Menos
espantoso que o anúncio, em meados deste mês, que mais um «Cessar-fogo
na Síria entrou em vigor» na Síria, foi passada apenas uma semana a
confirmação que «O
cessar-fogo que todos achavam que iria falhar, falhou».
Gorado mais um
acordo de cessar-fogo no teatro de guerra sírio ficaram as habituais trocas de
acusações entre as partes beligerantes que no caso sírio vão muito além dum
simples pró ou contra o regime alauíta de Bashar al-Assad, pois há muito que o
Mundo Árabe se encontra fragmentado ou destruído por múltiplos conflitos.
Como se não
bastasse a profunda divisão religiosa entre sunitas e xiitas, o próprio
Ocidente se encarregou de fomentar e/ou agravar as mínimas dissensões entre
povos que têm quase tudo para partilharem um futuro comum.
Basta recordar
os perniciosos efeitos da presença europeia na região no período de entre as
duas guerras e do famigerado Acordo Sykes-Picot que regulou a divisão entre franceses
e ingleses e esteve na origem dos mandatos francês e inglês que conduziram ao
desenho da maioria das fronteiras hoje em vigor na região. Implodido o Império
Otomano, com o desfecho do conflito, e renegadas as legítimas aspirações de
autodeterminação dos povos árabes, recorrendo à estratégia de “dividir para
reinar”, ingleses e franceses impuseram os seus interesses e implantaram
regimes de forte pendor autocrático, muitos dos quais ainda hoje se mantém e que
com a colaboração posterior dos EUA facilitaram as condições para a criação do
Estado de Israel.
Não se
estranhe pois que para os povos árabes a credibilidade dos países ocidentais
(França, Inglaterra e EUA) registe níveis muito baixos e que a sua capacidade
de influência acabe por quase se circunscrever às petromonarquias do região do
Golfo, que deles dependem para o funcionamento da indústria petrolífera e para
a aquisição de equipamento militar; a própria ONU não regista melhor resultado
desde que aceitou pacificamente o desrespeito pela Resolução 181, o chamado
Plano da ONU para a partilha da Palestina, ou mais recentemente nas Resoluções 242 e 338, sobre a criação do Estado
Palestiniano.
Sem um interlocutor em quem as partes reconheçam
isenção e capacidade de diálogo com as diferentes facções e os diversos
interesses regionais (Turquia, Arábia Saudita e Irão) e internacionais (EUA,
Rússia e UE) em jogo, conflitos como a guerra civil síria manter-se-ão por
ausência de propostas de solução credíveis, meros interesses políticos ou da
indústria de armamento, mas sempre anunciados e propalados na imprensa sob a
capa do humanitarismo ou dos direitos cívicos, a mesma imprensa
que esquece completamente que, como escrevi em Janeiro de 2013 no “post” «VIOLÊNCIA SÍRIA»,
a estratégia que está a ser «...implementada pelos EUA com as
invasões do Afeganistão e do Iraque e continuada no apoio mais ou menos activo
à “Primavera Árabe”, redundará no caso da Síria na substituição do regime
alauita por outro de matriz sunita que, mais cedo que tarde, originará um
problema de perseguição às diversas minorias que integram o intrincado xadrez
étnico-religioso da região, no qual se incluem curdos, turcos, arménios,
drusos, xiitas (de que os alauitas são um ramo) e cristãos ortodoxos.
A
queda de Assad e uma mais que provável subida ao poder da facção wahabita (a
mais radical e melhor organizada dentro da maioria sunita) dará origem a
notícias de novas perseguições no território sírio e então veremos se o
Ocidente reagirá com a mesma veemência e empenhamento que o actualmente usado
contra os alauitas».
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