domingo, 5 de agosto de 2018

CIDADES PARA HABITAÇÃO DIGNA


O recente caso do ex-vereador do BE na autarquia lisboeta, Ricardo Robles, trouxe para a ribalta informativa mais um “caso mediático” que julgo deveria ter merecido outra atenção.



Não aquela que teve e onde todo do foco foi colocado numa questão paralela – podem ou não os críticos dum sistema económico beneficiar desse mesmo contexto – cujo inegável relevo político devia ter merecido melhor e rápido tratamento pela direcção do partido envolvido, mas outro centrado na grande questão da política imobiliária e do futuro urbanístico das cidades.

Qualquer que seja a sua dimensão, as cidades e os poderes que as dirigem são numa actualidade caracterizada pela perda de muitos dos poderes dos estados nacionais a primeira linha de defesa e protecção dos cidadãos na regulação num processo de financeirização insustentável cujos efeitos destrutivos da vida em sociedade não augura nada de bom, pelo que toda a polémica (incluindo, obviamente a jornalística e a partidária) deveria ter alimentado o debate sobre o futuro que queremos para as cidades e não o mero fait divers que a rodeou. Na capital ou de qualquer outra cidade o que continua por discutir são os reais problemas que os seus habitantes enfrentam, nomeadamente no capítulo habitacional, não havendo hoje nenhuma que escape ao triste espectáculo dum parque habitacional envelhecido e degradado enquanto se viu proliferarem novas urbanizações nas suas periferias; por mero interesse especulativo ou por genuína dificuldade económica, a maioria dos centros urbanos foram votados a uma espécie de abandono que hoje constatamos perante o número de casas abandonadas e/ou em processo de degradação, um pouco por todo o lado, onde a difícil situação que vivemos nos últimos anos, com a crise num sector da construção civil sempre mais preocupado com a subida das margens facilitada pelo crescimento em altura e o quase abandono de todas as políticas de apoio à habitação dita social, não explicam tudo nem justificam a ausência de verdadeiras políticas habitacionais.

A iniciativa recentemente lançada por um conjunto de cidades (Amesterdão, Barcelona, Berlim, Cidade do México, Durban, Lisboa, Londres, Montreal, Montevideu, Nova York, Paris e Seul) e pelas áreas metropolitanas de Barcelona, Manchester e Paris, que assinaram uma declaração pelo direito à habitação e à cidade (que pode ser lida AQUI) pode ser um primeiro passo para criar a consciencialização necessária a mais e melhores iniciativas, mas nada dispensa a intervenção e o interesse de cada cidadão no combate ao processo de valorização imobiliária das zonas urbanas (invariavelmente traduzido na deslocação para a periferia dos residentes com menor poder económico e da entrada de residentes com maior poder económico).

O apelo agora lançado pelos autarcas que exigem mais ferramentas fiscais e jurídicas para regular o mercado imobiliário (para venda e aluguer), só fará sentido se estas forem aplicadas com maior determinação e isenção do que a que têm dado provas até agora, e a exigência de mais meios financeiros para a criação dum verdadeiro mercado público de habitação, implica dar à problemática da habitação uma importância igual à que demos à da saúde e à da educação e contrariar com determinação a pressão especulativa causada pela migração do investimento financeiro dos bancos para o imobiliário.

A dimensão do problema, a par com a das próprias cidades, deixa antever à partida todas as dificuldades na implementação da iniciativa Cidades para Habitação Digna, mas isso não invalida a ideia nem a necessidade.

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