quarta-feira, 2 de março de 2011

CHAPÉUS HÁ MUITOS…


Aproximando-nos a passos largos da última data anunciada para a famigerada reforma e flexibilização do FEEF, que por imposição da Alemanha foi adiada para as próximas reuniões dos líderes da Zona Euro, a 11 de Março, e da UE, a 24 do mesmo mês, não é de estranhar que se tenham avolumado as notícias e as declarações de políticos em torno do que já começa a ser conhecido como um chapéu de chuva europeu.


Depois dos chapéus a que se abrigaram os grandes bancos ocidentais na sequência das tempestades financeiras que os próprios fomentaram e que foram prontamente financiados pelo dinheiro dos contribuintes, eis que agora os estados confrontados com as mesmas dificuldades recebem dos seus parceiros um tratamento bem menos acolhedor. 

Exemplo disso mesmo é a forma inoperante e polémica como a UE tem abordado esta questão. Desde as hesitações que pontificaram – e marcaram de forma decisiva – o processo que no primeiro semestre de 2010 envolveu a Grécia, até à solução envergonhada que foi aplicada ao caso da Irlanda – um claríssimo exemplo que quanto custou o resgate do sistema financeiro -, em qualquer dos casos nunca a UE apresentou de forma clara uma solução ou uma estratégia para enfrentar aquele que talvez seja o maior desafio à sua existência e continuidade, enquanto bloco coeso.

Que as divergências no seio da UE sempre foram uma realidade, não constitui novidade, outrossim a forma absurdamente canhestra como os estados mais poderosos, comdestaque para a Alemanha e a França, têm gerido (e alimentado) esta situação; dizendo-se defensores da unidade e solidariedade entre os estados-membros têm contribuído com as suas hesitações e declarações contraditórias mais para agravar a situação que para lhe pôr cobro.

Bem pode agora a chanceler Merkel e o presidente Sarkozy virem declarar que sempre pugnaram pela defesa da moeda única e que até têm um plano para salvar o Euro (e os estados mais endividados), desde que os restantes parceiros aceitem um “pacto de competitividade”, que mais não é que um aprofundamento das políticas neoliberais que, concentrando a riqueza produzida nas mãos de um número cada vez menor de agentes económicos, conduziram as economias ocidentais ao seu actual estado de debilidade.

No caso concreto de Portugal – o país que se apresenta em situação mais próxima de vir a ter que recorrer ao FEEF e à intervenção do FMI – e no dia em que Merkel e Sócrates discutiram, numa breve reunião de 45 minutos, a situação nacional alguém estaria à espera de mais que declarações circunstanciais, quando é amplamente conhecido que a principal preocupação do governo alemão na questão da crise das dívidas soberanas sempre foi a da protecção dos interesses (leia-se, da exposição) dos bancos alemães – nunca a da defesa da moeda única ou da coesão europeia – e quando é sabido que a exposição daqueles à divida portuguesa não representa sequer 1/5 da que tinham perante a dívida irlandesa ou que têm perante a dívida espanhola?

Esta é, aliás, a grande razão para há muito tempo se afirmar que o grande problema e receio da UE é um possível contágio à vizinha Espanha, país cuja economia é já uma das maiores da Zona Euro mas também uma das mais endividadas, com um modelo de crescimento demasiado sustentado e alavancado na especulação imobiliária, e perante a qual só os bancos alemães e franceses apresentam uma exposição da ordem dos 350 mil milhões de Euros.

Porque desde logo o “chapéu” se afigurou insuficiente para proteger todos os que à sua sombra se pretendiam abrigar, os seus “donos” começaram a dar a conhecer quais os privilegiados e quais os que acabarão por se molhar... embora a periclitante situação política do governo da chanceler Merkel talvez acabe por se revelar o melhor activo do não menos periclitante governo de José Sócrates; muito mais esclarecedor que o anúncio de que a «Despesa do Estado caiu 3,6% nos dois primeiros meses do ano» com que este julgou impressioná-la, pois o valor, sendo por si só inferior aos famigerados cortes salariais anunciados como panaceia para os males financeiros, é a notícia de que no final da reunião «Merkel elogia reformas em Portugal, mas diz que é preciso mais» por ser um claro revelador de que a grande preocupação com o controlo da dívida é afinal um mero argumento para continuara a agravar ainda mais a já muito distorcida política de distribuição de rendimentos.

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