quarta-feira, 11 de julho de 2012

AS PROPOSTAS DOS “ECONOMISTAS ATERRADOS” - III


Para concluir a abordagem da proposta de apreciação dos problemas da dívida pública, sugerida pelos Economistas Aterrados, e na sequência da questão da transferência de responsabilidades para as gerações futuras, vejamos a afirmação que:

É PRECISO ASSEGURAR A ESTABILIDADE DOS MERCADOS FINANCEIROS PARA PODER FINANCIAR A DÍVIDA PÚBLICA

Esta ideia resulta de se ter incentivado a financeirização da economia e em especial da absoluta liberalização da circulação de capitais, com a agravante no caso europeu desta se encontrar expressa em documentos fundamentais como o Tratado de Maastricht.


A pretexto do controlo da inflação, vedando ao Banco Central Europeu qualquer hipótese de intervenção directa no financiamento dos Estados-membros, devem estes «…encontrar quem lhes conceda empréstimos nos mercados financeiros. Esta “repressão monetária” acompanha a “liberalização financeira” e gera exactamente o contrário das políticas adoptadas após a grave crise da década de 30; políticas de “repressão financeira” (drásticas restrições à liberdade de movimento dos capitais) e de “liberalização monetária” (com o fim do regime do padrão-ouro). Trata-se de submeter os Estados, que se supõe serem por natureza despesistas, à disciplina dos mercados financeiros, que se supõe serem, por natureza, eficientes e omniscientes».

Porém, a especulação sem precedentes que se abateu sobre a dívida pública europeia já levou o BCE, numa tentativa para a acalmar, a comprar obrigações de Estados-membros à taxa de juro do mercado e sem qualquer garantia de sucesso.

Como contributo para resolver o problema da dívida pública, propõem os Economistas Aterrados:
Medida nº 1: Autorizar o Banco Central Europeu a financiar directamente os Estados (ou a impor aos bancos comerciais a subscrição de obrigações públicas emitidas), a um juro reduzido, aliviando desse modo o cerco que lhes é imposto pelos mercados financeiros;
Medida nº 2: Caso seja necessário, reestruturar a dívida pública, limitando por exemplo o seu peso a determinado valor percentual do PIB, e estabelecendo uma discriminação entre os credores segundo o volume de títulos que possuam: os grandes rentistas (particulares ou instituições) deverão aceitar uma extensão da maturidade da dívida, incluindo anulações parciais ou totais. E é igualmente necessário voltar a negociar as exorbitantes taxas de juro dos títulos emitidos pelos países que entraram em dificuldades na sequência da crise.

Outra evidência de difícil comprovação é a que:

A UNIÃO EUROPEIA DEFENDE O MODELO SOCIAL EUROPEU

Esta defesa é tanto mais difícil de explicar quanto desde cedo a União Europeia tem procurado inserir-se num processo de globalização autodesregulado que representa afinal uma distinção dos princípios claramente regulados do modelo social europeu. Como escrevem os autores do manifesto a «…prevalência do direito da concorrência sobre as regulamentações nacionais e sobre os direitos sociais no Mercado Único permitiu introduzir mais concorrência nos mercados de bens e de serviços, diminuir a importância dos serviços públicos e apostar na concorrência entre os trabalhadores europeus», concorrência que «…longe de se restringir ao mercado interno, a liberdade de circulação de capitais foi alargada aos investidores do mundo inteiro, submetendo assim o tecido produtivo europeu aos constrangimentos e imperativos da valorização dos capitais internacionais» para concluírem que a «…construção europeia configura-se deste modo como uma forma de impor aos povos as reformas neoliberais».

Esta ideia de imposição é particularmente evidente quando o conteúdo do Pacto de Estabilidade e as regras de funcionamento do BCE, privando de autonomia os governos eleitos dos Estados-membros em matérias de política orçamental e monetária, revelam uma grande desconfiança relativamente a estes bem como a qualquer política de relançamento das economias.

Não contemplando a especificidade de cada Estado-membro e recorrendo a processos de elaboração pouco democráticos e mobilizadores as poucas iniciativas de políticas comunitárias (as Grandes Orientações de Política Económica, o Método Aberto de Coordenação ou a Agenda de Lisboa) resultaram de forma muito desigual; para promover o modelo social europeu que os Economistas Aterrados propõem:
Medida nº 1: Pôr em causa a livre circulação de capitais e de mercadorias entre a União Europeia e o resto do mundo, renegociando se necessário os acordos multilaterais ou bilaterais actualmente em vigor;
Medida nº 2: Substituir a política da concorrência pela “harmonização e prosperidade”, enquanto fio condutor da construção europeia, estabelecendo objectivos comuns vinculativos tanto em matéria de progresso social como em matéria de políticas macroeconómicas (através de GOPS: Grandes Orientações de Política Social).

Remonta à sua criação a ideia que:

O EURO É UM ESCUDO DE PROTECÇÃO CONTRA A CRISE

e assim deveria ter sido, considerando que boa parte da instabilidade monetária resulta do grau de incerteza associado à taxa de câmbio, porém, a fraca integração e a ainda menor uniformização entre as economias que integram a Zona Euro originou taxas de crescimento muito baixas e, pior, resultou num processo de competição intracomunitária, originando que os superavits duns sejam os défices dos vizinhos.

Esta divergência acentuou-se ao nível dos défices públicos, que avaliados no conjunto da Zona Euro representavam em 2007 (na data do início da crise) cerca de 0,6% do PIB contra cerca de 3% dos EUA, Reino Unido e Japão, enquanto nos países do Sul da Europa essa proporção era superior. Também na estratégia para enfrentar a crise A Zona Euro se diferencio dos EUA e Reino Unido, países que optaram por implementar incentivos (injecções de liquidez) de 4,2% e 3,2 % dos respectivos PIB’s, enquanto a Europa se quedou por uns reduzidos 1,6% e sempre sob a forte limitação resultante da regra da limitação dos défices individuais a 3% do PIB.

A realidade descrita e a evidente ausência de coordenação levaram os Economista Aterrados a propor:
Medida nº 1: Assegurar uma verdadeira coordenação das políticas macroeconómicas e uma redução concertada dos desequilíbrios comerciais entre os países europeus;
Medida nº 2: Compensar os desequilíbrios da balança de pagamentos na Europa através de um Banco de Pagamentos (que organize os empréstimos entre países europeus);
Medida nº 3: Se a crise do euro conduzir à sua desintegração, e enquanto se aguarda pelo surgimento de um orçamento europeu (cf. infra), instituir um regime monetário intra-europeu (com moeda comum do tipo “bancor”), que seja capaz de reorganizar a absorção dos desequilíbrios entre balanças comerciais no seio da Europa.

Afirma-se, por último, que:

A CRISE GREGA PERMITIU FINALMENTE AVANÇAR PARA UM GOVERNO ECONÓMICO E UMA VERDADEIRA SOLIDARIEDADE EUROPEIA

mas a realidade a que temos assistido na Zona Euro é a duma sucessão de medidas avulsas, orientadas de país a país à medida que têm vindo a converter-se em alvos preferenciais duma especulação que há muito percebeu a inexistência de coesão entre os seus membros e, principalmente, a inexistência de meios sólidos de financiamento dos estados.

A preponderância das teses neoliberais na definição das políticas europeias e no desenho de instituições como BCE, está a condicionar decisivamente a capacidade da União Europeia para enfrentar a crise, pelo que os Economistas Aterrados propõem:
Medida nº 1: Desenvolver uma verdadeira fiscalidade europeia (taxa de carbono, imposto sobre os lucros, etc.) e um verdadeiro orçamento europeu, que favoreçam a convergência das economias para uma maior equidade nas condições de acesso aos serviços públicos e serviços sociais nos diferentes Estados membros, com base nas melhores experiências e modelos;
Medida nº 2: Lançar um vasto plano europeu, financiado por subscrição pública a taxas de juro reduzidas mas com garantia, e/ou através da emissão monetária do BCE, tendo em vista encetar a reconversão ecológica da economia europeia.

Em jeito de conclusão e por considerarem que a opção pela exclusão das populações constitui um dos principais problemas da União Europeia, os autores deixam a ideia da necessidade de DEBATER A POLÍTICA ECONÓMICA, TRAÇAR CAMINHOS PARA REFUNDAR A UNIÃO EUROPEIA, libertando os Estados do cerco dos mercados financeiros.

Estas propostas dos Economistas Aterrados (e as anteriormente abordadas) podem – e devem – ser lidas aqui.

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