O comentário
de abertura desta semana deveria ser qualquer coisa em torno da última cimeira
do G20. «Mais
ricos repetem mão cheia de promessas para controlo financeiro», poderia ser
um bom ponto de partida (mesmo sabendo que isso não constitui novidade nem
deverá passar do rol das boas intenções), tão ilusoriamente reconfortante
quanto a ideia que estarão de volta as teses keynesianas quando se afirma que o
«G20 quer acelerar crescimento com mais investimento
em infraestruturas».
A crescente inutilidade deste areópago ressalta não apenas da quase
completa ausência de resultados práticos como da mistificação que sempre a
rodeia. A comprová-lo está a notícia que «Putin
abandona G20 após puxão de orelhas por causa da Ucrânia» quando a realidade
pode ser a de que a saída prematura do presidente russo se poderá ter ficado a
dever à reduzida importância que Moscovo lhe atribui.
Perante
este “jogo do empurra” das mais completas fatuidades não se estranhe que a
notícia mais badalada em Lisboa, nos últimos dias, tenha sido a de que, na
sequência do despoletar do caso dos “vistos dourados”, «Miguel
Macedo demite-se».
Rolou a cabeça
de «O
ministro que resistiu aos protestos dos polícias mas não ao escândalo dos
vistos», mas pouca gente se questiona sobre o cerne de «O Labirinto que "diminuiu politicamente"
Macedo».
A origem do
problema está no mecanismo dos “vistos dourados”, estratagema que o Governo
afirma servir para fomentar o investimento estrangeiro, mas que assegurando a
benesse em contrapartida duma mera operação imobiliária, bem se pode
classificar como um «Visto pouco dourado e muito suspeito».
Tão
suspeito que a investigação agora concluída fez com que fossem «Detidas
11 pessoas por corrupção e branqueamento», incluindo altas figuras do
Estado como sejam o director nacional do Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras, o presidente do Instituto dos Registos e Notariado e
a secretária-geral do Ministério da Justiça; integrando estes e a secretária-geral
do Ministério do Ambiente (que à semelhança da homóloga da Justiça pediu a
demissão na sequência das buscas àquele ministério) um círculo hierárquico e de
relações próximas do agora demissionário ministro da Administração Interna, bem
se poderá dizer que foi «Miguel
Macedo vítima das suas amizades».
Além das
implicações de natureza política, que já se fazem sentir quando se pretende que
a «Demissão
de Macedo pressiona remodelação profunda» ou se vê que «Marcelo
considera que "é uma pena" se Passos não remodelar», outras
deverão ser retiradas dum caso que tinha tudo para correr mal…
A
responsabilidade do Governo (e em especial do vice-primeiro ministro que nunca
escondeu o apoio aos mecanismo dos “vistos dourados”, nem o contentamento por
terem sido «Atribuídos
mais de 1.600 vistos gold em dois anos») não se pode
limitar à notícia que Paulo «Portas
defende vistos gold, mas não descarta acertos na lei» e ainda menos aceitar
a bonomia com que o CDS veio a terreiro afirmar que «“Os
vistos Gold são bons para o investimento e devem continuar”», como se o “negócio” da venda de imóveis inflacionados constituísse
alguma mais-valia para qualquer economia. Fazer tábua rasa dum mecanismo que
claramente privilegia a especulação imobiliária e a fraude (não esqueçamos que já
em Junho deste ano o DN assegurava que «Chineses com vistos “gold”
queixam-se de burla imobiliária», por alegadamente
estarem a “comprar” imóveis sobrevalorizados) e apresentá-lo como se constituísse a quintessência para o crescimento económico – algo que o governo Passos Coelho/Paulo Portas nunca esteve próximo de conseguir – não passa de mais um
logro com que intentam disfarçar a falência do modelo da “austeridade
expansionista”.
Tal
como no caso dos acordos fiscais secretos no Luxemburgo, também este mecanismo
dos “vistos dourados” bordeja as fronteiras da legalidade e apresenta contornos
de franca imoralidade, da qual urge retirar ensinamentos.
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