Embora sem
constituir verdadeira novidade (há muito que a questão era falada), a notícia
que na passada semana denunciou a existência de «Acordos
fiscais secretos entre Luxemburgo e 340 multinacionais» não deixou de cair como
uma bomba, especialmente por colocar o, ex-governante e actual presidente da
Comissão Europeia, Jean-Claude «Juncker
sob fogo cruzado por fazer do Luxemburgo um paraíso fiscal».
Há muito que a
famosa atractividade do Luxemburgo era comentada e que argumentos como a sua
centralidade geográfica ou até a veterania no processo de construção da UE
(recorde-se que o Luxemburgo, juntamente com as vizinhas Bélgica e Holanda,
integrou a primeira comunidade económica na Europa, o BENELUX), mais não faziam
que sorrir os observadores avisados. Era claro que a atractividade dum
território minúsculo (cerca de 2.500 Km2, sensivelmente metade da
área do Algarve, e um pouco mais de meio milhão de habitantes) sem especiais
recursos naturais mas onde campeia a intermediação financeira, não poderia
resultar senão dum mecanismo artificial.
É claro que
numa época onde o “leitmotiv” da
gestão é a “criação de valor para o accionista”, tudo serve para aumentar os
lucros e melhorar o bónus anual dos gestores; dizer-se, como o fez Rui Tavares
na crónica «A
solução está na cara» que «[o]
escândalo não é só financeiro, mas moral»,
mais que evidenciar o problema traduz a essência dos responsáveis em quem temos
delegado a gestão da coisa pública.
Quando
a cupidez de gestores e accionistas das grandes multinacionais se conluia com
políticos desprovidos de sólidos padrões éticos e morais, quando no sector
financeiro passaram a pontificar os “banksters”,
quando o embuste e a mistificação passaram a ser virtudes glorificadas e
endeusadas como condição “sine qua non”
para os CEO’s, dificilmente se poderia esperar outro resultado que não o de ver
as economias e os sistemas fiscais transformados num jogo de pura batota.
A
investigação realizada pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação
(ICIJ), que denuncia claramente a evasão de milhares de milhões de euros, deixa
poucas dúvidas quanto ao papel desempenhado por Juncker (primeiro-ministro e
ministro das finanças durante largos anos) em todo este processo; a pressão tem
sido tal que depois das primeiras reacções onde a nomenclatura de Bruxelas fez
coro na estratégia de desculpabilização do novo presidente da Comissão (enquanto
este declarava, sem pejo, que não tencionava demitir-se), ontem e numa completa
inversão táctica (talvez tentando amenizar as críticas) até já «Jean-Claude
Juncker admite ser responsável pelo golpe fiscal».
Neste
caso vertente, como noutros, nada deverá acontecer aos responsáveis, pois a
“investigação” que a Comissão não deixará de efectuar resultará, para
tranquilidade dos crentes, numa inequívoca ilibação do seu responsável máximo
que perante o Parlamento Europeu e «Acossado pelo escândalo do
Luxemburgo, Juncker promete uma revolução fiscal».
Quando
já se admite que o «Grupo
da Esquerda Unitária prepara moção de censura contra Juncker», a cereja no topo do bolo da irresponsabilidade colectiva poderá
até ser a informação que «Para
a Bloomberg Juncker deve demitir-se da CE», pois conhecida como é a posição
daquela agência de informação financeira contra a nomeação de Juncker (que
define como um escolha dum Parlamento Europeu desejoso de reforçar os seus
poderes) a iniciativa pode ser entendida como uma manobra de contra-informação
e originar como reacção contrária a aclamação do prevaricador.
Muitos
têm sido os casos de evidentes más práticas governativas, de abuso de poder ou
de conluios diversos e poucos aqueles em que os responsáveis envolvidos revelam
a dignidade mínima de se afastarem de funções.
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