de que a Grécia cumpra pagamento de 1,6 mil milhões de euros» ou garanta que «Se a Grécia não pagar na terça-feira, o FMI não a declara em bancarrota»), isto enquanto os actores menores se esganiçavam num coro desafinado de invectivas, do género daquelas em que o «Governo português acusa Grécia de estar a fazer “chantagem inadmissível”», sem mais resultado que adicionar gritaria ao barulho. 

Concorde-se ou não, depois do fracasso negocial a «Grécia rejeita "oferta generosa" que deixa de fora corte na dívida» e «Tsipras marca referendo ao acordo com os credores»; mas ao contrário do que Geórgios Papandréu (o ex-líder do PASOK prontamente substituído na chefia do Governo pelo tecnocrata e ex-vice-presidente do BCE, Lucas Papademos), fizera em 2011 aquando da formalização do segundo resgate, o anúncio foi prontamente acompanhado da marcação duma data, num claro sinal de vontade política de dar aos cidadãos gregos o que os restantes líderes europeus recusam: a decisão numa escolha entre a actual plutocracia (governo dos mais ricos) comunitária ou uma democracia.

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