sábado, 6 de março de 2010

A MÁ-FÉ E A AUSÊNCIA DE LUZ NA ESCURIDÃO

Se for verdadeiro o aforismo popular que anuncia que «rir faz bem à saúde», a leitura dos jornais nacionais continuará a ser um excelente paliativo para os crescentemente caros serviços públicos de saúde e, quiçá, até um importante contributo para a redução dos encargos com aqueles serviços, para a consequente redução do orçamento do Estado e do endividamento público.

Vem tudo isto a propósito duma notícia do
ECONÓMICO que faz eco de declarações do Presidente da República, Cavaco Silva, que numa entrevista ao jornal catalão 'La Vanguardia' disse que «Houve “má fé” na comparação entre Portugal e Grécia», comentário que, vindo de quem vem, não deixa de ter o seu lado cómico; não apenas por ser emitido por um reputado economista, autor reconhecido na área das finanças públicas e tradicional defensor do primado do mercado e dos seus equilíbrios automáticos, como ainda rotula a sua correligionária, ex-ministra de confiança e, por enquanto, líder do maior partido da oposição, do mais torpe que há, pois há dias esta afirmou durante uma conferência promovida pela Câmara de Comércio Luso Francesa, segundo notícia do CORREIO DA MANHÃ, que «Portugal "está no mesmo caminho" da Grécia».

Quando os sinais de crise se avolumam nos horizontes económicos e cada vez parece mais provável a concretização de cenários pessimistas, como o que prevê o início de um novo ciclo recessivo originado agora nas dificuldades financeiras dos estados que arrastarão um ainda muito fragilizado sistema financeiro para nova onda de falências (agora inevitavelmente mais visível face à incapacidade dos próprios estados voltarem a acorrer em sua defesa) e para uma fase de subida das taxas de juro, continua a haver altos responsáveis políticos que persistem no recurso a um discurso escamoteador da realidade.

Entre estes (e sem ultrapassarmos o cenário europeu) saliente-se o presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, que mesmo perante um cenário instigado ou agravado pelos meios financeiros anglo-saxónicos, em vez de os denunciar e propor-se combatê-los de forma decidida, insiste na ideia do relançamento da economia europeia sem uma prévia correcção das razões que nos conduziram ao estado em que nos encontramos.

Á luz da realidade revelada pela crise global e depois da socialização dos prejuízos financeiros mundiais, apontar, como o faz a Comissão Barroso, para um novo modelo económico baseado no conhecimento, numa economia eficiente em termos energéticos e numa elevada taxa de emprego enquanto se deixa imutável todo o sistema financeiro e em especial o seu papel de exclusivo financiador económico não é apenas desaconselhável, é criminoso!

É que tão ridículo e inócuo quanto os comentários de Manuela Ferreira Leite e de Cavaco Silva, são as propostas de Durão Barroso e dos seus pares, Angela Merkel, Nicolas Sarkozy, Silvio Berlusconi ou Gordon Brown, que por muito louváveis ou bem intencionados que sejam dificilmente produzirão efeitos concretos no combate contra a crise económica que vivemos.

Com os líderes europeus visivelmente perdidos no labirinto financeiro que ajudaram a construir, com a crise económico-financeira a alastrar já para a área social – cujos sinais de agitação e insegurança são bem evidentes nas notícias de greves e manifestações em curso ou programadas – e podendo ainda estender-se aos focos de tensão internacional, parecem-me bem avisadas as palavras de Paul Krugman – mesmo sabendo que o autor não perfilha, nem de perto, os princípios que defendo para atacar o problema[1] – recomendando que não «...aceitar uma má reforma e denunciar as pessoas responsáveis pelo facto é melhor que pactuar com uma reforma cosmética que só serve para mascarar a incapacidade de agir»[2].
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[1] Que entre outros «posts» podem sem lidos em «Eles nem sabem o que dizem»
[2] A citação foi retirada do artigo publicado no I e intitulado «Desafio final da reforma financeira»; o artigo original pode ser lido no New York Times, sob o título: «Financial Reform Endgame».

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