Existe apenas
uma forma adequada para responder a uma velha história: com uma nova história!
É que à velha
história de como a República, com a sucessão de governos e de má gestão,
conduziu o País à bancarrota e um singelo professor de Coimbra o reconduziu à
abastança tem muito mais que contar que o que o professor João César das Neves
deixa transparecer na sua crónica
semanal no DN.
Primeiro; as
origens do défice da I República não se devem apenas aos desmandos de
sucessivos governos mas também da dívida acumulada dos tempos da monarquia e da
que resultou do envolvimento na I Guerra Mundial e na manutenção das colónias
africanas, e principalmente da desastrosa política de concessão de monopólios,
mecanismo que remontava aos tempos da monarquia e através do qual se “taparam”
sucessivos buracos orçamentais, para o agravar nos anos seguintes.
Segundo, o
trabalho mirífico de Oliveira Salazar no «acerto das contas» não se resumiu às
medidas más e muito más que implementou pela força duma ditadura, pois parte
significativa do milagre passou por um processo de reestruturação da dívida. Na
prática boa parte desta foi convertida (à força) num empréstimo perpétuo, ou seja,
o Estado Novo recusou-se a amortizar o capital, algo que hoje, como o prof.
César das Neves bem sabe, é considerado um incidente de crédito pelas
omnipresentes agências de notação e uma solução que os políticos do arco do
poder nem querem ouvir falar.
Tanto assim é
que, não vá alguém lembrar-se da miraculosa solução de Salazar, o articulista
nem sequer refere aquele acontecimento...
É claro que a
História é uma importante fonte de lições que, por manifesta sobranceria ou
evidente ignorância, muitos hoje esquecem, preferindo o discurso da
inevitabilidade ou da ausência de alternativas e o grave é que neologismos como
o da velha história (segundo César das Neves) apenas justificam a ignorância
dos governantes enquanto tentam dar lições aos governados.
Quando após um
ano de programa de assistência financeira se constata que o PIB desceu mais de
3%, o défice estimado em mais de 6% não se aproxima minimamente dos anunciados
4,5%, em vez de regredir a dívida pública cresceu mais de 26 mil milhões de
euros e, para concluir, os números oficiais do desemprego já ultrapassam os 15%,
só com muito boa vontade se poderia continuar a aceitar o retórico discurso da
“austeridade expansionista” e admitir que o fracasso das políticas de
austeridade será ultrapassado com... mais austeridade!
Há pois que
construir uma nova história; recordar ensinamentos e erros anteriores,
avaliá-los e construir uma alternativa onde o dogma do equilíbrio orçamental a
qualquer custo seja substituído pelo da justiça social.
Para isso o
primeiro passo deverá passar por uma auditoria à dívida, expurgando-a de toda
aquela que esteja ferida de manifesta ilegalidade (i.e. a que resulte de obras
não autorizadas, de obras cujo valor final ultrapassou os valores de
adjudicação, de contratos que não tenham acautelado devidamente o interesse público,
etc.); ao valor remanescente assim estimado, equivalente a uma redução da
dívida com a significativa vantagem do novo valor não resultar dum cálculo
arbitrário, deverá se objecto duma adequada renegociação de prazos e taxas que
se ajustem à capacidade de crescimento e de criação de riqueza dos Estados.
Esta
abordagem, do âmbito de cada Estado, deverá ser acompanhda, no caso europeu,
duma outra de âmbito comunitário: o regresso à esfera pública do poder de
criação de moeda. Por outras palavras, no caso da UE e do euro, significará que
o financiamento público deverá ser assegurado pelo BCE em condições iguais (no
mínimo) às que pratica para o financiamento do sector bancário. Este mecanismo
além de reduzir substancialmente as pressões especulativas tem ainda a
virtualidade de assegurar que o financiamento não será realizado a preços
especulativos mas a uma taxa adequada. Para evitar um recurso desmedido ao
endividamento deverão ser desenvolvidos mecanismos de controlo comunitário os
quais poderão passar pela aplicação de taxas diferenciadas em função dos níveis
de endividamento de cada Estado, mecanismo que, a par doutros de natureza
orçamental, contribuirá ainda para reduzir riscos de natureza inflaccionista
que só poderão ocorrer na circunstância dos Estados se endividarem acima das necessidades
das respectivas economias.
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