terça-feira, 7 de fevereiro de 2006

BELMIRO VERSUS PT

É inegável que a notícia do dia foi a do anúncio de uma OPA (oferta pública de aquisição) da PT pela SONAE.

Independentemente de algumas questões que os especialistas do mercado de capitais de pronto colocaram:

– a PT apresenta uma dimensão quatro vezes superior à SONAE;

– o valor oferecido revela-se inferior ao valor médio do sector;

parece-me mais importante reflectir sobre o que pretende Belmiro de Azevedo com esta operação, tanto mais que a administração da PT declarou a OPA como hostil, numa conferência de imprensa realizada ao final do dia, e aconselhou os seus accionistas a aguardarem novos desenvolvimentos. Pela voz de Horta e Costa, presidente do seu conselho de administração, a PT fundamentou esta sua posição no facto da SONAE não ter disponibilizado informação relativa ao financiamento e por apresentar uma estrutura já com elevados níveis de endividamento, podendo assim implicar o desmantelamento do grupo.

Também numa conferência de imprensa (posterior à da PT) Belmiro de Azevedo veio refutar o carácter de hostilidade da OPA, classificando-a como proposta de interesse nacional por contribuir para a clarificação da posição da PT, empresa que tem atravessado períodos de alguma instabilidade, e para o aumento da concorrência.

Não esquecendo que na década de 80 do século passado Belmiro foi o introdutor no mercado de capitais nacional das OPV (oferta pública de venda), operações com as quais financiou o crescimento do seu grupo económico, sabendo-se já detém posições no sector das telecomunicações (NOVIS e OPTIMUS), mantém-se a questão do que pretende um empresário que com esta operação.

Tanto quanto noticiado nos jornais o valor a desembolsar poderá atingir os 13,9 mil milhões de euros (11 mil milhões para a compra da totalidade do capital da PT e 2,9 mil milhões para a PT Multimédia) pelo que Belmiro conta com o apoio do Santander para o financiamento de uma operação que faz depender de duas condições prévias: o Estado abdicar da sua “golden share” (posição minoritária que lhe permite manter o controle gestionário da PT) e a abolição da limitação de 10% como quota máxima de capital por investidor.

Sabendo-se que um dos sócios de Belmiro na SONAECOM (empresa do sector das telecomunicações que integra o seu universo empresarial) é a FRANCE TELECOM e que um dos actuais accionistas da PT (limitado ao tal máximo dos 10%) é a TELEFÓNICA, nada me espantaria se estivéssemos na presença de mais uma daquelas operações que os patrióticos empresários portugueses costumam realizar, para mais tarde virem a consolidar posições com os seus parceiros estrangeiros assegurando a estes o controlo das empresas apetecidas e àqueles os sobre lucros devidos pelos “bons serviços prestados”. Hipótese que a própria FRANCE TELECOM não desmente porquanto, segundo afirma o PUBLICO, esta empresa negou a iniciativa da OPA mas confirmou o seu interesse no respectivo desenrolar e a sua disponibilidade para eventual intervenção no futuro.

Honestamente, enquanto consumidor é-me indiferente a titularidade de empresas que prestem serviços, incluindo os de natureza estratégica, desde que não tenha prejuízos nos preços cobrados; enquanto português não tenho uma visão redutora nem nacionalista da economia, mas enquanto cidadão contribuinte que viu sucessivas empresas produtoras de bens e serviços essenciais serem entregues à iniciativa privada ao abrigo do dogma de que seriam melhor geridas desta forma (algo que na prática não se tem vindo a confirmar) para posteriormente assistir impotente à sua revenda a interesses, invariavelmente estrangeiros, e ao correspondente encaixe pelos anteriores proprietários (os tais profundamente patrióticos) de chorudos lucros é criminoso.

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