sábado, 21 de janeiro de 2012

PROCELAS E OUTRAS MAZELAS

Continuam a não faltar as mais díspares e alarmantes notícias sobre a perigosa situação da UE, da sua moeda única e da dívida soberana.

É óbvio que navegando mares tão procelosos algum pequeno dano poderá ocorrer, mas assegurada a fidelidade absoluta dos líderes políticos e garantido que estes não revelem o mínimo rebuço no processo de esbulho aos cidadãos eleitores, o risco será mínimo e logo que retorne a acalmia será chegado o momento de voltar a agitar e a estimular a sempre latente voracidade esbanjadora daqueles para que seja iniciado novo ciclo de endividamento geral, ainda e sempre em benefício dos prudentes e sábios “investidores”.
 

Depois de no final da semana passada termos sido “brindados” com a notícia de que a «S&P baixa rating da França para AA», ou de forma mais esclarecedora que a «S&P corta rating a nove países, França perde AAA e Portugal passa a “lixo”», foi a vez esta semana de ficarmos a saber que a «Moody´s mantém triplo-A da França com perspectiva estável» mas a «Standard & Poor’s garante nota AAA para a Alemanha», enquanto Mario Draghi, o «Presidente do BCE diz que situação actual é “muito grave”», pôde ler-se que Wolfgang Schaüble, o ministro das finanças alemão, afirma que «Precisamos reduzir influência das agências de rating» e correm notícias de que «Agência de “rating” europeia avança este ano».

Se não é de estranhar que após de se ter noticiado que «Banco Mundial  prevê recessão de 0,3% na zona euro este ano», ou numa avaliação mais suavize quando se diz que o «FMI prevê uma recessão “ligeira” na Zona Euro em 2012», até o presidente do Eurogrupo, o luxemburguês Jean-Claude Junker, avise que a «Zona Euro está “à beira” da recessão», já a muito divulgada presença em território nacional do Nobel da Economia e antigo vice-presidente do Banco Mundial, Joseph Stiglitz ganhou foros de sensação quando se pronunciou no sentido de que a «”Europa tem de perceber que a austeridade não é resposta”» e de forma ainda mais clara criticou a opção por políticas de reduções salariais e de privatizações por considerar que as primeiras contribuem para a contracção das economias e as segundas representam a escolha dum momento errado para alienar activos a um valor justo.

Siglitz não afirma nada que constitua novidade nem que um experiente gestor não reconheça como conselho avisado, mas em plena tormenta financeira, quando a situação se revela cada vez mais desesperada e são cada vez mais comuns as contradições entre os principais actores (políticos e económicos), uma tão variada difusão de informação pode até acabar por não produzir qualquer efeito, tal tem sido o “ruído” e a desinformação. Exemplo disso mesmo são declarações como as do ex-economista chefe do FMI, Kenneth Rogoff, que «vê possibilidade de 80% de um ou dois países saírem do euro», assegura que “Grécia, Portugal, Irlanda e possivelmente também a Espanha estão insolventes e precisam de reestruturar a sua dívida”, mas recusa que a solução passe por aumentar o recurso ao BCE por considerar que isso representa um “esquema Ponzi, que eventualmente entraria em colapso”; a medonha desonestidade intelectual que rodeia os críticos daquela opção é de explicação fácil, bastando lembrar que se o recurso a um mecanismo de financiamento público directo (leia-se junto do banco central) origina criação de moeda, o mesmo sucede, para pior, quando os Estados se financiam junto do sistema financeiro, pois neste caso há lugar à alavancagem proporcionada pelo multiplicador do crédito (cada unidade monetária adquirida a taxas reduzidas junto do banco central é multiplicada pelo inverso da taxa de reserva) mas principalmente ao lucro elevado, proporcionado pela diferença entre os juros reduzidos a que se financiam e os mais altos que cobram aos Estados, e seguro, pois tudo está a ser feito para assegurar que em caso algum os bancos não deixem de os receber.

Este raciocínio simplista pode porém vir a registar uma significativa alteração, caso, como tudo o indica, a crise actual seja muito mais grave e profunda que os analistas “oficiais” têm admitido. Se afinal não estivermos a atravessar mais uma pequena crise de liquidez mas a caminhar no sentido do aprofundamento da crise despoletada pelo rebentamento da bolha do “subprime” e previsões como as que o LEAP, o “think tank” europeu, tem apresentado (vejam-se os boletins mensais de Dezembro de 2011 e Janeiro de 2012), indiciando que a tão propalada crise da dívida pública europeia não passa duma manobra desesperada para ocultar a enormidade que constitui uma possível insolvência da dívida inglesa e norte-americana, hipóteses bem reais face aos recentes desenvolvimentos políticos na Europa (o isolamento do governo britânico nas decisões da última cimeira europeia, confirmado pelo anúncio de que fica o «Reino Unido proibido de utilizar o Mecanismo de Resgate Permanente») e às mais recentes previsões de Nouriel Roubini que alerta claramente para «A enganadora retoma da América», num ano em que os EUA vão enfrentar mais uma longa campanha eleitoral.

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