sábado, 7 de julho de 2012

AS PROPOSTAS DOS “ECONOMISTAS ATERRADOS” - II


Continuando a apreciar as propostas dos Economistas Aterrados e centrando a atenção na questão da eficiência dos mercados, vejamos mais esta:

OS MERCADOS SÃO BONS JUÍZES DO GRAU DE SOLVÊNCIA DOS ESTADOS

Estabelecido, como o foi anteriormente, que os mercados financeiros pecam pela sua ineficiência, forçoso se torna concluir que também não reúnem condições para avaliarem correctamente os grau de risco dos Estados. Como muito bem escrevem os Economistas Aterrados «[n]as salas de mercado, as coisas são o que os operadores imaginam que venham a ser. O preço de um activo financeiro resulta de uma avaliação, de uma crença, de uma aposta no futuro: nada assegura que a avaliação dos mercados tenha alguma espécie de superioridade sobre as outras formas de avaliação».

Como algumas vezes referi noutros “posts”, se as decisões dos “mercados” fossem racionais, teriam sido as dívidas doutros Estados não europeus, – como o Japão, a Grã-Bretanha ou os EUA, devido aos seus elevados níveis de endividamento ou ao respectivo peso relativamente ao PIB – as primeiras a terem sido alvo da atenção e da subida dos juros implícitos.
A outros avaliadores, como as agências de notação de risco, interessa igualmente alimentar a instabilidade das cotações, pois é a volatilidade assim originada que assegura a sua própria procura, além dos ganhos realizados através dos lucros especulativos e da confirmação das suas previsões.

Para reduzir estas influências os Economistas Aterrados propõem:
Medida nº 1: As agências de notação financeira não devem estar autorizadas a influenciar, de forma arbitrária as taxas de juro dos mercados de dívida pública, baixando a notação de um Estado: a sua actividade deve ser regulamentada, exigindo-se que essa classificação resulte de um cálculo económico transparente;
Medida nº 2: Libertar os Estados da ameaça dos mercados financeiros, garantindo a compra de títulos da dívida pública pelo BCE.

Outro dos axiomas muito propalado é o que:

A SUBIDA DAS DÍVIDAS PÚBLICAS É O RESULTADO DUM EXCESSO DE DESPESAS

Normalmente acompanhada da pia observação de que a iniciativa privada é melhor gestora que a pública, como se o recente aumento do endividamento público não tivesse sido consequência directa da recessão provocada pela crise financeira despoletada em 2008, na sequência duma bolha especulativa, e aos planos de resgate do sector financeiro que fizeram disparar o peso da dívida pública no PIB nacional.

Até mesmo a parte do aumento que antecedeu a recessão não foi resultado duma subida das despesas públicas, antes consequência da quebra das receitas públicas, devido ao reduzido crescimento económico nesse período e às políticas de desagravamento fiscal sobre as empresas e as grandes fortunas aplicadas nos últimos vinte ou trinta anos. Para agravar ainda mais a situação na Zona Euro, os Estados-membros preferiram envolver-se num processo de concorrência fiscal em detrimento duma mais lógica harmonização fiscal.

Para contrariar aquela afirmação e promover um debate sobre as causas e as soluções, os Economistas Aterrados propõem:
Medida nº 1: Efectuar uma auditoria pública das dívidas soberanas, de modo a determinar a sua origem e a conhecer a identidade dos principais detentores de títulos de dívida e os respectivos montantes que possuem.

A ideia do excesso de despesa sustenta ainda a afirmação que:

É PRECISO REDUZIR AS DESPESAS PARA DIMINUIR A DÍVIDA PÚBLICA

Ainda que o aumento da dívida pública tivesse resultado dum simples aumento das despesas públicas – afirmação contrariada no “post” anterior – não seria a sua simples redução que constituiria solução, pois do simples facto de na actual conjuntura económica recessiva o crescimento económico (variação do PIB) ser inferior às taxas de juro a que os Estados se financiam resulta um agravamento da dívida.

Como na economia todas as variáveis se apresentam interligadas a simples ideia de reduzir a despesa pública (que inclui a componente de despesa corrente mas também a de investimento) contribui para agravar o produto nacional; assim, se a despesa pública em geral ajuda, no curto prazo, a amortecer o efeito da recessão, o investimento público (educação, saúde, infaestruturas, etc.) é, no longo prazo, factor de importante estímulo ao crescimento económico. Concluir, de forma directa, que da redução da despesa resulta um efeito idêntico sobre a dívida é absurdo porque comprometendo o crescimento da economia acentua-se ainda mais o crescimento da dívida (muito por via do aumento do serviço da dívida) e quando tal efeito se verifica será principalmente em situações pontuais e em economias que, contrariamente às europeias, se encontram pouco interligadas.

Assim, para evitar que o reequilíbrio das finanças públicas seja atingido a expensas dum desastre social e político, os Economistas Aterrados propõem duas medidas:
Medida nº 1: Manter os níveis de protecção social e, inclusivamente, reforçá-los (subsídio de desemprego, habitação…);
Medida nº 2: Aumentar o esforço orçamental em matéria de educação, de investigação e de investimento na reconversão ecológica e ambiental…tendo em vista estabelecer as condições de um crescimento sustentável, capaz de permitir uma forte descida do desemprego.

Numa clara – mas intencional – confusão entre macroeconomia e microeconomia é hoje corrente ouvirmos a afirmação que:

A DÍVIDA PÚBLICA TRANSFERE O CUSTO DOS NOSSOS EXCESSOS PARA OS NOSSOS NETOS

Esta afirmação, baseada na ideia de que a redução dos impostos estimula o crescimento e aumenta no futuro as receitas públicas, serviu para sustentar as políticas de redução fiscal sobre o capital (empresas e grandes fortunas) e o consequente agravamento da dívida pública; como afirmam os autores do manifesto, foi «…o que se poderia chamar de “efeito jackpot”: com o dinheiro poupado nos seus impostos, os ricos puderam adquirir títulos (portadores de juros) da dívida pública, emitida para financiar os défices públicos provocados pelas reduções de impostos…», um verdadeiro “dois em um” pois aumenta o seu rendimento disponível por via da redução fiscal e dos juros “ganhos” com a aplicação daqueles excedentes em títulos da dívida pública.

A verdadeira transferência de riqueza não ocorre entre as gerações actuais e as futuras mas sim entre contribuintes fiscais (dos que contribuem mais para os que passaram a contribuir menos), com o bónus de servir ainda para convencer a opinião pública de que os culpados da dívida pública eram os funcionários, os reformados e os doentes.

O já reduzido fundamento que a afirmação pudesse ter deteriora-se ainda mais quando escamoteia o facto do investimento público (educação, saúde, infraestruturas, etc.) contribuir decisivamente para a qualidade de vida das gerações futuras.

Para reequilibrar de forma justa as finanças públicas os Economistas Aterrados propõem duas medidas:
Medida nº 1: Atribuir de novo um carácter fortemente redistributivo à fiscalidade directa sobre os rendimentos (supressão das deduções fiscais, criação de novos escalões de impostos e aumento das taxas sobre os rendimentos…);
Medida nº 2: Acabar com as isenções de que beneficiam as empresas que não tenham um efeito relevante sobre o emprego.

Estas propostas dos Economistas Aterrados (as já abordadas e as que abordarei no futuro) podem – e devem – ser lidas aqui.

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