quarta-feira, 3 de outubro de 2007

MAIS QUE UM PROBLEMA DE LÍNGUA

Enquanto caminhamos para o quarto mês de duração da crise política na Bélgica[1] – ausência de acordo entre flamengos e valões após as eleições de 10 de Junho – eis que novas vozes parecem juntar-se àquela habitual dicotomia.

Os políticos tradicionais parecem debater-se com dificuldades acrescidas (há mesmo quem lhes critique a incapacidade para entenderem e atenderem às crescentes exigências flamengas) enquanto no geral todo o país parece mergulhado numa crise mais profunda que a resultante do somatório de todas as pequenas divergências. Como é próprio deste tipo de situações são os grupos mais radicais que parecem estar a ganhar terreno (pelo menos entre alguns sectores da opinião pública) e jornais há que cada vez mais colocam a hipótese de uma separação.

Enquanto habitante de um dos extremos da União Europeia, que cresci a ler e ouvir referências à capacidade revelada por holandeses, belgas e luxemburgueses – todos habitantes de pequenos países – para construírem “pontes” e plataformas comuns de trabalho e interesses (a eles se ficou a dever a primeira união económica – o BENELUX – implementada na Europa e óbvia percursora da actual UE), custa-me entender o que parece mais uma “birra” que uma efectiva divergência insanável.

Habituado a ouvir brincar com o ‘problema de língua’ dos belgas custa-me a crer que as duas comunidades não consigam mais suportar-se mutuamente...

e ainda mais que flamengos e valões pensem efectivamente num processo de separação. Que os líderes mais populistas das duas comunidades sobrevivam desse cenário e o alimentem enquanto forma de auto-preservação política, sendo entendível, não pode servir de referência para o conjunto da população e torna ainda mais premente o apelo de Philippe Dutilleul, jornalista da televisão francófona que a revista VISÃO[2] se fez eco há umas semanas: «Imaginar que nos vamos separar, quando estamos em vias de construir a Europa, é uma regressão patética».

Mesmo quando no artigo em causa – UM REINO EM RUPTURA – que transcreve mais as razões para a separação que para a conciliação, transparecem em bom número de declarações alguma amargura e, porque não dizê-lo, algum fatalismo, que outra coisa se pode dizer que salientar o absurdo desta situação. Numa época em que os desafios são cada vez mais de natureza global e em que o desenvolvimento harmonioso das sociedades terá que passar por uma crescente entreajuda dos grupos sócio-económicos, culturais, étnicos e religiosos, como é que se pode entender esta sanha separatista?

A avaliar por dados de sondagens, primeiramente publicados pelo LE MONDE, a população belga não parece muito receptiva à ideia da separação.

Mesmo considerando a sua divisão linguística, entre o holandês, o francês e o alemão, e a regional, entre a Flandres a Valónia e Bruxelas (cidade implantada na Flandres mas de maioria francófona), a que parece agora mais evidente é a que distingue moderados de radicais.

Na Bélgica, como em demasiados outros lugares do mundo, algumas pessoas parecem mais apostadas em exibir o que as possa dividir que o que as possa unir.

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[1] A Bélgica é um país da Europa Ocidental pertencente à União Europeia e à NATO. Tem a capital em Bruxelas e é limitado a norte pelo Mar do Norte e pelos Países Baixos, a leste pela Alemanha e pelo Luxemburgo e a sul e oeste pela França. Situa-se numa região anteriormente habitada por tribos célticas e germânicas, fez parte do Império Romano, após a conquista por Júlio César, e nos séculos XVI ao XVIII encontrava-se sob domínio espanhol, quando, em 1815, o país é integrado nos Países Baixos, conquistando sua independência 16 anos mais tarde. Foi alvo de invasão pelas tropas alemãs nas duas Guerras Mundiais e em 1948, conjuntamente com os Países Baixos e o Luxemburgo formam o Benelux, abolindo barreiras alfandegárias. Reformas constitucionais estabelecem três comunidades - flamenga, valã e alemã - e três regiões – Flandres (6 milhões de habitantes) , Valónia (3,4 milhões de habitantes) e Bruxelas (1 milhão de habitantes) - com instituições autónomas, que nem assim impedem a eclosão de conflitos entre valões e flamengos em 1987. Actualmente sua capital, Bruxelas, é a sede de algumas das instituições da União Europeia. (adaptado de Wikipédia).
[2] Visão nº 758, de 13 de Setembro de 2007.

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