domingo, 26 de fevereiro de 2006

PAUL MARCINKUS

Faleceu na passada terça-feira (dia 21de Fevereiro) no estado americano do Arizona, Paul Casimir Marcinkus, natural de Chicago.

Para quem este nome na sugira, talvez o de “banqueiro de Deus” traga algumas reminiscências. É verdade, morreu o arcebispo Marcinkus, o homem que durante cerca de vinte anos foi uma das mais poderosas figuras do Vaticano.

Nascido nos arredores de Chicago em 1922, foi ordenado padre em 1947 e alcandorar-se-ia à cúpula directiva do IOR (Instituto para as Obras da Religião), também conhecido por Banco do Vaticano, em 1971, sob o papado de Paulo VI.

Chegou a esta posição depois de ter integrado a Secretaria de Estado (espécie de órgão governativo do Vaticano) com funções específicas de chefe de segurança do papa Paulo VI. Enquanto desempenhou estas funções terá estabelecido importantes contactos com os serviços secretos do Vaticano, também conhecidos pela designação de Santa Aliança, facto que muito poderá ter contribuído para que em 1969 o papa o consagrasse bispo e o nomeasse secretário do IOR.

Daí a dois anos seria nomeado responsável máximo do IOR e encetaria uma rede de relações entre as quais se contavam:

- Michele Sindona - presumível membro da família Gambino (máfia), foi conselheiro financeiro de Paulo VI e membro da loja maçónica (?) P2;

- Roberto Calvi - de simples trabalhador do Banco Ambrosiano chegou rapidamente a seu administrador, foi responsável por inúmeros negócios ilegais que envolveram o IOR, membro da loja maçónica (?) P2; em 1982 apareceu enforcado em Londres, em Blackfriars Bridge;

- Umberto Ortolani - chefe dos serviços secretos italianos durante a II Guerra Mundial, especialista em contra-espionagem, dispunha de importantes ligações na América Latina e foi membro destacado da loja maçónica (?) P2);

- Licio Gelli - lutou no exército de Franco durante a Guerra de Espanha, foi membro das SS alemãs em Itália, colaborou na rede de protecção e fuga dos nazis para a América Latina, participou em redes de contrabando de armas, nomeadamente no fornecimento de mísseis Exocet à Argentina, no período que antecedeu a Guerra das Malvinas; foi fundador da loja maçónica (?) P2).

Esta intrincada teia de interesses e os múltiplos negócios ilegais em que Marcinkus se envolveu resultaram num buraco de 1,4 mil milhões de dólares nas contas do Banco Ambrosiano e de 250 milhões de dólares nas do IOR.

Apesar de se desconhecer o destino destas somas, entre as quais havia seguramente dinheiro da máfia, especula-se que possam ter servido para:

- utilização em contas privadas;

- apoiar a loja maçónica (?) Propaganda Due (P2);

- financiar golpes militares como os ocorridos na Grécia em 1967 e o da Nicarágua, que conduziria ao poder Anastácio Somoza;

- financiar o então ilegalizado sindicato polaco Solidariedade, numa operação montada entre a CIA e a Santa Aliança;

- financiamento da operação da CIA que ficou conhecido pelo escândalo Irão-Contras;

- possível financiamento das actividades da Gládio, grupo paramilitar italiano de orientação neofascista.

Para além destes “negócios” em que terá estado envolvido, Marcinkus é igualmente figura de destaque noutro acontecimento ocorrido no Vaticano.

De acordo com David Yallop (autor de “In God´s Name”) - jornalista que investigou a estranha morte de Albino Luciani (o papa João Paulo I), ocorrida 33 dias após a sua eleição, em Agosto de 1978, e num momento em que estaria a preparar uma intervenção profunda no IOR – o cardeal Marcinkus foi seguramente um dos grande beneficiados por aquela ocorrência.

Outro investigador da história vaticana, Eric Frattini (autor de “A Santa Aliança”), refere a existência, na altura da morte de João Paulo I, de uma dupla investigação interna sobre a infiltração no Vaticano de membros de associações secretas e sobre os “negócios” em que o IOR se encontraria envolvido. Estas seriam conduzida pela Santa Aliança ou pelos serviços de contra-espionagem (o Sodalitium Pianum), mas um dos homens sob observação, em qualquer dos casos, era seguramente Marcinkus.

Curiosamente, um outro investigador da morte de João Paulo I, John Cornwell (autor de “AThief in the Night”), recusa a hipótese de assassínio do papa sem contudo deixar de mencionar o envolvimento de Marcinkus nos “negócios” já referidos, bem como a sua posição de grande beneficiário.

Com a falência do Banco Ambrosiano, em 1982, e os grandes prejuízos que acarretou ao IOR, seu principal accionista, Paul Marcinkus, que fora nomeado arcebispo há um ano, começou a ver a sua “estrela” a empalidecer, mas não tanto que levasse o papa João Paulo II a destitui-lo imediatamente das suas funções no IOR.

A polémica morte de Roberto Calvi ,o ex-administrador do Banco Ambrosiano, levou a polícia italiana a formalizar acusação contra Marcinkus que graças ao apoio do papa manteve a sua liberdade e acabou por se ver livre de mais problemas.

Paul Marcinkus deixaria o Vaticano em 1990 para se instalar nos EUA. Primeiramente próximo de Chicago (sua região natal), para em 1991 se mudar para o estado do Arizona onde viria a falecer.
Durante todo este tempo a justiça italiana tentou mais que uma vez que sucessivas administrações americanas colaborassem na extradição do prelado sem sucesso.

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