sexta-feira, 15 de julho de 2011

CONTRA AS BASTILHAS DE HOJE


Quando aos simples observadores, que somos todos nós, parecem restar cada vez menos dúvidas sobre o avolumar da tempestade e sobre a sua velocidade de aproximação, haverá ainda lugar a alguma complacência para com aqueles que intitulando-se (ou intitulados) líderes e condutores de destinos colectivos continuam sem apresentar qualquer solução, por tímida ou insipiente que seja?


Os acontecimentos nacionais e internacionais da semana que agora terminou, e em especial os da área económica, não constituíram senão nova demonstração da tibieza daqueles a quem confiámos a liderança do nosso futuro. Desde a caricata discussão em torno do limite ao endividamento norte-americano – com Democratas e Republicanos a revelarem o que de pior pode representar um sistema bipartidário, com as suas “jogadas” de bastidores e permanente “negociação” de interesses[1] –, à ridícula apresentação duma mera estratégia de redução dos rendimentos do trabalho em claro benefício dos do capital, levada acabo pelo governo de Passos Coelho e justificada como se dela dependesse a salvação dum défice e de toda a economia nacional, passando pela contínua sucessão de adiamentos na definição da política europeia para enfrentar a crise das dívidas soberanas[2], tudo dentro da mais habitual das normalidades onde nem a aparentemente temerária decisão de contrariar o barão da comunicação, Rupert Murdoch, na aquisição da totalidade do capital do canal de televisão BSkyB passou afinal duma pífia sugestão à sua desistência[3].

Enquanto as sociedades se degradam nos seus fundamentos económicos e sociais, os líderes recusam-se a fazer uso das medidas políticas que poderiam minorar ou até estancar aqueles efeitos. Fingem-se preocupados com o sofrimento dos milhões de desempregados que as suas opções originaram, afirmam-se dispostos a tudo fazer para resolver a situação mas as medidas que anunciam são geralmente mais gravosas que produtivas, como se pode confirmar no último Relatório do Banco de Portugal que assegura que a «Actividade económica contrai pelo sexto mês seguido», ou inferir duma recente apreciação do FMI que assegura que a «dívida grega está numa espiral descontrolada».

Numa estrita observância das regras duma economia dita de mercado, insistem em mais e maior liberdade de ganhos para o capital – sejam estes representados pelo aumento dos lucros fruto da redução do número de empregados, pela redução/limitação dos crescimentos salariais ou ainda pela redução dos encargos sociais (veja-se a famigerada pretensão, defendida por Passos Coelho, de reduzir a TSU sob o pretexto de assim se aumentar a produtividade nacional) –, na alienação a qualquer preço de empresas públicas e recusam, com a jactância dos soberbos, qualquer iniciativa que possa melindrar os interesses económicos que outra coisa não têm feito que crescer à sombra e protecção dos Estados que execram.

A grande incógnita que hoje, duzentos e vinte e dois anos e um dia depois da Tomada da Bastilha[4], aqui deixo é até quando continuaremos a aceitar a predominância das ideias e dos ideólogos (ou dos seus apaniguados de pacotilha) que visivelmente nos têm conduzido ao ponto em que nos encontramos, sem um claro sinal de revolta e de rejeição de tais princípios?


[1] Um bom exemplo disso mesmo é a recente notícia duma «Proposta republicana para salvar o tecto da dívida», em cujo corpo surgem referências a alguns dos “interesses” envolvidos.
[2] Dos quais a notícia de que mais uma «Reunião de crise entre responsáveis da zona euro terminou sem conclusões oficiais» é apenas um exemplo recente.
[4] Episódio ocorrido no dia 14 de Julho de 1789, que ficaria para sempre como um dos grandes marcos da Revolução Francesa e é actualmente assinalada como o principal feriado francês. Na essência tratou-se do assalto pela população de Paris a uma fortaleza que servia na época como prisão, com o intuito da posterior utilização do armamento nela guardado para a defesa da cidade contra as tropas fiéis à monarquia 

4 comentários:

Anónimo disse...

a crise é essencialmente demográfica

e produtiva

resumindo tem um frigorífico chinês umas calças paquistanesas um ipod indiano

programas de busca feitos na coreia

e se graças a Vishnu 60% da economia mundial antes da queda da Bastilha
estava na ásia

depois da queda da bastilha curiosamente
60% da riqueza mundial ficou na europa

logo isso de quedas de bastilhas não significam liberdade para todos

só a engorda de uns porcos europeus
durante dois séculos

e o esfaimar de centenas de milhões
de esfarrapados durante outros 200

ó escrevente fervente

E viva a Bastilha disse...

Porque a maioria dos povos que foram colonizados pelos povos que derrubaram bastilhas nas suas terras

tiveram bastilhas de muito pior construção

Mais vale europeu esfaimado disse...

Que rico proprietário de fazendas de cacau na Costa do Marfim ou do Benin

ser mestre de 20 escravos não deixa de ser escravo sem possibilidades de alforriar a miséria

ainda não?

Numa estrita observância disse...

Se o nível de vida de 2 mil milhões passa de miserável para miserável mais dois cestos de proteínas por ano

e transportes públicos em vez de bicicletas

alguém tem de pagar as favas né?