quinta-feira, 12 de março de 2015

TODOS AO MESMO NÍVEL

Os meios de comunicação formal e informal estão inundados de notícias e comentários sobre a situação contributiva dum cidadão nacional. Fosse este um caso normal e vivendo nós num estado dirigido pelos mais impolutos e zelosos curadores e, ao abrigo das regras em vigor, há muito aquele cidadão teria visto o vencimento ou a habitação penhorados.

Sucede, porém, que o pobre incumpridor é, nem mais nem menos, que o chefe de fila dos questores (cobradores dos impostos imperiais) que nos calharam em sorte e um dos mais férreos defensores do “pagaremos doa o que doer”, pelo que, zeloso, logo procedeu à liquidação da dívida tão presto soube que a imprensa se aprontava a denunciar o caso.

Todos temos acompanhado o rol de justificações, meias-verdades, ou paráfrases sobre o caso; todas desmentidas ou corrigidas de seguida, adaptadas às circunstâncias ou mais prosaicamente remetidas para o limbo duma memória que se espera (e deseja…) curta, ou não grassasse no País e na elite política que o tem dirigido uma inquietante falta de valores.Conforme os interlocutores e os espectadores se perfilem do lado dos questores ou dos críticos, assim se sucedem as justificações ou as condenações, a maioria das quais já atiradas para o esquecimento. É claro que as primeiras que se fizeram ouvir foram as dos zelosos defensores que de pronto saíram a terreiro em defesa do probo primeiro-ministro, dizendo que a dívida já estava saldada, que era questão do foro pessoal e de pequena monta, etc., etc., etc…, e culminando com Luís Montenegro, o líder parlamentar do PSD, a assegurar que «Passos é o "mais bem preparado" para primeiro-ministro».

Muita gente concordará com aquele argumentário; achará a questão despropositada e mais adequada à chicana política que à ponderada gestão da coisa pública (como o fez Cavaco Silva) e a crer, até António «Costa considera estar “tudo esclarecido” sobre contribuições de Passos».

É claro que face à enormidade dos problemas que assolam o País, esta é uma questão de pormenor, mas são os pormenores que revelam a verdadeira essência e a verdadeira natureza dos Homens. Assim, neste recôndito canto onde os princípios éticos continuam sem encontrar esteio, ninguém esperaria (em seu perfeito juízo) que do incidente resultasse a demissão do faltoso ou sequer um mero e hipócrita pedido de desculpas.

Numa república presidida por um aposentado que em tempos afirmou, com prosápia e mal contida soberba, que “nunca se engana e raramente tem dúvidas”, seria impensável assistirmos à demissão dum governante por coisa tão mesquinha; noutro país dessa Europa a que dizem pertencermos, o «Ministro da Justiça da Holanda demite-se por mentir ao Parlamento», mas entre nós o nível é outro: tão reles e baixo que os intervenientes se julgam acima que qualquer reparo ou dúvida.


O sentimento que campeia entre a elite política nacional é aquele que o ministro da Segurança Social (o que tutela o organismo que Passos Coelho fraudou impunemente) se apressou a transmitir quando nas primeiras reacções à notícia veio a terreiro afirmar que Passos foi "vítima de erros" da administração, crucificando os funcionários que dirige e deveria prestigiar… se também ele tivesse outros valores além dos da sobrevivência a qualquer custo!

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