quarta-feira, 9 de março de 2011

AMBIVALÊNCIAS


A começar pelo início oficial do segundo mandato de Cavaco Silva como Presidente da República, que hoje ocorreu, passando pela apresentação da moção de censura do BE, que amanhã terá lugar e pela cimeira da Zona Euro e pela manifestação da “geração à rasca” que acontecerão nos dias seguintes, bem se pode dizer que os próximos dias serão tudo menos entediantes.


Mesmo para quem considere importante o discurso de Cavaco Silva, hoje proferido na sua tomada de posse, ou para quem o classifique como um mero “fait divers”, isso em pouco ou nada alterará o panorama político nacional – Sócrates continuará a vislumbrar o que cada vez mais parece que só ele vê, enquanto Passos Coelho continua a resistir à ânsia de parte dos seus correligionários e prefere esperar calmamente que a natural erosão de Sócrates e do PS lhe traga o tão desejado lugar de primeiro-ministro – e os restantes acontecimentos sempre poderão adicionar um pouco mais de tempero à sensaborona vida política nacional.

Embora conhecido de antemão o resultado da moção de censura do BE, cuja única possível virtualidade será a de demonstrar que na realidade nem o PSD nem o CDS querem efectivamente substituir o governo de José Sócrates, nem por isso a sua apresentação deixará de marcar a cena política nacional, tanto mais que outros acontecimentos se avizinham e se a cimeira da Zona Euro deverá voltar a constituir um relativo “flop” quanto à questão de fundo que é a da definição das políticas em defesa da moeda única e da estabilidade financeira dos estados-membros, já a da manifestação agendada para o próximo fim-de-semana poderá representar, ou não, um ponto de viragem na passividade com que os portugueses têm aceite a inoperância e a incapacidade dos seus dirigentes na definição e na aplicação políticas que contrariem a degradação das suas condições de vida.

Este problema, ao contrário do que por vezes se diz ou insinua, não é de origem nacional, nem pode ser resolvido fora do quadro comunitário e, em especial, do da moeda única em que estamos inseridos; por isso é que as hesitações deste organismo se podem apontar como fortemente responsáveis pela situação financeira (e económica) que atravessamos. Quando a UE se revela incapaz de definir outras políticas que não as que privilegiam exclusivamente os equilíbrios financeiros em detrimento do crescimento económico, não se pode esperar outra coisa que os crescimentos anémicos que as economias mais fortes (Alemanha e França) perspectivam ou a novas recessões a que as economias mais débeis (como a grega, a irlandesa ou a portuguesa) estarão condenadas.

Quando precisamente neste contexto surge a notícia de que a «”Geração à Rasca” protesta sábado em dez cidades», talvez seja chegado o momento de reflectir profundamente no assunto e, ao contrário de muitos comentadores e analistas (entre os quais Mário Soares), conceder à iniciativa o benefício da dúvida (mesmo partilhando a ansiedade indissociável dum discurso tantas vezes vago e meramente populista) e esperar para avaliar o efeito final. É que, queiramos ou não, somos quase todos co-responsáveis pela situação de falta de perspectivas que a geração mais jovem arrosta (com as parcas ferramentas de que nós próprios os dotámos) como pode e a que aqui e ali responde com observações tão pertinentes quanto aquela que o grupo Deolinda popularizou: «E fico a pensar, / que mundo tão parvo / onde para ser escravo é preciso estudar» ou uma enorme lufada de irreverência, como o atesta a recente vitória do grupo Homens da Luta no festival da canção anualmente organizado pela RTP com a mensagem de que a «Luta é Alegria».

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