Embora raramente
reconhecido é muitas vezes referido o facto dos processos e das campanhas
eleitorais se pautarem por debater o acessório em lugar do essencial. Os
últimos anos têm sido fartos nessa matéria, mas talvez um dos exemplos mais
gritantes tenham sido as últimas eleições em Israel.
Independentemente
do resultado eleitoral, quer Netanyahu forme novo governo ou não, a questão
central, para os eleitores israelitas, ficou por debater e ainda mais por
resolver. A ocupação israelita dos territórios árabes eterniza-se, as
sucessivas medidas para fomentar a sua colonização (ilegal ao abrigo do direito
internacional e à revelia das decisões da ONU) continuam a inviabilizar a
mínima hipótese da constituição de jure
dum estado palestiniano, enquanto o próprio estado israelita se afunda num crescente
isolamento internacional e no seu próprio labirinto.
Já não são
apenas os revezes do reconhecimento à Autoridade Palestiniana da qualidade de
observador na ONU ou o reconhecimento do estado palestiniano por países
europeus, é principalmente o crescente afastamento da matriz democrática que se
vive em Israel.
Tradicionalmente
apontada como a única democracia no Médio Oriente, a persistência numa
estratégia de isolamento imposta pelos pequenos partidos religiosos ortodoxos e
pelos “falcões” duma direita, em tempos vista como alternativa a sucessivos
governos trabalhistas, tem minado não apenas a sociedade judaica mas
principalmente os seus próprios alicerces.
Numa sociedade
onde o laicismo perde terreno para uma visão sionista ortodoxa e messiânica (não
esqueçamos que a questão que originou estas eleições foi a recusa de dois ministros,
Tzipi Livni e Yair Lapid,
em votarem um projecto de lei que excluía os não judeus dos direitos de
cidadania) pode começar equacionar-se o fim da democracia.
É claro que
para o cidadão israelita médio talvez o agravamento da situação económica,
ditada pelo efeito de contágio da crise global, seja verdadeiramente
importante, a ponto de fazer esquecer que a questão palestiniana e a solução
dos “dois estados” será afinal bem mais relevante que a azáfama diária deixa
antever. Disso mesmo se fez recentemente eco o escritor e jornalista Amos Oz – co-fundador
do movimento pacifista israelita Shalom
Akhshav (Peace Now) – quando nas páginas do jornal HAARETZ
deixou a ideia que «…se aqui não houver
rapidamente dois estados, haverá um. Se aqui houver apenas um estado, será um
Estado árabe…» e disso também será reflexo que, em resultado das eleições a
terceira força política passou a ser a Lista
Árabe Unida – constituída
por partidos árabes e englobando judeus como o ex-presidente do Knesset,
Avraham Burg – cuja campanha se centrou na
defesa da igualdade de direitos entre judeus e árabes no Estado de Israel.
Esta
preocupação que parece alastrar entre sectores menos dogmáticos e mais
esclarecidos da população judaica, não constitui novidade nem representa um
qualquer corte radical, antes uma adaptação a uma realidade – a solução um
estado-dois povos – a que já tinha aludido no “post” «NOVAS
IDEIAS PARA A PALESTINA?», em Julho de 2007.
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