quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

O PARCEIRO ERRADO

Quando, no mundo ocidental, é dada cada vez mais atenção aos movimentos populistas, seja pela recente eleição de Donald Trump para presidente dos EUA seja pelo próximo quadro eleitoral europeu (especialmente depois do referendo britânico que levou ao Brexit), emerge uma figura que muitos europeus ainda não entenderão verdadeiramente: o euro-deputado e ex-líder do UKIP, Nigel Farage.


Este defensor declarado da saída do Reino Unido da UE e antigo membro do Partido Conservador britânico tornou-se notado em Bruxelas pela exposição de uns quantos casos de corrupção ou de comportamento eticamente criticável entre candidatos e comissários europeus, incluindo o então presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso.

Falhada a tentativa de eleição para a Câmara dos Comuns, em 2010, mas concretizada a vitória no referendo britânico, deixou a liderança do UKIP o que permite especular que talvez o seu objectivo não seja apenas o Brexit, antes o colapso da União Europeia. E os ventos parecem favoráveis quando as projecções para as próximas eleições na Europa atribuem fortes probabilidades aos seus homólogos holandeses e franceses e especialmente depois da eleição de Trump. O mesmo que elogiou o Brexit como "uma grande coisa", que disse repetidamente que pretendia "designar negociadores duros e inteligentes para lutar pelos trabalhadores americanos" e que no lugar de iniciar um conflito com a China (de consequências duvidosas) poderá optar por atirar os países europeus uns contra os outros.

A UE não é apenas um alvo muito fácil, é o elo mais fraco, tanto mais fraco quanto há décadas que os ingleses a vêem corroendo pelo interior, e que a eminência do Brexit  vai proporcionar aos EUA a promessa dum grande tratado de comércio livre com o Reino Unido que será simultâneamente uma mensagem clara para os restantes membros da UE: deixem a União e beneficiarão dum tratamento preferencial.

Incapaz (ou insuficiente forte) para enfrentar directamente a China, o seu mais sério rival e concorrente ao papel de principal potência, os EUA deverão aumentar a pressão para a fragmentação duma Europa que nunca se revelou efectivamente capaz de fazer valer internacionalmente o seu peso económico e político podendo o primeiro sinal vir a ser o endurecimento das condições de atribuição de vistos para os EUA aos empresários alemães e franceses ou a apresentação à Alemanha da factura adicional pelas tropas americanas estacionadas no seu território, enquanto os britânicos e os cidadãos dos países sem "migrantes muçulmanos da UE" (como a Polónia e a Hungria) serão recompensados com o acesso ultra-rápido aos negócios além-Atlântico.

Se isto acontecer a UE não tardará a entrar em colapso o que poderá libertar os ingleses da necessidade de lidar com a realidade confusa do pós-Brexit, podendo até o Reino Unido conservar um lugar que impeça os acontecimentos e bloqueie a solução; o impasse levará muitos dos cidadãos europeus a culpar a UE (e não os EUA), reforçando o papel profético dos populistas, como Nigel Farage, que não enjeitarão a oportunidade para mostrar que os Estados-Membros até fazem fila para sair da UE.

Num contexto destes, até poderão ser desnecessários os esforços de Vladimir Putin para garantir o mesmo efeito através da implantação dos seus homens nos Estados Bálticos, ou para reduzir a atractividade da UE para a Ucrânia, a Geórgia, ou qualquer outra parte da antiga União Soviética.

Em resumo, o futuro continuará a apresentar-se pessimista para uma UE agarrada às suas actuais estruturas não democráticas e não eleitas (como a Comissão Europeia e o Ecofin) e bloqueada por lideranças atávicas e desprovidas de visão para lançarem um processo de reforma da base até ao topo duma estrutura que sempre deixou campo livre a um Reino Unido mais atlantista que europeísta, enquanto manietava quem denunciasse o absurdo daquela estratégia e pugnasse pela construção duma Europa dotada das estruturas adequadas (eleitas pelos cidadãos, capazes de criar sistemas fiscais e orçamentais dignos duma verdadeira união e de um exército único capaz de projectar força e corporizar uma política externa efectiva) no lugar da simples nomenclatura criada com o BCE e o Parlamento Europeu.

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