Em tempos de menor formação e pior
informação era usual associar as fatalidades que assolavam os povos à
influência do demo, desculpa pronta para o difícil de explicar ou para as
nefastas opções de governantes alcandorados ao poder por hereditariedade,
desculpa que agora, em tempos de maior racionalidade, deveria soar a falso. Tão
falso quanto as que antigamente ouvíamos sobre a inexistência de alternativas
ou as que agora ouvimos quase diariamente sobre a instabilidade que nos rodeia.
Sejam as parangonas sobre a famigerada
dívida pública (invariavelmente apresentada como consequência do despesismo
desregrado e não como corolário dum sistema económico que aceitou a
financeirização a qualquer preço) ou as ameaças de terrorismo (habitualmente
associado ao extremismo islâmico, como se este não tivesse sido pacientemente
tecido, financiado e armado para assegurar a conquista ou a manutenção de zonas
de influência político-económicas), o
que importa não é a realidade, mas a percepção que dela temos... ou que os demagogos nos vendem.
Entrámos no campo ideal do populismo onde alguém apresenta algumas verdades aceites
pela generalidade, mas de cuja enunciação duma forma incorrecta, resulta o seu
reconhecimento como o novo salvador. E o que ultimamente não tem faltado por aí
é quem se arrogue esse papel, prometendo o alívio de todos os males e apontando
nos outros – nos estrangeiros, nos de cor, de ideias ou de credos diferentes –
os responsáveis pela atribulada conjuntura que vivemos, nunca na conjugação dos
interesses económicos e políticos que conduziram as sociedades à beira do
abismo que eles próprios anunciam.
A crescente vaga de populismo não é um
fenómeno novo nem inexplicável; deriva da sensação de insegurança – real ou
fictícia – e do medo a ela associada e está a ser especialmente explorada por
sectores políticos que oportunisticamente surgem em períodos de crise; veja-se
o que aconteceu no primeiro quartel do século passado quando bem preparadas
máquinas de propaganda conduziram ao poder líderes populistas que rapidamente
transformaram em autoritarismo cego a democracia que lhes permitira a
existência.
A História pode não se repetir, mas
poucos duvidam da semelhança entre os aflitivos tempos da Grande Depressão e
aqueles que hoje vivem as economias ocidentais (onde uma mal compreendida crise
financeira representou apenas o primeiro sinal duma crise sistémica cuja
evidência continua a ser negada, logo deficientemente enfrentada) e na qual a
cidadania foi reduzida à mera figura de estilo das regulares votações. A
conjugação de múltiplos factores, como a crise económica e social, expressa na
forte destruição de emprego e no fraco crescimento das economias ocidentais, a
alienação dos cidadãos face à política e a demagogia de pacotilha das promessas
fáceis e da vilanização dos estrangeiros está a conduzir as democracias para um
populismo que não pode acabar senão num novo totalitarismo.
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