Para concluir
a abordagem da proposta de apreciação dos problemas da dívida pública, sugerida
pelos Economistas Aterrados, e na sequência da questão da transferência de
responsabilidades para as gerações futuras, vejamos a afirmação que:
É PRECISO
ASSEGURAR A ESTABILIDADE DOS MERCADOS FINANCEIROS PARA PODER FINANCIAR A DÍVIDA
PÚBLICA
Esta ideia resulta de se ter incentivado a
financeirização da economia e em especial da absoluta liberalização da
circulação de capitais, com a agravante no caso europeu desta se encontrar
expressa em documentos fundamentais como o Tratado de Maastricht.
A pretexto do controlo da inflação, vedando ao
Banco Central Europeu qualquer hipótese de intervenção directa no financiamento
dos Estados-membros, devem estes «…encontrar
quem lhes conceda empréstimos nos mercados financeiros. Esta “repressão
monetária” acompanha a “liberalização financeira” e gera exactamente o
contrário das políticas adoptadas após a grave crise da década de 30; políticas
de “repressão financeira” (drásticas restrições à liberdade de movimento dos
capitais) e de “liberalização monetária” (com o fim do regime do padrão-ouro).
Trata-se de submeter os Estados, que se supõe serem por natureza despesistas, à
disciplina dos mercados financeiros, que se supõe serem, por natureza,
eficientes e omniscientes».
Porém, a especulação sem precedentes que se abateu
sobre a dívida pública europeia já levou o BCE, numa tentativa para a acalmar,
a comprar obrigações de Estados-membros à taxa de juro do mercado e sem
qualquer garantia de sucesso.
Como contributo para resolver o problema da dívida
pública, propõem os Economistas Aterrados:
Medida nº 1: Autorizar o Banco Central Europeu a financiar
directamente os Estados (ou a impor aos bancos comerciais a subscrição de
obrigações públicas emitidas), a um juro reduzido, aliviando desse modo o cerco
que lhes é imposto pelos mercados financeiros;
Medida nº 2: Caso seja necessário, reestruturar a dívida
pública, limitando por exemplo o seu peso a determinado valor percentual do
PIB, e estabelecendo uma discriminação entre os credores segundo o volume de
títulos que possuam: os grandes rentistas (particulares ou instituições)
deverão aceitar uma extensão da maturidade da dívida, incluindo anulações
parciais ou totais. E é igualmente necessário voltar a negociar as exorbitantes
taxas de juro dos títulos emitidos pelos países que entraram em dificuldades na
sequência da crise.
Outra evidência de difícil comprovação é a que:
A UNIÃO
EUROPEIA DEFENDE O MODELO SOCIAL EUROPEU
Esta defesa é tanto mais difícil de explicar quanto
desde cedo a União Europeia tem procurado inserir-se num processo de
globalização autodesregulado que representa afinal uma distinção dos princípios
claramente regulados do modelo social europeu. Como escrevem os autores do
manifesto a «…prevalência do direito da
concorrência sobre as regulamentações nacionais e sobre os direitos sociais no
Mercado Único permitiu introduzir mais concorrência nos mercados de bens e de
serviços, diminuir a importância dos serviços públicos e apostar na
concorrência entre os trabalhadores europeus», concorrência que «…longe de se restringir ao mercado interno, a
liberdade de circulação de capitais foi alargada aos investidores do mundo
inteiro, submetendo assim o tecido produtivo europeu aos constrangimentos e
imperativos da valorização dos capitais internacionais» para concluírem que
a «…construção europeia configura-se
deste modo como uma forma de impor aos povos as reformas neoliberais».
Esta ideia de imposição é particularmente evidente
quando o conteúdo do Pacto de Estabilidade e as regras de funcionamento do BCE,
privando de autonomia os governos eleitos dos Estados-membros em matérias de
política orçamental e monetária, revelam uma grande desconfiança relativamente
a estes bem como a qualquer política de relançamento das economias.
Não contemplando a especificidade de cada
Estado-membro e recorrendo a processos de elaboração pouco democráticos e
mobilizadores as poucas iniciativas de políticas comunitárias (as Grandes
Orientações de Política Económica, o Método Aberto de Coordenação ou a Agenda
de Lisboa) resultaram de forma muito desigual; para promover o modelo social
europeu que os Economistas Aterrados propõem:
Medida nº 1: Pôr em causa a livre circulação de capitais e de
mercadorias entre a União Europeia e o resto do mundo, renegociando se
necessário os acordos multilaterais ou bilaterais actualmente em vigor;
Medida nº 2: Substituir a política da concorrência pela
“harmonização e prosperidade”, enquanto fio condutor da construção europeia,
estabelecendo objectivos comuns vinculativos tanto em matéria de progresso
social como em matéria de políticas macroeconómicas (através de GOPS: Grandes
Orientações de Política Social).
Remonta à sua criação a ideia que:
O EURO É UM
ESCUDO DE PROTECÇÃO CONTRA A CRISE
e assim deveria ter sido, considerando que boa
parte da instabilidade monetária resulta do grau de incerteza associado à taxa
de câmbio, porém, a fraca integração e a ainda menor uniformização entre as
economias que integram a Zona Euro originou taxas de crescimento muito baixas
e, pior, resultou num processo de competição intracomunitária, originando que
os superavits duns sejam os défices dos vizinhos.
Esta divergência acentuou-se ao nível dos défices
públicos, que avaliados no conjunto da Zona Euro representavam em 2007 (na data
do início da crise) cerca de 0,6% do PIB contra cerca de 3% dos EUA, Reino
Unido e Japão, enquanto nos países do Sul da Europa essa proporção era
superior. Também na estratégia para enfrentar a crise A Zona Euro se diferencio
dos EUA e Reino Unido, países que optaram por implementar incentivos (injecções
de liquidez) de 4,2% e 3,2 % dos respectivos PIB’s, enquanto a Europa se quedou
por uns reduzidos 1,6% e sempre sob a forte limitação resultante da regra da
limitação dos défices individuais a 3% do PIB.
A realidade descrita e a evidente ausência de
coordenação levaram os Economista Aterrados a propor:
Medida nº 1: Assegurar uma verdadeira coordenação das
políticas macroeconómicas e uma redução concertada dos desequilíbrios
comerciais entre os países europeus;
Medida nº 2: Compensar os desequilíbrios da balança de
pagamentos na Europa através de um Banco de Pagamentos (que organize os
empréstimos entre países europeus);
Medida nº 3: Se a crise do euro conduzir à sua desintegração,
e enquanto se aguarda pelo surgimento de um orçamento europeu (cf. infra),
instituir um regime monetário intra-europeu (com moeda comum do tipo “bancor”),
que seja capaz de reorganizar a absorção dos desequilíbrios entre balanças
comerciais no seio da Europa.
Afirma-se, por último, que:
A CRISE GREGA
PERMITIU FINALMENTE AVANÇAR PARA UM GOVERNO ECONÓMICO E UMA VERDADEIRA
SOLIDARIEDADE EUROPEIA
mas a realidade a que temos assistido na Zona Euro
é a duma sucessão de medidas avulsas, orientadas de país a país à medida que
têm vindo a converter-se em alvos preferenciais duma especulação que há muito
percebeu a inexistência de coesão entre os seus membros e, principalmente, a
inexistência de meios sólidos de financiamento dos estados.
A preponderância das teses neoliberais na definição
das políticas europeias e no desenho de instituições como BCE, está a
condicionar decisivamente a capacidade da União Europeia para enfrentar a
crise, pelo que os Economistas Aterrados propõem:
Medida nº 1: Desenvolver uma verdadeira fiscalidade europeia
(taxa de carbono, imposto sobre os lucros, etc.) e um verdadeiro orçamento
europeu, que favoreçam a convergência das economias para uma maior equidade nas
condições de acesso aos serviços públicos e serviços sociais nos diferentes
Estados membros, com base nas melhores experiências e modelos;
Medida nº 2: Lançar um vasto plano europeu, financiado por
subscrição pública a taxas de juro reduzidas mas com garantia, e/ou através da
emissão monetária do BCE, tendo em vista encetar a reconversão ecológica da
economia europeia.
Em jeito de conclusão e por considerarem que a
opção pela exclusão das populações constitui um dos principais problemas da
União Europeia, os autores deixam a ideia da necessidade de DEBATER A
POLÍTICA ECONÓMICA, TRAÇAR CAMINHOS PARA REFUNDAR A UNIÃO EUROPEIA, libertando os Estados do cerco dos mercados
financeiros.
Estas
propostas dos Economistas Aterrados (e as anteriormente abordadas) podem – e
devem – ser lidas aqui.
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