terça-feira, 16 de junho de 2015

REGRAS IGUAIS PARA TODOS

Com a informação que as «Negociações em Bruxelas terminam sem acordo», tudo indica que entrámos num ponto de não retorno para qualquer das partes, tanto mais que já uns dias antes fora anunciado que a «Equipa do FMI abandona negociações com Atenas por existirem “grandes diferenças”»; esta decisão, pressagiando bem mais que uma antecipada ausência de acordo, viu-se reforçada pelas declarações do presidente do Conselho Europeu em exercício, onde «Donald Tusk diz que não há mais tempo para jogos. "Precisamos de decisões, não de negociações"», e do ministro alemão da Economia, nas quais «Sigmar Gabriel avisa que a Europa está a perder a paciência com a Grécia».

Estas afirmações e comentários inserem-se na linha de quem não revela dúvidas sobre a irresponsabilidade do governo do radical Alexis Tsipras querer ver revistas as condições do programa de resgate imposto pela “troika” que levou a uma contracção da economia grega e ao disparar do desemprego para níveis insustentáveis; os naturais apoiantes da solução austeritária – como o deputado do PSD, Duarte Marques – não hesitam sequer em afirmar que «A Democracia tem regras e são iguais para todos, mesmo para os gregos», como se a legitimidade do Governo grego fosse menor que a dum FMI ou dum BCE que ninguém sufragou.

Esquecendo que apenas uma divergência de «Dois mil milhões de euros por ano levam a suspensão das negociações com a Grécia», valor que representa menos de 1% do PIB helénico ou 0,02% do PIB comunitário, atribui-se o fracasso à irredutibilidade grega quando que até Olivier Blanchard, economista-chefe do FMI (organismo que abandonou as negociações por rejeitar a mínima hipótese de reestruturação da sua parte da dívida), veio apontar uma opção de convergência (hipócrita, mas opção) onde «gregos têm de mexer nas pensões, europeus têm de mexer na dívida».

O dogmatismo dos credores dos gregos em geral, e do FMI em especial, é tal que o anúncio de que foi uma «Proposta da Comissão para trocar cortes nas pensões pela Defesa rejeitada pelo FMI» confirma, afinal, que o verdadeiro fundamento para a imposição duma política de austeridade não é o reequilíbrio financeiro mas sim a opção por um modelo de distribuição da riqueza mais desequilibrado e que até já nas páginas do FINANCIAL TIMES se admite que «A Grécia não tem nada a perder ao dizer não aos credores», o que reforça o sentido a afirmação de que «Tsipras vai esperar “pacientemente” que os credores se tornem “realistas”» ou a reafirmação produzida pelo seu ministro das Finanças, Yanis Varoufakis, de que «"Não queremos mais dinheiro"» e que o «resgate da Grécia tem de "começar do zero"», numa clara alusão à necessidade duma completa reformulação dos termos do resgate.

Quando se revela cada vez mais evidente que a questão fundamental não é o problema do endividamento (este resulta em grande medida da ineficiência dos mecanismos do Euro, criados para privilegiar os interesses do capital rentista em detrimento dos da economia e dos cidadãos) mas sim o dos desequilíbrios económicos alimentados por um sistema financeiro desfasado da realidade das economias e pelo dogma neoliberal da eficácia dos mercados, continuam a ouvir-se vozes, como seja o caso do governo português ou do presidente Cavaco Silva (que, durante uma visita oficial à Bulgária, alinhou pelas posições mais conservadoras, afirmando-se preocupado com a Grécia mas lembrando que não pode haver excepções), defendendo a sacrossanta imutabilidade dos tratados contra a evidência da vontade dos eleitores e esquecendo que o insucesso grego será um primeiro passo para o seu próprio “suicídio assistido” às ordens duma Europa que renegou os valores da solidariedade e da democracia.


O pior e mais lamentável de tudo isto é que no momento em que acabámos de assinalar o 30º aniversário da adesão de Portugal a uma UE, sobre a qual até Mario Draghi (o presidente do BCE) já admitiu que é impossível prever consequências de um eventual incumprimento da Grécia, os nossos governantes recusam ignobilmente que a solução para a crise europeia possa passar, como escreveu Viriato Soromenho-Marques no DN, pelo reconhecimento de que as «…reformas estruturais de que mais necessitamos na Europa não são as dos países, mas sim as da própria União Europeia, e em especial as da zona euro».

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