quarta-feira, 5 de agosto de 2015

PARA A DISCUSSÃO DE UM NOVO PARADIGMA – PARTE I

A polémica levantada em torno da fiabilidade da informação estatística respeitante ao desemprego, especialmente empolada quando o «Líder do PS acusa Governo de querer enganar os portugueses», deveria constituir o ponto de partida para um debate sustentado sobre as perspectivas de evolução do mundo do trabalho.

Não foi por uma opção panfletária que terminei o “post” «GERAÇÃO PERDIDA» com o alerta de que «…o futuro não trará emprego para todos os que o procurem!», fi-lo na profunda convicção que esta “realidade” está a ser ocultada à maioria das pessoas (aquelas que irão sofrer directa ou indirectamente) com o propósito de garantir uma anestesia social.

Quais avestruzes, as elites políticas parecem acreditar que escamoteando um problema este se desvanecerá pelo simples facto de ninguém o observar…


O busílis é que a realidade está a chegar cada vez mais premente ao dia-a-dia dos cidadãos. Desde a eclosão da crise sistémica, iniciada em 2008 com a crise do “subprime” norte-americano e agravada na Europa pela chamada crise da dívida pública, que são cada vez mais notórios os sinais de esgotamento dum modelo que transformou o lucro e a capacidade de o gerar no único objectivo e especialmente numa sociedade que mantém vivo o anátema da condenação moral da ociosidade. O trabalho, apresentado no período de ascensão da burguesia como fonte de prestígio social, depois de transformado numa condenação para o enxame de obreiros condenados a “ganhar o pão com o suor do rosto”, por via da imposição de modelos de gestão orientados por modelos econométricos, caminha agora inexoravelmente para uma glorificação por via da sua escassez.

Muitos foram os teóricos e os pensadores que escalpelizaram a evolução do modelo capitalista desde os primórdios do processo de acumulação primitiva (desde a apropriação de matérias-primas a baixo custo) proporcionado pelas práticas colonialistas até à criação das sociedades da informação (período pós-industrial), mas poucos são os que abertamente criticam o círculo vicioso em que alegremente nos mergulharam.
O último lustro trouxe à evidência dos europeus um fenómeno que já grassava noutras regiões: a formação de exércitos de desempregados, semelhantes aos que a Revolução Industrial criou com a introdução da mecanização ou que a Grande Depressão originou, com poucas ou nulas perspectivas de recuperação dos rendimentos perdidos. Esta verdadeira crise global do trabalho já fora denunciada, em meados da década de 90 do século passado, pela escritora e ensaísta francesa Viviane Forrester, no seu livro «O HORROR ECONÓMICO».

Vinte anos volvidos sobre a apresentação daquele ensaio, a realidade económica, originada na informatização e na robotização dos processos produtivos e que ainda não atingiu o seu apogeu, continua a transformar aquele inegável avanço tecnológico num drama de contornos indefinidos. Às primeiras reduções de pessoal, ditadas pela informatização, estão a seguir-se as justificadas pela necessidade de contenção dos custos (na estrita visão duma corrente ultraliberal que não entende o trabalho como fonte de riqueza) que, no alvor da era em que os robots criem novos robots, culminarão na destruição do último posto de trabalho. Os defensores desta visão nunca a assumem claramente, da mesma forma que nunca se preocupam em explicar quem (há excepção dos poucos super-ricos donos de robots) comprará os bens e serviços assim produzidos, ou como viverá uma sociedade onde a larga maioria dos seus membros nunca encontrará trabalho regular nem rendimentos aceitáveis.

Esta realidade ditará que, tarde ou cedo, se torne compulsiva a distribuição de alguma forma de rendimento (alguns autores já hoje se referem à necessidade de atribuição dum rendimento-geral) a todos os cidadãos, sob pena do desaparecimento dos “mercados”.

Esta ideia de distribuição de rendimento pelos cidadãos inactivos não constitui novidade (é nela que em parte se baseia a ideia do subsídio de desemprego) pois a primeira era de ouro historicamente documentada, o Século de Péricles, que dotou a sociedade ocidental das suas bases filosóficas e técnicas só terá ocorrido porque na Grécia Clássica os excedentes originados pela generalização do trabalho escravo foram aproveitados pela classe rica (os donos de escravos) para investir no estudo e no conhecimento, ou seja, a riqueza adicional criada pelos escravos permitiu que um grupo de homens-livres pudesse dedicar o seu tempo a actividades não directamente produtivas.

Menos mal andaremos se aprendermos esta lição da História, mas os preliminares – recorde-se a posição da generalidade dos governos europeus sobre as políticas sociais e a emigração – não augurem semelhante desenvolvimento.

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